Home TVEpisódio Crítica | Doctor Who – Série Clássica: The Five Doctors (Arco #129)

Crítica | Doctor Who – Série Clássica: The Five Doctors (Arco #129)

por Luiz Santiago
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Equipe: 1º Doutor, Susan / 2º Doutor, Brigadeiro / 3º Doutor, Sarah Jane / 4º Doutor, Romana / 5º Doutor, Tegan e Turlough / Cameos de K9 III, Liz, Mike Yates, Jamie e Zoe.
Espaço: Death Zone, Gallifrey
Tempo: Indeterminado

A produção de um episódio multi-doctors nunca é fácil. Espectadores da Nova Série tiveram a oportunidade de acompanhar pelas redes sociais e canais oficiais a epopeia de Steven Moffat e Faith Penhale para nos entregar The Day of the Doctor (2013), o Especial e 50 anos do show. E vejam que estamos falando de uma era onde a série é (novamente) bastante popular, com um bom investimento e facilidades tecnológicas e midiáticas a seu favor. Agora imaginem isso trinta anos antes, reunindo as versões 2 (Patrick Troughton), 3 (Jon Pertwee) e 5 (Peter Davison) do Doutor, além de estrear um novo ator (Richard Hurndall) no papel que fora de William Hartnell, falecido em 1975. E claro, o infame “papel” de Tom Baker na aventura.

Para dizer a verdade, The Five Doctors foi o primeiro e VERDADEIRO desafio de John Nathan-Turner como produtor de Doctor Who, e talvez a sua melhor jogada (ou, sendo mais consciencioso, uma das três melhores) até o então, pois se permitiu correr riscos, acrescentou uma série de bons elementos ao cânone da série e fez valer toda a ideia de aniversário, não fugindo do clima do Especial de 10 anos, The Three Doctors, e em igual medida, criando algo mais épico, levemente mais divertido e bastante respeitoso com os personagens que fizeram história na série. Minha única mágoa com o produtor aqui foi a não inclusão de Leela na jogada. E pior: a atriz Louise Jameson se ofereceu para retornar ao papel, mas, segundo o Terrance Dicks, “não havia lugar para ela na trama“. Como se “criar lugar na trama” não fosse papel do roteirista… Melhore, Sr. Dicks.

Os preparativos para The Five Doctors começaram já em 1981, sendo as primeiras discussões abertas entre o arco final do 4º Doutor, Logopolis (março de 1981), e a estreia do 5º Doutor em Castrovalva (janeiro de 1982). A mais dolorosa pedra no sapato eram as contratações do elenco, pois uma boa parte dos atores contatados pela BBC tinham outros projetos, alguns, inclusive, fora do Reino Unido, como Katy Manning, que estava na Austrália e foi fortemente cotada para voltar a viver Jo Grant; e Ian Marter, que foi chamado para reviver Harry Sullivan, mas tinha trabalho na Nova Zelândia. Em paralelo, algumas “novelas mexicanas” se desenvolveram até que as filmagens do Especial começassem. Primeiro, o medo de JNT em demorar tempo demais e a emissora não ter orçamento para cumprir com o cachê de Jon Pertwee, o mais alto salário do grupo. Segundo, as constantes reescritas do roteiro para colocar ou tirar personagens, como a mudança de Jamie, que foi de personagem principal para um cameo devido aos compromissos dele com as filmagens da novela em que estava trabalhando, fazendo o roteirista colocar o Brigadeiro em maior destaque.

Em terceiro lugar, a consideração em trazer Romana de volta, algo que foi colocado de lado quando Lalla Ward e Tom Baker se separaram, em 1982. E claro, a “novela Baker”, que começou com o ator dizendo que só daria uma resposta depois que lesse o roteiro; evoluiu para o ator dizendo que estava muito animado com o projeto, após ler o roteiro; e terminou com o ator dizendo pessoalmente a JNT que não se sentia confortável em voltar para um programa do qual ele saíra a tão pouco tempo. Em alternativa, ele disse que autorizava o uso de takes de Shada (arco inacabado e nunca exibido enquanto a série esteve no ar — houve uma exibição especial apenas em 1992, com comentários do próprio Tom Baker), que era exatamente o “plano B” de JNT desde as incertezas iniciais do ator e a demora dele em dar a resposta.

