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Crítica | Encantada

Uma mágica auto-paródia romântica.

por Felipe Oliveira
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Quem diria que o segundo filme em live-action de princesas da Walt Disney seria um híbrido, ao misturar elementos de animação clássica, CGI, e atores reais em cena. Buscando tecer subversões, em 2007, o estúdio trazia Encantada, uma auto-paródia aos arquétipos de conto de fadas e princesas costurada numa releitura musical pelo viés da comédia romântica.

O estúdio nem precisou ir muito longe ao contratar Billy Kelly para escrever o roteiro já que ele foi autor da rom-com sci-fi De Volta ao Presente, que trazia um homem redescobrindo o mundo após passar 35 anos num abrigo nuclear. E no caso de Giselle (Amy Adams), a princesa protagonista dessa auto-paródia, é jogada do universo dos finais felizes para o mundo real graças a um feitiço da rainha Narissa (Susan Sarandon) para impedir que seu enteado Edward (James Marsden) se case.

Talvez, esse argumento tenha soado trocar seis por meia dúzia ao colocar uma tradicional princesa para contestar as convenções dos contos de fadas ao se vê numa trama de comédia romântica que se passa em Nova York, mas também, é graças a essa premissa que Enchanted pavimentou a sua linha de desconstrução enquanto retirava sua protagonista do lugar de alienamento e dava alguma “emoção real” para sentir. A diferença do filme dirigido por Kevin Lima à releitura moderna de Cinderela em A Nova Cinderela, por exemplo, foi pelo roteiro de Kelly saber trabalhar com a metalinguagem usando o código das rom-coms.

O modo como a concepção de mundo de Giselle colide com o mundo real é muito bem expressada na sequência que ela é arrastada por uma multidão na Time Square enquanto esperava encontrar seu príncipe, e depois de ter sua tiara roubada por um morador de rua, ali seria só o começo para as inúmeras vezes que o texto do filme contrariaria a ingenuidade da personagem com uma realidade que pode ser bem mais dura. O interessante é que Encantada não cometeu o erro de espelhar em Giselle uma personalidade inspirada em moldes contemporâneos de subversão feminina, e sim, usou dessa familiaridade para conduzir sua sátira.

Certo de que a receita da comédia romântica é sobre os opostos que se atraem e encontram o amor verdadeiro, não muito diferente do que os contos de fadas dizem sobre as princesas que esperam ser resgatadas de suas vidas sofridas através do beijo do amor verdadeiro, mas é por manter a essência e contradição desse paradigma que o roteiro de Kelly contestava esses valores tão amplamente reproduzidos. A julgar pela cena da Time Square, Giselle não sobreviveria à Nova York, e seria só questão de tempo para o cerne se resumir a uma aventura repleta de confusão com a remodelada princesa descobrindo como voltar ao fictício reino de Andalasia. Porém, a trama convoca um prisma onde a realidade e a fantasia coexistem, assim, Giselle sempre arruma um jeito de moldar a grande cidade ao seu encanto, seja ao cortar cortina e lençóis para fazer vestidos, ao atrair os animais para ajudá-la, ou conduzir um número musical pela Central Park. Já a figura do príncipe dos sonhos guerreiro e galã, recebia uma versão abobalhada na ótima interpretação de Marsden.

Com a comédia romântica e o conto de fadas sempre se encontrando, seria fácil dizer que só esta síntese Encantada se fez um clássico satírico sobre o convencionalismo dos romances contemporâneos, sobretudo,  ao que o faz de contas diz, e não é à toa as inspirações notórias a A Branca de Neve e Cinderela, porém, toda a magia não seria possível sem Amy Adams ao encarnar tão genuinamente bem a ingênua Giselle. Sua performance sonhadora, teatral e apaixonante, literalmente uma princesa Disney, com a diferença que não aceitava ser a donzela em perigo para depois cantar feliz para os pássaros.

Também uma clara homenagem a seu histórico mágico de princesas e príncipes, madrasta má e romances, a Disney transportava para as telas uma  princesa do imaginário contemporâneo  para viver um amor nos moldes dos clássicos da comédia romântica. O resultado não poderia ser outro: divertido e encantador, mesmo sendo o mais do mesmo.

Encantada (Enchanted – EUA, 2007)
Direção: Kevin Lima
Roteiro: Bill Kelly
Elenco: Amy Adams, Susan Sarandon, Patrick Dempsey, James Marsden, Timothy Spall, Idina Menzel, Julie Andrews, Rachel Covey
Duração: 111 min.

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