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Crítica | Entre Realidades

por Michel Gutwilen
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O passado nem sempre é um lugar que queremos acessar, principalmente se ele guarda uma experiência traumática familiar. Há muitas formas tentar seguir a vida normalmente e esconder para baixo do tapete todos esses problemas. Entre elas, torna-se comum a busca por um isolamento social e por uma rotina tão protocolar que praticamente ligamos o piloto automático. Assim, a alienação parece ser o jeito mais fácil de achar um escapismo imediato. Este é o caso de Sarah (Alison Brie), que divide seu tempo em trabalhar como artesã e visitas a um estábulo, além de, nas horas vagas, assistir ao seriado fictício Purgatório (que lembra vagamente uma sátira de Supernatural) e visitar o túmulo de sua mãe.

Aliás, essa poderia ser muito bem a vida de qualquer cidadão médio: ir para seu trabalho e chegar em casa para assistir um seriado que, apesar de sua qualidade duvidosa, aliena e prende sua atenção. Todavia, há algo que diferencia Sarah das outras pessoas. Não só possui um sonambulismo que assusta sua colega de apartamento (Debby Ryan) e faz com que acorde em lugares inusitados, mas a protagonista passa a sonhar com pessoas que ela ainda irá conhecer na vida real e isso faz com que seja tomada por pensamento paranoico envolvendo clonagem e alienígenas, muito influenciado pelo programa de TV que assiste.

Obviamente, não é preciso dizer que Entre Realidades segue uma narrativa na qual ficamos tão desnorteados e confusos quanto Sarah, alternando entre a realidade e sonhos surrealistas. Seguindo o ponto de vista da protagonista, o filme tenta colocar nossa crença à prova. Estaria ela realmente sofrendo uma conspiração ou é tudo um surto psicótico por conta de sua depressão não assumida? O roteiro de Baena e da própria Brie deixa espaço para as duas interpretações, o que acaba sendo uma armadilha, já que nenhuma delas é desenvolvida bem o suficiente. Nem a metáfora para a depressão ganha mais do que uma cena de conversa com um psicólogo e nem o suspense se sustenta apenas por si só, apoiando-se constantemente em sua trilha sonora futurista que induz a ansiedade, quanto na encantadora atuação de Brie.

Falando em Alison Brie, é um mistério para mim como a atriz ainda não tenha conseguido um papel de maior destaque na carreira cinematográfica. Sua atuação em Entre Realidades é como um aperfeiçoamento de tudo que ela fez em séries como Community e GLOW até aqui, sendo principalmente uma pessoa que esbanja pureza e inocência, algo que acaba trazendo muita credibilidade para algumas situações um tanto quanto ridículas que sua personagem passa. Logo, Brie torna possível a existência de uma adulta que acredita estar vivendo dentro de um universo paralelo, o que ainda não é suficiente para impedir que várias cenas provoquem vergonha alheia, como a do cemitério ou a do banho de incenso na casa. 

Dentro desta lógica, penso até que no terço final o longa propositalmente vá perdendo sua conexão com a realidade conforme a protagonista embarca em sua loucura, mas Baena confia demais no poder imagético de seus sonhos acordados e negligencia uma maior exploração dentro da cabeça de Sarah ou das próprias informações que ele vai soltando casualmente. No fim, Entre Realidades parece ser um filme que fica no meio termo entre um episódio mal explorado de Arquivo X, uma sátira aos conspiracionistas norte-americanos e uma visão do mundo sob a ótica de alguém com problemas mentais. Uma pena que este último subtexto apenas pareça uma desculpa para que Baena brinque de tentar criar uma narrativa lyncheana, o que acaba sendo apenas genérico e sem foco definido. 

Entre Realidades (Horse Girl) – USA, 2020
Direção: Jeff Baena
Roteiro: Jeff Baena, Alison Brie
Elenco: Alison Brie, John Reynolds, Debby Ryan, Molly Shannon, John Ortiz, Jay Duplass, Robin Tunney, Paul Reiser
Duração: 104 min.

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