Co-produzido pela Australian Broadcasting Corporation [ABC], companhia que exibia Doctor Who na Austrália desde os anos 60 e que já havia investido em outras produções da BBC, sendo, por isso, cortejada por JNT para “melhorias no orçamento de DW” — de onde vocês acham que saiu a ideia de colocar uma companion australiana na série? — The Five Doctors nos apresenta a Death Zone, um lugar para onde os Time Lords levavam espécies que sequestravam (exceto Daleks e Cybermen, porque eles “jogavam bem demais”) a fim de observá-las perseguir e destruir umas às outras — vejam as semelhanças desse cenário com as ações do War Chief em The War Games, um roteiro do próprio Dicks; e dinâmica de sequestro parecida com a que vemos em Carnival of Monsters –. Alguém está usando o Time Scoop para sequestrar encarnações do Doutor e colocá-las estrategicamente na Death Zone, fazendo o Time Lord “morrer aos poucos”.

Por mais “porcamente encaixada” que pareça a participação do 4º Doutor nesses eventos, o espectador acaba convencido de que houve uma falha no seu sequestro, e isso é bem levantado ao longo da história, de modo que acaba sendo uma ação dramaticamente aceitável. Já as outras encarnações recebem um modelo extremamente interessante e notadamente cômico de sequestro, com maior destaque para as cenas do 2º Doutor com o Brigadeiro Lethbridge-Stewart, no final de um bota-fora da UNIT.

O conceito do Especial é bastante simples, com as já esperadas citações a aventuras do passado, encontros calorosos e ao mesmo tempo birrentos entre os Doutores (uma marca charmosa que, ainda bem, foi mantida com o passar das décadas) e jornada épica para que o Doutor salve a sua própria vida. Só em avançada trama é que descobriremos que a verdadeira intenção de todo esse circo não era matar o Doutor e sim utilizá-lo como caminho para algo bem mais… eterno.

Baseado em narrativas épicas de encontro com torres ou grandes castelos, como o poema épico de Robert Browning, Childe Roland à Torre Negra Chegou (1835), O Mágico de Oz, Alice no País das Maravilhas e O Senhor dos Anéis, o roteiro de Terrance Dicks consegue tornar divertidos os blocos de cada um dos Doutores, perdendo pontos apenas na insistência em expor os Cybermen na perseguição, além do Dalek no início e da criação de um dos piores personagens da série, o Raston Warrior Robot, um androide guerreiro que guarda uma das entradas para a Torre de Rassilon e se movimenta de um lugar para outro dando AQUELA SARRADA NO AR. Simplesmente ridículo.

Por ter um mutirão de grandes atores em cena, quase não damos muita importância para as infantilidades com que o texto trata Susan e até mesmo a Sarah Jane, um pouco mais “bibelô” do que era em sua própria época na série, algo que causa imensa estranheza no espectador. As filmagens em locação, que são a maioria, exigiram muito mais da direção do que do desenho de produção, por isso temos uma história visualmente mais crua do que era comum nessa era, mas não digo isso de forma negativa, é apenas um apontamento estético.

Com trilha sonora pendendo para o horror e um drama que nos faz querer perguntar: “ah, Borusa, sério que você foi estúpido a este ponto?The Five Doctors celebra com bastante garbo os 20 anos de exibição de Doctor Who, colocando o Mestre em uma posição nada óbvia (um acerto em cheio da produção, mas não tão bem executado pelo roteiro, especialmente no final) e cinco encarnações do Doutor — bem… quatro, para ser sincero — em um perigo nunca antes enfrentado. Incontestavelmente, uma aventura inesquecível.

The Five Doctors (Arco #129) — Reino Unido, 25 de novembro de 1983
Direção: Peter Moffatt
Roteiro: Terrance Dicks
Elenco: Peter Davison, Jon Pertwee, Patrick Troughton, Richard Hurndall, Janet Fielding, Mark Strickson, Elisabeth Sladen, Carole Ann Ford, Nicholas Courtney, Anthony Ainley, Philip Latham, Dinah Sheridan, Paul Jerricho, Frazer Hines, Wendy Padbury, Caroline John, Richard Franklin, John Leeson
Duração: 90 min. (versão dividida em 4 episódios) 100 min. (versão com corte especial, lançada em DVD)

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