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Crítica | “Emperor Of Sand” – Mastodon

por Handerson Ornelas
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Remember sitting in the sun, dancing in the rain
The end is not the end you see
It’s just the recognition of a memory

(Roots Remain – Mastodon)

Poucas bandas de metal possuem o luxo de aparecer em notícias nos mais diversos cantos da mídia musical, não se limitando apenas a veículos especializados no público do gênero. E Mastodon está entre elas. Cada álbum do grupo involuntariamente arranca atenção da crítica e de seus fiéis fãs – estes que, aliás, parecem bem mais sensatos que a maioria dos headbangers reclamões com mudanças de sonoridade. Isso porque, para admirar o valor da discografia da banda, é preciso um certo ecletismo: desde o amálgama de sludge, thrash e progressivo da estreia em Remission até a total curva em The Hunter (2011) e Once More ‘Round The Sun (2014) com arranjos mais melódicos e comerciais, o grupo segue uma carreira repleta de elogios. E Emperor Of Sand, o mais novo disco da trupe de Atlanta, prova que, mesmo seu registro menos surpreendente, possui uma relevância notável.

Emperor Of Sand, como todo álbum do Mastodon, possui uma identidade própria que o discerne do resto da discografia. No trabalho em questão vemos o lado mais melódico da banda até hoje – notório tanto nos riffs mais comerciais quanto no vocais quase isentos de guturais ou graves – ao mesmo tempo que mostra vislumbres de características de álbuns como Crack The Skye (2009), o que faz sentido quando se descobre que se trata do retorno do produtor Brendan O’Brien, responsável pelo excelente disco de 2009.

O sétimo disco do grupo usa um universo lírico e fantasioso para abordar um tema delicado: o câncer e outras doenças terminais. Nos últimos anos vários dos membros confrontaram a tristeza de ver um familiar com a doença. E como a banda disse em entrevistas, tudo está muito claro nas letras uma vez que se sabe disso. É uma clara história de alguém no fim de sua vida, refletindo seus conflitos internos e tudo que confrontou em sua jornada, além da busca por uma saída milagrosa em meio as tribulações pelas quais passa.

Os primeiros singles ditaram bem o rumo que seguiria o disco. Sultan’s Curse carrega uma complexa construção musical bem similar a algumas das canções mais emblemáticas do grupo – lembrando a clássica Oblivion, por exemplo ao mesmo tempo que entrega riffs com um certo frescor de autenticidade em meio ao resto da discografia. Já Show Yourself é, provavelmente, a canção mais “comercial” de toda carreira do Mastodon, a ponto de soar irreconhecível para muitos fãs. Isenta de introdução e com um refrão daqueles que grudam na mente, soa exatamente como o estereótipo de música que millennials preguiçosos preferem ouvir hoje em dia. No entanto, é interessante notar que, ainda assim, a banda não abre total mão de sua qualidade: temos aqui um dos solos de guitarra mais extensos e surpreendentes do disco.

Desde The Hunter é notável o envolvimento crescente de Brann Daylor nas composições da banda, além de sempre corroborar a razão de ser um baterista tão renomado. Emperor Of Sand é o ápice de sua participação como compositor e seu envolvimento consideravelmente expansivo por todo o projeto. Daylor só não empresta seus vocais a Precious Stones, Clandestiny e Scorpion Breath, de resto demonstra uma tremenda evolução como vocalista, domando o vocal principal com maestria em alguns momentos. Seu timbre melancólico dualiza a voz rouca de Troy Sanders, como Roots Remain e Ancient King demonstram tão bem. Essas faixas, assim como várias outras do álbum, obedecem a uma certa estrutura “grungística” dividida entre versos pesados e distorcidos que revezam com refrões de forte teor melódico.

A produção acerta muito bem em ressaltar um clima árido vindo dos riffs, conversando perfeitamente com o cenário temático do álbum. Perceba como a fúria das guitarras de Kelliher e Hinds evocam imagens de total destruição em Word To The Wise, assim como os vocais inseridos bem ao fundo contribuem para essa sensação de algo distante, perdido. É como se as vozes estivessem ecoando em meio a uma verdadeira tempestade de areia. Esse tipo de produção evoca bandas de stoner/desert rock como Truckfighters ou Queens Of Stone Age, algo que a crueza e fuzz da guitarra de Hinds deixa escapar um certo flerte.

Clandestiny é o encontro com a morte, onde a escolha de um caminho sem sofrimento ou dores parece tentadora para o personagem que percorre a obra. Os sintetizadores aqui surgem com total estranheza e conversam com a ideia de confrontar algo tão desconhecido como a morte. Em seguida, temos uma aula de metal progressivo em Andromeda, com seu variado catálogo de riffs distintamente melódicos, com direito a backing vocals que oferecem um caráter de opera rock à canção. Scorpion Breath – com participação de Scott Kelly nos vocais – apesar de deslocada das outras faixas, é o presente para os órfãos do sludge metal de Remission. E por fim, Jaguar God é um belo encerramento de quase 8 minutos, uma viagem que vai de cordas acústicas a riffs flamejantes, embora sua transição para o trecho “pesado” soe bem aquém do que a banda pode entregar.

Emperor Of Sand é a resposta pra quem pode perguntar a razão do Mastodon causar sempre tanto burburinho. Muito além de ser apenas uma banda com músicos de altíssimo nível, é perceptível a busca do grupo em oferecer caminhos arriscados e uma sonoridade muito acima do “mais do mesmo” entregado em exaustão por grande parte do cenário “metaleiro” da atualidade. Até o menor dos acertos do grupo, como é o caso deste aqui, continua bastante a frente de seus rivais.

Aumenta!: Sultan’s Curse
Diminui!: Show Yourself

Emperor Of Sand
Artista: Mastodon
País: Estados Unidos
Lançamento: 31/03/2017
Gravadora: Reprise
Estilo: Progressive Metal

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