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Crítica | Dois Heróis Bem Trapalhões

Uma comédia de erros simplesmente insana!

por Iann Jeliel
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Pouco tempo depois de lançarem seus primeiros filmes como diretores, Sam Raimi e os Irmãos Coen se juntaram num roteiro que reúne as suas melhores características como autores. Dois Heróis Bem Trapalhões – um título absolutamente constrangedor comparado à tradução literal ‘Onda de Crime’, mas que acaba sendo bom e engraçado também pelo que é o filme – uma típica comédia de erros dos Irmãos Coen, que trabalham o nonsense e humor ácido naquele tom meio sarcástico e seco, encenada com os maneirismos “cartunescos” e extravagantes de Sam Raimi, diretamente tirados da franquia A Morte do Demônio. Raimi, não coincidentemente, se voltaria para a comédia burlesca em seu segundo e terceiro filme, lançados depois deste.

Existe o mesmo princípio caótico e crescente de loucura adotada pela franquia de terror/comédia criada por Raimi, mas trocando a ambientação do horror (embora, mantenha vários clichês do gênero para criar algumas cenas de gags cômicas sensacionais) por uma mistura maluca de comédia colegial oitentista adolescente e paródia ao noir clássico. Substitui-se o arquétipo do homem charmoso e garanhão de moral inabalável que é condenado injustamente por um crime que não cometeu para colocar aquele característico nerd “loser” dos filmes de John Hughes, por consequência, revestindo a jornada (quase universal de histórias noir) do condenado tentando provar a inocência para se juntar à sua amada num amor impossível na jornada do nerd que tenta desmistificar o seu estereótipo recluso e  conseguir viver o amor impossível, no caso, aquele com a moça bonita que nunca lhe deu bola.

Nesta premissa carismática e referencial, Sam Raimi dedica um tempo relevante para estabelecer o tom caricatural e exagerado a ser consolidado quando a narrativa vira puramente um exercício de gênero, especialmente nas cenas episódicas dos dois maníacos patetas (sim, os dois “heróis trapalhões” referidos pelo título traduzido) aterrorizando outras pessoas na cidade entrecortadas com a brega sequência do baile, com os personagens principais se conhecendo. Apesar desse começo repartido em  dois blocos que aparentemente pouco dialogam entre si, seja uma escolha inicialmente confusa que faz com que a tipificação do humor demore a ser abraçada pelo telespectador, ela é primordial para o diretor elaborar um panorama organizado de sua mise en scène e fazer com que ela nunca perca o controle depois de os enxertos histéricos, bizarros e aleatórios irem surgindo na história.

Quando unem o núcleo dos vilões com o da turbulenta noite do protagonista Ernest (Edward R. Pressman) tentando conquistar sua “paixonite”, a bela Nancy (Sheree J. Wilson), para protagonizarem uma perseguição frenética à la Tom & Jerry, a dialética anteriormente estranha da comédia adquire uma unidade coerente e exponencialmente divertida. Quanto mais absurda e insana fica a história, mais ela parece fazer sentido como comédia. Algumas piadas feitas nos primeiros dois atos, por exemplo, tornam-se mais engraçadas por conta de uma escalada do contexto cômico, deferido puramente na imagem, nos jogos de montagem, na inventividade da direção de Raimi em ler as sacadas inteligentes dos textos dos Coen (embora, até então, jogadas pelo texto) de maneira complementadora à estilização da narrativa.

Por conta do aparentemente amadorismo da produção (cheia de problemas internos) e humor bobo, barulhento e pastelão, quase como um “desenho-animado” em live-action só que para adultos, pela violência e imoralidade do conteúdo, Dois Heróis Bem Trapalhões caiu num injusto esquecimento. Um exercício puro de entretenimento e criatividade com a vibe oitentista autoral de dois (no caso, três) dos maiores diretores surgidos nessa década. Merece ser redescoberto.

Dois Heróis Bem Trapalhões (Crimewave | EUA, 1985)
Direção: Sam Raimi
Roteiro: Ethan Coen, Joel Coen, Sam Raimi
Elenco: Louise Lasser, Paul L. Smith, Brion James, Sheree J. Wilson, Edward R. Pressman, Bruce Campbell, Reed Birney, Richard Bright, Antonio Fargas, Hamid Dana, John Hardy, Emil Sitka, Hal Youngblood, Sean Farley, Richard DeManincor, Carrie Hall, Wiley Harker, Julius Harris, Ralph Drischell, Bridget Hoffman, Anne Cooper, Frances McDormand, Ted Raimi
Duração: 86 minutos.

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