Home TVEpisódio Crítica | Doctor Who – 6X01 e 02: The Impossible Astronaut / Day Of The Moon

Crítica | Doctor Who – 6X01 e 02: The Impossible Astronaut / Day Of The Moon

Segredos e Mistérios dão o tom da 6ª temporada de Doctor Who

por Rafael Lima
486 views

A 5ª Temporada de Doctor Who, a primeira com Steven Moffat no comando do programa, foi em muitos sentidos um ano de transição. Embora já carregasse a inequívoca identidade de seu Showrunner o ciclo inicial da era do 11º Doutor ainda seguia de perto as estruturas narrativas estabelecidas por Russell T. Davies nos primeiros anos da Nova Série. Mas passado o período de transição, nesta 6ª Temporada, Moffat sente-se mais seguro para experimentar novas formas de estruturar suas narrativas, como fica claro na Season Premiere formada pelos episódios The Impossible Astronaut/Day Of The Moon. A história revela-se uma estreia de temporada que até então era bastante atípica para a Nova Série, não só por começar o novo ano com uma história de duas partes, mas por tal história possuir uma escala geralmente reservada para momentos mais avançados de uma temporada do programa.

Na trama, Amy, Rory e River Song são convocados até o estado americano de Utah pelo Doutor, apenas para serem surpreendidos pelo assassinato do Time Lord nas mãos de um misterioso astronauta. Mas logo, o trio descobre que uma versão prévia do 11º Doutor também foi convocada por sua versão futura, e agora o time da TARDIS se vê envolvido em um intrincado mistério, envolvendo o pouso do homem na Lua em 1969; ligações feitas por uma garotinha assustada ao presidente norte-americano Richard Nixon; uma conspiração alienígena para assumir o controle da Terra, e a morte do Doutor em um futuro próximo.

Escrito por Steven Moffat, The Impossible Planet/Day of The Moon, é uma premiere ambiciosa em diversos sentidos, começando pela produção, que gravou em locações no próprio Deserto do Utah, dando um visual dinâmico e distinto para essa abertura de temporada. Mas a ambição é também narrativa, pois essa dupla de episódios estabelece uma série de mistérios e conceitos que serão desenvolvidos ao longo da temporada, desde a morte do Doutor; passando pela introdução dos alienígenas Silêncio e a gravidez de Amy; até a misteriosa menina, que ao fim do arco, revela ser capaz de se regenerar, como os Time Lords. É uma lista grande de elementos narrativos construídos para funcionarem a longo prazo, e que nas mãos de um escritor menos capaz, poderia gerar uma trama abarrotada ou meramente um grande trailer do que estava por vir na temporada. Felizmente, Moffat utiliza todos os enigmas como propulsores para os conflitos apresentados no próprio arco, ao traçar um paralelo entre a criança em perigo e a gravidez de Amy, em um bom trabalho de storytelling.

Mais impressionante é que em meio a todo o fluxo de informações que The Impossible Astronaut atira para o espectador, ele ainda encontra tempo para desenvolver os seus personagens, e estabelecer novas dinâmicas. A vida dos companheiros já não giram mais completamente em torno do Doutor ou das viagens na TARDIS; e ainda que, até o fim do arco, o casal Pond esteja mais uma vez viajando pelo tempo e espaço, fica claro que eles são perfeitamente capazes de viver sem estarem envolvidos em crises alienígenas — diferente dos companions apresentados pela Nova Série até então. E se a insegurança de Rory em relação a Amy parece evocar um assunto superado, já que a temporada anterior deixou claro que não existe um triângulo amoroso na TARDIS, ao menos reforça o ponto de que Amy é perfeitamente capaz de encontrar fascínio em uma vida normal, como fica claro no discurso da jovem. River Song é outra personagem a ganhar novas camadas, ao percebermos o quanto a sua postura atrevida apenas mascara a sua angústia de ver o Doutor sabendo cada vez menos sobre ela devido a seus encontros cronologicamente opostos, aumentando retroativamente o peso dramático de sua estreia/despedida em Silence in The Library / Forest Of The Dead.

