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Crítica | Em Busca do Prazer (Amuck!)

Giallo libidinoso.

por Luiz Santiago
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Greta (Barbara Bouchet, num papel que originalmente seria de Edwige Fenech, que acabou desistindo de assiná-lo quando descobriu que estava grávida) é uma jovem secretária que trabalha para uma editora americana e que chega a Veneza para assumir o cargo na casa de um famoso escritor. Na cena de abertura do filme, o diretor e roteirista Silvio Amadio faz um breve passeio pelos canais da cidade, e vai se encaminhando para o interior, para um lugar mais afastado, onde a casa do escritor se localiza. É um movimento muito bem pensado, porque mostra que essa personagem vem de um cenário cosmopolita e acaba entrando por vontade própria em um território perigoso, onde dificilmente conseguirá ajuda, caso precise. A montagem nessa sequência de abertura vai progressivamente nos dando a sensação de isolamento, até que a jovem chega à casa de Richard Stuart (Farley Granger), onde deverá trabalhar.

A tônica da obra é a do isolamento, colocando a protagonista em um ambiente de terror. O espectador passa a suspeitar do anfitrião e de sua esposa, ainda mais quando descobrimos que Greta está “infiltrada” ali, tendo aceitado o posto de secretária de Richard para ver se chegava a uma resposta sobre o que aconteceu com sua amiga que anteriormente ocupava o posto, e que desapareceu sem deixar rastros. O roteiro aparentemente não dá muita atenção para essa investigação — focando, compreensivamente, na estadia de Greta na casa — mas ela terá um papel muito importante para o engrandecimento da trama, especialmente no final, quando ganha ares de “crime insolúvel“.

Há uma interessante similaridade na forma como o diretor Silvio Amadio flerta com o estilo de Lucio Fulci aqui, ao abordar o crime e a sexualidade, buscando referências em filmes como Uma Sobre a Outra e, principalmente, em Uma Lagartixa Num Corpo de Mulher. Amadio, todavia, valoriza o terror. A investigação está em segundo plano e sua construção do medo e da claustrofobia da protagonista, em uma casa com pessoas suspeitas e com reuniões regadas a bebida e sexo em grupo é que ganha destaque. Barbara Bouchet vai se tornando cada vez mais desconfiada e amedrontada, mas o jogo que o roteiro faz com a ideia de culpa e da própria execução do crime desvia tanto a personagem quanto o espectador dos suspeitos óbvios e da resolução mais fácil. Então a direção procura criar uma relação direta com a morte e até com o mundo sobrenatural, num jogo que indica uma “educação comportamental” de Greta por parte de seu patrão.

Os momentos de suspense são fortalecidos através de planos engenhosos e boas construções de atmosfera dramática. As panorâmicas onde vemos Greta ouvindo as gravações de Richard para o seu novo giallo literário são belíssimas, com uma fotografia em meia-luz e com a personagem filmada em ângulo que não indica alguma fraqueza de sua parte, mas a ideia de que ela está aprisionada e que pouco pode fazer. Isso é ainda mais expandido na marcante sequência nos pântanos, a minha favorita de todo o filme. Greta correndo, com medo dos tiros de Eleanora (Rosalba Neri), no meio de uma plantação, e toda uma série de possibilidades terríveis colocando-se à sua frente. É uma cena visualmente incrível — a direção de fotografia aqui, juntamente com os figurinos, estão primorosos — e o sentido geral desse momento tem um grande peso para a obra, o que torna um lamento ainda maior a forma como ele se encerra.

Silvio Amadio não está fazendo um drama que critica o sexo sem compromisso e fetichista, como algumas articulistas dizem, dando à fita a alcunha de “giallo moralista“. Isso não existe aqui. A libido — ou uma forma muito particular de seu exercício — é apenas o ingrediente de um cenário viciado. Nós já conhecemos muito bem os ambientes dramáticos onde o assassinato, o mistério e o terror estão ligados aos enredos onde o sexo está em evidência (aliás, o slasher, quando copiou o giallo, também levou esse ingrediente consigo), e muitas vezes esse ingrediente é apenas uma das molas narrativas, não necessariamente um caminho punitivo exposto por roteiristas pudicos. Silvio Amadio não olha o sexo como algo negativo ou ruim, neste filme. Sua visão é crítica quando o ato é forçado e quando é utilizado como parte de um ritual violento, não como ato em si mesmo, pelo prazer do sexo. A busca do prazer que o título do filme nos indica não é aquela causada pelo sexo. Mas a do massacre de outras pessoas tendo como meio do caminho, o ato sexual.

Em Busca do Prazer (Amuck / Alla ricerca del piacere) — Itália, 1972
Direção: Silvio Amadio
Roteiro: Silvio Amadio
Elenco: Farley Granger, Barbara Bouchet, Rosalba Neri, Nino Segurini, Dino Mele, Umberto Raho, Patrizia Viotti, Petar Martinovitch, Bruno Alias
Duração: 98 min.

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