Número de temporadas: 1
Número de episódios: 89
Período de exibição: 31 de março – 11 de julho de 1986
Há continuação ou reboot?: Não.
XXXXXXXXX
Primeiro investimento pesado da TV Manchete em um folhetim histórico, Dona Beija teve como base duas narrativas literárias, igualmente inspiradas em fatos: A Vida em Flor de Dona Beja, de Agripa Vasconcelos; e Dona Beja, a Feiticeira do Araxá, de Thomas Othon Leonardos. No centro dessas tramas, temos a vida de Ana Jacinta de São José, nascida em 1800, e cuja história se desenrolaria durante o período da Corte portuguesa no Brasil, adentrando também para o primeiro e o segundo reinados. É muito importante destacar que a novela nasceu de uma emissora que estava dando os seus primeiros passos na criação de programas dramatúrgicos, especialmente se considerarmos que a Manchete foi fundada em 1983, e já no início de 1986, exibia uma produção que chamava a atenção do público e a colocava num lugar admirável na seara dos folhetins televisivos.
A cargo de Wagner Tiso, acompanhado pelo conjunto Viva Voz, o tema de abertura de Dona Beija consegue evocar a força da protagonista, que, neste capítulo de estreia, faz uma trajetória do nascimento à vida adulta, até o momento em que é raptada a mando do Ouvidor da Corte, Joaquim Inácio Silveira da Motta (Carlos Alberto). O texto de Carlos Heitor Cony procura dar importância aos eventos marcantes que moldam a vida da protagonista, dos questionamentos e estranhamentos ético-morais ou desumanos na infância e adolescência (ela tinha pavor do inferno e chegou a admitir que gosta de ver um homem escravizado sendo açoitado) até a humilhação e vergonha que passaria quando foi obrigada a voltar para a cidade, após ser abandonada por Motta. Os saltos temporais, especialmente na primeira meia hora do episódio, atrapalham bastante a conexão do espectador com o enredo, mas a semente da curiosidade permanece e floresce, à medida que as ladainhas da Corte aparecem e um drama tenso, envolvendo Beija, surge no horizonte.
Muito bem interpretada por Maitê Proença, Beija é uma personagem magnética, decidida, bela e, de certa forma, deslocada em seu meio social. A atriz imprime à jovem um ímpeto de ação, de resolução de problemas e de enfrentamento que faz até os diálogos mais bobinhos ganharem outra cor e terem um pouco mais de importância. Como este primeiro capítulo só começa a engatar a partir de sua metade, é justamente nesse ponto que vemos Beija adulta, tomando suas decisões, falando com pessoas e questionando opiniões. Vale destacar, porém, que não se trata de uma personagem “empoderada” como entendemos hoje, porque o texto não comete nenhum tipo de anacronismo. Como alguém que se posiciona, que não se cala e que enfrenta, é claro que Beija está muito à frente da maioria das mulheres do Brasil no século XIX, de quem a sujeição era o esperado. No entanto, ela não está “fora do tempo“, livre de sofrer penas e rejeições de sua sociedade. O fato de estar à frente de seu tempo não a coloca como uma “super-heroína” a quem nada de ruim acontecia. Muito pelo contrário. É justamente por acontecerem coisas ruins que se moldou nela a disposição para a luta.
Com uma apresentação lenta dos personagens centrais da trama, este capítulo de estreia de Dona Beija mostra como era diferente o jeito de se fazer dramaturgia nos anos 80. É muito clara, aqui, a preocupação do roteiro e da direção com a ambientação e a introdução de figuras-chave da novela em sua primeira fase, criando o máximo de atmosferas em detrimento de conteúdo mais perceptível. Há cenas muito bonitas de Beija tomando banho nua na cachoeira (Maitê Proença nunca renegou essas cenas, e elas foram, realmente, feitas com muito cuidado e respeito, dentro do contexto da trama) e há uma abordagem esteticamente simplista, mas funcional, para o propósito da novela, sobre o Período Joanino. Ainda assim, este é um piloto sólido que consegue estabelecer a história, mesmo que cometa alguns pecados pelo caminho.
Dona Beija – Capítulo 1 (Brasil, 31 de março de 1986)
Criação: Wilson Aguiar Filho
Direção: Herval Rossano
Roteiro: Carlos Heitor Cony
Elenco: Maitê Proença, Gracindo Júnior, Bia Seidl, Maria Fernanda, Sérgio Britto, Marcelo Picchi, Mayara Magri, Abrahão Farc, Renato Borghi, Maria Isabel de Lizandra, Jonas Mello, Jayme Periard, Marilu Bueno, Lafayette Galvão, Julciléa Telles, Arlete Salles, Sérgio Mamberti, Isaac Bardavid, Nina de Pádua, Mário Cardoso, Virgínia Campos, Fernando Eiras, Léa Garcia, Antônio Pitanga, Castro Gonzaga, Monah Delacy, Breno Bonin, Ivan de Almeida, Sandra Simon, Renato Neves, João Signorelli, Edson Silva, Elisa Fernandes, Roberto Orozco, Shulamith Yaari, Cláudia Freire, Ana Ramalho, Josias Amon, Carlos Alberto, Edwin Luisi
Duração: 58 min.
