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Crítica | Dylan Dog: Vítima das Circunstâncias

Relembrando o caso histórico de Beatrice Cenci.

por Luiz Santiago
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Com direção de Claudio Di Biagio e roteiro de Luca Vecchi, o curta Vítima das Circunstâncias é uma interessantíssima adaptação de Dylan Dog para o cinema, realizada com recursos limitados, mas com um cuidado e uma atenção aos detalhes que coloca obras de maior orçamento (como o filme americano de 2010, por exemplo) no chinelo. Ao se criar uma versão para um personagem tão exigente em termos de composição dramática e de riqueza tão grande dentro do gênero terror e do giallo, uma das coisas que os artistas precisam considerar é o quanto podem mudar e o que devem obrigatoriamente manter do original. Di Biagio e Vecchi souberam fazer bem esse julgamento, mantendo elementos característicos do Dylan Dog raiz não apenas no roteiro, mas nas atuações e na forma como representa o mistério a ser resolvido.

O enigma começa com uma jovem chamada Sofia (Ludovica Bargellini), que juntamente com seu irmão, passa por uma experiência traumatizante, com ele tendo ataques convulsivos e com ela tendo uma visão com uma jovem que tirava a própria cabeça. Esse tipo de cenário macabro inicial é a tônica das histórias correntes de Dylan Dog, servindo de apresentação do problema para o público, dando uma primordial criação de ambiente de medo e abrindo as portas para a entrada do Detetive do Pesadelo e de seu parceiro Groucho como os responsáveis por encontrar uma solução para o impasse em questão.

A construção dos personagens aqui é um dos maiores triunfos da adaptação. Valerio Di Benedetto cria um Dylan Dog com todos os bons componentes do original, a começar pela caracterização vocal, movimentação das mãos e modulação do discurso. É possível ver muito de Dylan no rosto sério do ator, nas pequenas risadas de canto de boca e nos momentos em que insiste em utilizar um caminho pouco ortodoxo para encontrar resposta para suas perguntas. É uma atuação que rejeita a caricatura e assume uma exposição bastante pessoal do personagem, que acaba fazendo sentido para a proposta do filme e se aproxima, em termos de essência, do Dylan original — ou seja, aquele que conhecemos em sua primeira fase de aventuras.

Um dos grandes medos quando falamos de uma adaptação desse personagem para o cinema é a criação de seu companheiro de aventuras. Seja como um personagem especialmente criado para a ocasião, seja a adaptação do original, sempre fica o temor de como esta figura será representada. Que tipos de exagero o roteiro trará para ele? Que tipo de maluquices e piadas irá dizer? Minha surpresa com o Groucho interpretado por Luca Vecchi (que também é o roteirista do filme) foi das melhores aqui. Não só a aparência física de Groucho está incrível, mas o espírito, o tom de voz mais estridente, os gestos amplos e a maneira desafiadora, irônica e cômica como se dirige aos outros fazem parte das falas desse personagem. Em alguns momentos, as piadas de Dylan com a demissão dele soam chatas e repetitivas, mas isso não atrapalha em nada essa baita versão do Groucho em cena.

Optando por colocar alguns momentos de alucinação e, como é de frequente no original, brincar com a percepção da realidade pelo espectador, o diretor e o roteirista fazem uma boa trajetória investigativa, especialmente na primeira parte do curta. O bloco com a alucinação de Dylan, apesar de manter o alto nível estético que temos em toda a obra (a direção de arte aqui é incrível, calculadamente exagerada, assim como a fotografia, que também está aplaudível em seus bem pensados excessos), me pareceu estranhamente disperso, pouco preciso nas metáforas que elencou, deixando um pouco mais de interrogações que o comum, num momento que deveria ser de revelação de boas pistas para o espectador — isso, inclusive, torna o final um pouco abrupto, apesar de surpreendente.

Com um melhor apuro no processo investigativo e melhor polimento do texto em relação a algumas piadas e à interação entre Dylan e Groucho, esta adaptação conseguiria alçar níveis bem altos, mas ainda assim, dentre as versões de Dylan Dog que já vi adaptadas para o cinema até hoje (ao menos as adaptações assumidas) esta certamente foi a melhor de todas. Uma daquelas versões que, a despeito de alguns tropeços, é capaz de colocar um sorriso no rosto de quem gosta desse icônico personagem ou de quem aprecia um bom giallo com elementos sobrenaturais.

Dylan Dog: Vítima das Circunstâncias (Vittima Degli Eventi / Dylan Dog – Victim of Circumstances) — Itália, 2014
Direção: Claudio Di Biagio
Roteiro: Luca Vecchi (baseado nos personagens de Tiziano Sclavi)
Elenco: Valerio Di Benedetto, Alessandro Haber, Milena Vukotic, Luca Vecchi, Ludovica Bargellini, Lucia Batassa, Massimo Bonetti, Alessandra Calamassi, Max Cocullo, Mattia Coluccia, Maria Luisa De Crescenzo, Arianna Del Grosso, Chiara Iommi, Rossella Iommi, Sara Lazzaro, Luca Manzi
Duração: 51 min.

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