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Crítica | Dylan Dog – Vol. 280: Mater Morbi

A verdade sobre as doenças.

por Luiz Santiago
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Em dado momento de Mater Morbi, fala-se que muitas pessoas não têm medo da morte e até podem desejá-la; algumas outras podem gostar e lucrar com a guerra; e outras até sentem prazer em algum tipo de sofrimento. Mas será bem difícil encontrar um número grande de pessoas que gostem de doenças. De estar doente, prostrado, frágil, sofrendo longamente de um mal qualquer. Com roteiro de Roberto Recchioni, esta história de Dylan Dog foi premiada em 2016 com o Ghastly Awards de melhor graphic novel original de terror, um prêmio merecido não apenas por explorar um assunto sério dentro desse gênero, mas por fazê-lo de maneira amplamente identificável, seja através de algo sentido pelo próprio leitor, seja por algo que ele presenciou outras pessoas sentirem. Estar doente ou ver alguma pessoa padecer de uma doença é uma baita provação. E este é o tema dessa aventura.

Do ponto de vista narrativo, é uma história muito diferente de Dylan Dog. Não há um cliente aqui precisando de ajuda. Não existe uma ameaça a Londres ou ao mundo. Não há um mistério envolvendo milhares de pessoas que dependem da ação direta do Detetive do Pesadelo. O foco do roteiro é o próprio protagonista. Ele está doente, sofrendo de algo no estômago que os médicos não conseguem identificar, e que potencialmente pode matá-lo. Por essa razão, o enredo é bastante pessoal, mostra fragilidades, fala sobre as dores e a maneira de Dylan enxergar a saúde do corpo e sua relação com os métodos, pessoas e lugares de tratamento (ele é um hipocondríaco que detesta médicos e hospitais) e traz para o público o pensamento sobre esse estágio da vida pelo qual todos nós já passamos ou vamos passar: seguir vivendo com um pequeno desespero aliado a uma esperança cada vez mais claudicante de ficar bom. Ainda assim, a maioria de nós luta até não poder mais. Exatamente como faz o personagem.

A arte de Massimo Carnevale se volta para um interessante contraste entre ambientes. Começamos no estamos no espaço estéril de um hospital, onde a primeira coisa que vemos é um comunicador com cara de HAL 9000. À medida que os pensamentos de Dylan Dog viajam e ele procura se lembrar de como tudo começou, o estilo muda para uma arte aquarelada, com finalização mais suave e que serve para indicar diferentes atmosferas e sentimentos do passado. Mas o roteiro não está apenas interessado em explorar o sofrimento, a apreensão, o medo e até a raiva desse homem por estar nessa situação. Recchioni procura nos mostrar um ponto de vista muito particular aqui. Ele investiga como é o reino da própria doença, a mãe de todas, a Mater Morbi. E nessa seara é que a edição alcança a sua grandeza.

Com referências a Klaus Kinski (na face de um dos doutores que cuidam de Dylan) e à Morte (de Sandman), Mater Morbi é aquele tipo de história tocante, que nos faz pensar sobre algo arraigado à humanidade e que nunca é visto por um ponto de vista mais pessoal, concebendo a doença como um Ser, uma entidade. O jogo entre o corpo padecendo e a relação [da alma] da pessoa doente com a Mãe das Doenças é uma proposta bastante macabra do roteiro, e pode encontrar-se até com algumas possibilidades religiosas, se a gente pensar bem. Talvez seja esse jogo que torne a aventura ainda mais intensa. Não gosto tanto da penúltima e da última página, mas entendo por que o autor escolheu esse tipo de “retorno aos braços” da tão odiada criatura. A ideia de ciclo para esse argumento é muito importante, daí a escolha para uma recaída do protagonista no reino do sofrimento. Viver, especialmente nessas condições, não é nada fácil.

Dylan Dog – Vol. 280: Mater Morbi (Itália, dezembro de 2009)
No Brasil:
Editora Lorentz (novembro de 2017)
Roteiro: Roberto Recchioni
Arte: Massimo Carnevale
Capa: Angelo Stano
100 páginas

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