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Crítica | Doctor Who: A Fairytale Life

por Luiz Santiago
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Equipe: 11º Doutor e Amy
Espaço-tempo: Planeta Caligaris Epsilon Six (mundo de férias do 3º Grande e Beneficente Império Humano), c. 7862 (começo da história) e 19/04/7711 (final da história).

A estrutura narrativa de um conto de fadas é ao mesmo tempo a coisa mais simples e uma das mais exigentes que existem em literatura. É necessário que o escritor tenha em mente a firmeza de uma série de conceitos morais, um desenvolvimento atrativo da história (se possível cômico, emotivo ou ambos) e uma forte imaginação para trazer à luz um mundo de fantasias que funciona sobre suas próprias regras mas que não pode fugir muito da comparação, mesmo que simbólica ou metafórica, com o “mundo real”. Caso contrário a lição se perde, porque o cenário do conflito está distante demais do leitor.

Nos quadrinhos, o trabalho com imagem e texto facilita a aparição e reconstrução de elementos familiares ao público, o que dá a oportunidade de autores e artistas em projetos desse tipo conseguirem um bom resultado final mais facilmente e com alto teor de inovação, basta vermos o excelente trabalho de Bill Willingham em Fábulas. Mas… e se temos que trabalhar o ambiente desses contos de fadas com personagens e mitologia vindos da ficção científica? O cenário que vem em mente é o mais improvável e talvez o mais estranho possível. Todavia, se bem realizada, a proposta pode gerar um produto final muito interessante. Pelo menos foi o que Matt Sturges e Kelly Yates nos mostrou nessa minissérie em 4 partes chamada Doctor Who: A Fairytale Life.

Aqui, o Doutor leva Amy para um mundo de férias, um planeta inteiro organizado por humanos para ser uma espécie de “clube de fantasias e descanso”. Essa viagem tem uma boa introdução na TARDIS, com a companion pedindo para ir fazer compras em algum lugar bem mundano no Reino Unido e o Doutor se revoltando pela escolha. É então que a bela ruiva pede ao Time Lord, em tom de desafio, que a leve para um lugar onde existissem castelos, princesas, dragões e coisas do tipo, um mundo onde a vida é um verdadeiro conto de fadas.

O roteiro tem uma força tremenda na apresentação das duas situações e desde cedo deixa sua marca. Todos os pré-requisitos para um conto de fadas estão lá e, melhor ainda, muitíssimo bem interligados com o mundo do Doutor, por isso não é espantoso quando os conflitos humanos e aparentemente fantásticos ou ligados à ficção científica começam a aparecer, especialmente porque há algo escondido, algo que sabemos ser terrível mas não conseguimos identificar exatamente o quê.

Afinal, o que de fato está acontecendo em Caligaris Epsilon Six?

Os grandes problemas surgem quando Amy adoece de uma peste local e é levada pela Serpentina — que é a “forma viva” do Caduceu de Mercúrio ou Hermes, erroneamente tido como símbolo da medicina — para um castelo distante, onde empreende, à sua moda, o início da resistência às forças inexplicáveis do planeta. Com duas ações acontecendo ao mesmo tempo e com ritmos e força narrativa diversos, o roteiro de A Fairytale Life é uma constante viagem ao desconhecido, culminando com uma reflexão moral bastante densa, bem maior do que as normalmente observadas em contos de fadas para adultos, por assim dizer.

Kelly Yates, que fizera a arte para o volume final de Prisioneiros do Tempo, surge aqui com um grande número de acertos estéticos, criando um mundo que é um misto de ambientes medievais e contos de fadas. A artista também insere detalhes visuais na paisagem que podem escapar ao olhar do leitor mais desatento, mas que nos fornece informações e indicações importantes para o que está acontecendo na trama em geral. O único ponto negativo de sua arte é a forma como desenha Amy, quase como uma estranha de traços bastante distanciados de  Karen Gillan, o que talvez fosse aceitável se o Doctor de Matt Smith fosse diferente das feições do ator, o que não procede. De qualquer forma, trata-se de um detalhe fisionômico cujo impacto é bem menor do que se fosse em outros pontos artísticos da minissérie.

Com um roteiro inteligente, cômico e com poucos tropeços em seu desenvolvimento, A Fairytale Life é uma ótima viagem do Doutor ao mundo das lendas infantis e seus contos. As belas cores de Rachelle Rosenberg — que distingue de maneira temática cada um dos ambientes pelos quais o roteiro passa — dão o toque final à história, que termina com mais um aprendizado do Doutor, além da discussão do poder do livre-arbítrio e, como não podia deixar de ser, o embate cômico e carinhoso entre ele e Amy. Uma adorável fantasia infantil ambientada em um cenário de ficção científica.

Doctor Who: A Fairytale Life (Estados Unidos, 2011)
Minissérie em 4 partes – Editora IDW
Roteiro: Matt Sturges
Arte: Kelly Yates
Cores: Rachelle Rosenberg
104 páginas

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