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Crítica | Ele é Demais (2021)

por Laisa Lima
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De Minha Bela Dama (1964) até A Casa das Coelhinhas (2008), os filmes que consistem em transformar seus personagens dão certo. A gata borralheira que vira uma beldade, a plebeia que vira uma princesa, a “esquisitona” que vira rainha do baile… e por aí vai. A despeito deste último prelúdio, uma de suas versões está em Ela é Demais (1999), de Robert Iscove, um clássico do estilo teen de se fazer uma obra. Aproveitando a fórmula ainda útil depois de mais de 20 anos, Ele é Demais (2021), de Mark Waters, embarca em uma história que muda somente o gênero de seu foco; agora a troca de um impopular para um indivíduo popular se destina ao sexo masculino. Entretanto, este sistema de produção adolescente pode mostrar-se datado caso não haja a habilidade de encaixá-lo em uma Era que anseia por novidade. 

Padgett Sawyer (Addison Rae) é uma digital influencer que vive pelas redes sociais. Entretanto, seu lugar natural torna-se seu próprio traidor; em uma de suas lives, a jovem flagra seu namorado a traindo em um trailer e instantaneamente vira piada na internet. Para se reerguer, já que havia perdido seu patrocínio, e após uma aposta com uma de suas melhores amigas, Alden (Madison Pettis), a personagem toma para si a missão de fazer um garoto fora dos padrões, encaixar-se no modelo americano de um estudante digno da popularidade. Porém, o afortunado, Cameron (Tanner Buchanan), pouco se importa com isto. Logo, o jogo de Padgett em busca da aceitação do rapaz, sem o mesmo perceber que é alvo de uma competição, será tão difícil quanto o mantimento da falsa vida perfeita da protagonista, que mente até sobre sua verdadeira moradia.

Se em 1999 caíam bem enredos adolescentes superficiais mas condizentes com o boom de produções nesse estilo e à frente de seu tempo, como o antológico 10 Coisas que Eu Odeio em Você e o copiado American Pie, em 2021 o método parece obsoleto. Não há muito o que mostrar, além de pop ups de mensagens e emojis na tela, típicos de filmes que querem reafirmar a presença dos tempos online, e alteração do escopo do makeover, no caso, um garoto. Resta, então, dois personagens centrais que pautam-se no julgamento externo; Padgett não esconde isso, já Cameron tenta mascarar tal atitude embaixo de uma carapuça contra essa mesma futilidade. No final das contas, ambos servem a um protótipo proposital de inverso um do outro semelhante a qualquer outro longa-metragem com essa pauta. Apesar disso, Addison e Tanner são capazes de originar algum carisma dentro da frívola condução da narrativa, embora seus encontros sejam pré-combinados de maneira visível até para um filme.

As ocasiões genéricas para aproximação dos personagens principais – a cena em que os dois se divertem com os cavalos é o pretexto para o início da amizade – podiam funcionar, visto a espécie de obra que é proposta aqui, sem maior preocupação, como é de praxe, com a profundidade dramática das sequências. No entanto, tudo acontece sem impasses, incluindo a conversão de um garoto que era para ser inflexível em suas ideias, para um adepto a conviver, a gostar e a seguir a maneira de viver de Padgett, personificação do inverso das conceituações de Cameron. Continuando ultrapassado, a maneira do rapaz de agir, vestir e pensar, ainda que aceitável na realidade fora do cinema, é tratada na obra como uma aberração, necessitando de reconstrução para se enquadrar no ambiente escolar norte-americano. Na verdade, não há nada de errado com o garoto. Outro fato para além da atmosfera não ficcional: duas meninas lésbicas, ambas de aparência com descendência da Ásia, formam os únicos pontos – coincidentemente?-, não padronizados na trama, servindo somente para preencher a lacuna da representatividade.

No visual, Ele é Demais se restringe a convencionalidade. Dada outras produções de mesmo cunho, o trabalho de Mark Waters não sai de uma caixinha reservada para um público juvenil falhamente crítico. Com uma fotografia estourada e sem estilizações, a obra não utiliza nem uma possível potência (a trilha sonora) à seu favor, caindo em uma mesmice fisionômica. No enredo, o prosseguimento de eventos propícios à junção de Padgett e Cameron não são surpresa se for revisitado o filme de 1999, que, embora tenham situações diferentes, culminam em um mesmo lugar. Independentemente do escasso vigor que o longa-metragem atual traz, o roteiro permite momentos de diálogos interessantes, causando uma certa empatia no público.

Ele é Demais procura ser um remake de ar repaginado, por mais que siga os passos de Ela é Demais. Contudo, os erros de execução, tais quais as circunstâncias óbvias mal trabalhadas e a superficialidade acima do tom, fazem duvidosa a experiência de um espectador mais em alerta. Agora, para um ávido apreciador dos dramas adolescentes, o filme poderá não se igualar à diversão do originário, mas trará instantes de despretensão bem-vindos para quem não se atenta (ou não se importa) com incomplexidade de um arco de acontecimentos. Além de não oferecer isso, o filme decai em quesitos primordiais, haja vista a comunicação entre a audiência e os personagens, que às vezes possuem um vislumbre de simpatia, mas não o suficiente para ser o sustento da história. Portanto, se há alguma dúvida entre assistir o filme de 2021 ou de 1999, pense: “será que a suposta modernidade do divertimento vale mais que quem o concebeu?”.

Ele é Demais  (He’s All That  – EUA, 2021)
Direção: Mark Waters
Roteiro: R. Lee Fleming Jr.
Elenco: Addison Rae, Rachel Leight Cook, Tanner Buchanan, Matthew Lillard, Madison Pettis, Peyton Meyer, Isabella Crovetti, Kourtney Kardashian, Vanessa Dubasso, Annie Jacob, Andrew Matarazoo.
Duração: 88 min.

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