A introdução dos alienígenas Silêncio, monstros de quem as pessoas só se lembram enquanto olham para eles, casa bem com toda a aura paranoica do arco. Em vários aspectos, The Impossible Astronaut/Day Of The Moon homenageia as ficções científicas de conspiração norte-americanas; vide a presença do FBI representado pelo Agente Delaware, vivido pelo sempre carismático Mark Shepard; e o próprio visual dos Silêncio, como criaturas cinzentos de terno que evocam os mitos americanos do incidente Roswell e da Área 51 (onde o Doutor acaba prisioneiro em Day of  The Moon). Os alienígenas Silêncio, inclusive, podem ser considerados a maior contribuição da Era do 11º Doutor para a galeria de vilões da série, e ainda que nunca tenham voltado a ser tão assustadores quanto nesta dupla de episódios, são criações muito interessantes por sua concepção visual simples e sinistra, e pelo criativo conceito de bloqueio de memórias que o cerca. É uma premissa que remete aos Weeping Angels (outra criação de Moffat), que permite que a decupagem e a montagem brinque com o público, ao apresentar diversas lacunas na história que nos coloca ao lado dos personagens, criando momentos angustiantes como aquele onde Amy percebe marcado em seu corpo diversos lembretes de seu encontro com as criaturas que foram apagados de sua memória.

Mas apesar de toda a qualidade do arco, a segunda parte, Day Of The Moon acaba perdendo um pouco do ritmo estabelecido pela brilhante primeira parte, ao solucionar alguns dos ganchos emocionais e de enredo de The Impossible Astronaut de forma um pouco apressada. Existe uma quebra de expectativa deliberada nessa segunda parte do arco, ao não só retomar a trama com uma elipse, mas ao adotar um tom mais leve do que o visto na primeira parte, apesar da situação mais grave; um movimento parecido ao realizado com sucesso na Season Finale da temporada anterior. Entretanto, toda a ideia de que os Silêncio vem controlando a Terra desde sempre, concentrada neste arco, nunca parece ter tempo para causar impacto real, e aqui talvez o ritmo acelerado já não sirva tão bem, apesar das soluções inteligentes que o roteiro de Moffat encontra para solucionar esse plot, Day Of The Moon ainda é um ótimo episódio, só não consegue manter as altíssimas expectativas de seu antecessor, o que não chega a ser uma falha grave.

O diretor Toby Haynes tem com essa história a sua última participação na série até o momento (2022), encerrando uma sequência de episódios muito bem conduzidos que começa na Finale da temporada passada, passa pelo especial de Natal de 2010, e termina neste arco. Haynes compreende as referências perseguidas pela narrativa, conduzindo a ação de forma intensa, ao mesmo tempo em que  sabe valorizar os pequenos momentos de respiro para criar a sensação de desconforto e ameaça tão importantes em uma trama de conspiração, mesmo em meio ao fluxo acelerado dos dois episódios. Também chama a atenção o trabalho de mise-en-scéne realizado pelo diretor, que se utiliza muito bem dos cenários para separar os personagens em blocos, de modo a reforçar a atmosfera de segredos da história (mesmo os tripulantes da TARDIS escondem coisas uns dos outros), e ainda se vale dessa disposição de atores em cena para fins cômicos, vide o Doutor de cabeça para baixo na TARDIS.

Apesar de perder um pouco a força em sua segunda parte, The Impossible Astronaut/Day Of The Moon segue sendo a Season Premiere mais forte e ambiciosa da série, ao entregar uma aventura empolgante, cheia de grandes momentos de intriga e diversão. Os diversos mistérios que o arco apresentou deixam o telespectador com a promessa de uma temporada instigante, com um time da TARDIS que ainda que nunca tenha parecido mais unido, guardam seus próprios segredos uns dos outros; o que dá o tom de todo esse sexto ciclo de Doctor Who.

Doctor Who- 6×01 e 02: The Impossible Astronaut/Day Of The Moon (23 de Abril de 2011, 30 de Abril de 2011)
Direção: Toby Haynes
Roteiro: Steven Moffat
Elenco: Matt Smith, Karen Gillan, Arthur Darvill, Alex Kingston, Mark Shepard, William Morgan Shepard, Marnix Van Den Broeke, Stuart Milligan, Chukwudi Iwuji, Mark Griffin, Sidney Wade, Kerry Shale, Glenn Wrage, Tommy Campbell, Peter Banks, Frances Barber
Duração: 91 Minutos

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais