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Crítica | Emmanuelle 2

Erotismo que rejeita o clímax.

por Luiz Santiago
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Tudo aquilo que deveria constar, em essência, no filme de abertura da saga Emmanuelle, nós encontramos neste segundo lançamento, que estreou em dezembro de 1975 e trouxe consigo um baita salto de qualidade: um trabalho que sabe lidar com o erotismo — a partir de uma perspectiva até bastante crítica, como desenvolvo adiante — e que se afasta de qualquer tentativa de validar a violência de gênero sob o disfarce de “quebra de amarras sociais” ou suposta “necessidade de aprender com todo tipo de prazer”. Dirigida por Francis Giacobetti, esta segunda produção ganha pontos por realizar com eficiência aquilo que obras do seu gênero se propõem a fazer e, dentro desses próprios termos, podemos dizer que foi um sucesso — especialmente se olharmos para o porco resultado obtido pelo longa de 74.

As locações na Indonésia e em Hong Kong contribuíram bastante para adicionar uma nuance visualmente instigante (tratada como “exótica” mesmo) à narrativa, criando, num espaço bem diferente do que estamos acostumados a ver, encontros eróticos fechados que agora são conectados por um fio dramático relativamente coeso, embora esteja longe de ser perfeito. É frágil, mas existe a dinâmica clássica de começo-meio-e-fim que dá sustentação ao trânsito da maioria dos personagens, com exceção do jovem piloto Christopher (Frédéric Lagache), um personagem que tinha tudo para servir de conflito ao desejo de Emmanuelle (ele é o equivalente à Bee do outro filme), mas torna-se um estranho McGuffin. Esse uso até poderia ter uma melhor figuração no enredo se fosse dada ao personagem uma sólida justificativa de permanência e saída de cena, o que não acontece.

Justamente porque valoriza e entende o erotismo, Giacobetti não se constrange com a nudez, nem com o movimento dos corpos e com a beleza e calor dos encontros sexuais, de modo que as simulações de sexo são todas bem filmadas e o corpo masculino não é algo a ser evitado, como aconteceu no filme anterior. Ou seja: há realmente uma dança erótica acontecendo e a câmera, assim, pode fazer um trabalho mais delicado, deixando as cenas visualmente bonitas e genuinamente libidinosas. É claro que a sensação de esquetes temáticas permanece, mas já é um alento ter algum tipo de base narrativa para entender o que esses personagens querem e o que os empurra para essa experimentação toda do prazer. E, sem querer teorizar groselha, como fez o guru do outro longa, o roteiro mostra para o espectador a nuance do desejo que explora, da imaginação de Emmanuelle para a cena de estupro que uma passageira do barco lhe conta, até o sexo a três que encerra a película. 

O acordo de liberdade no casamento de Emanuelle e Jean (agora interpretado por Umberto Orsini) é mais honesto e transparente neste segundo filme, com ambos entregues aos seus desejos, escolhendo seus parceiros e matando suas vontades. Mas há algo curioso nisso tudo. Toda cena de clímax do sexo, para ambos, é cortada de maneira abrupta ou integrada a uma cena de movimento fora da luxúria, logo na sequência — como se o gozo, para esses personagens, não tivesse importância e fosse até pouco desejável. Vemos que as cenas de flerte, conquista, preliminares e o próprio ato do sexo recebem um tratamento cuidadoso por parte da câmera, com mudanças de ângulo e interessante dinâmica de toque e movimento dos atores, sempre em cenários diferentes, frutos de uma direção de arte caprichada, mas irreal. É como se as melhores partes da relação, para Emmanuelle (e por tabela, seu marido), fossem o antes e o durante, nunca o momento de encerramento. 

Sylvia Kristel adota uma postura muito madura aqui, interpretando uma Emmanuelle mais agressiva sexualmente (não no sentido negativo do termo) e notadamente insaciável. Ela não se deixa dominar por Jean, mas isso nem é uma questão, já que o roteiro não tem o peso opressivo (disfarçado) do esposo. Ao escolher seus parceiros, os lugares e a quantidade de sexo que quer, Emmnuelle mostra que chegou a um acordo claro com Jean e que entende muito mais de si mesma. Parece, porém, que ainda há algum impedimento em toda essa caça ao próximo parceiro ou parceira. Ela não quer que o ato acabe, por isso rejeita o clímax silenciosamente. A languidez que vemos em seu olhar, na cena final, acompanhada pela música quase chorosa de Francis Lai, nos confirma isso. Ela tem o que quer, mas talvez não consiga aproveitar de verdade porque tem que enfrentar o fim. Seria essa a causa de sua vontade imensa? 

Emmanuelle 2 (Emmanuelle: L’antivierge) — França, 1975
Direção: Francis Giacobetti
Roteiro: Bob Elia, Francis Giacobetti (baseado na obra de Emmanuelle Arsan)
Elenco: Sylvia Kristel, Umberto Orsini, Frédéric Lagache, Catherine Rivet, Henri Czarniak, Tom Clark, Florence Lafuma, Claire Richard, Laura Gemser, Eva Hamel, Christiane Gibeline, Caroline Laurence, Venantino Venantini, Jacqueline May, Jean-Pierre Nam
Duração: 88 min.

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