Em Talk to Me, a dupla Danny e Michael Philippou chamaram atenção por trazer uma nova abordagem para o popular subgênero de possessão e que, no caminho, também remetia a títulos dos anos 2000 com jogos sobrenaturais envolvendo adolescentes como pano de fundo para falar sobre luto e existencialismo, por exemplo. A temática se repete no tão falado Faça Ela Voltar, mas partindo do viés dramático para falar do luto. Mesmo para um segundo trabalho, é notável o interesse dos irmãos em utilizar o tema como forma de explorar um terror que se destaca pelo uso de imagens gráficas, em um nível que busca causar impacto em quem assiste. De todo jeito, Bring Her Back soa mais maduro, assertivo, uma vez que a direção se mostra segura do que está explorando, diferente do anterior, que queria ser chamativo e pop.
Se por um lado Fale Comigo lembrava um terror que facilmente seria irritante por ser centrado em adolescentes, aqui, os diretores australianos remetem muito ao típico forro do suspense “do estranho que dorme ao lado”, ao apresentar uma personagem com segundas intenções, — Sally Hawkins é ótima no papel de uma mulher enlutada e conflitante. O curioso é perceber que os irmãos não apelam para a construção de um suspense melodramático, e sim, usam a forma que a história está sendo contada para causar desconforto. Nesse sentido, Bring Her Back é mais sobre as escolhas criativas por trás de uma trama familiar que utiliza o cinema clássico do suspense a favor de um drama visceral, acessível e, acima de tudo, emocionante. O que ilustra muito bem isso são os últimos minutos do filme, por causar um sentimento de tristeza por um desfecho que pede por um final feliz, mesmo com toda demonstração conturbada do luto.
E o filme reconhece que está trabalhando em um lugar comum com Laura (Hawkins), personagem manipuladora, mas são criativos em criar momentos para observação. O que torna essa construção envolvente é por estarmos acostumados com a interpretação doce da atriz, e aqui, vemos uma versão machucada, buscando formas de preencher o vazio do luto. A malícia, falsidade e frieza de Laura estão nítidas desde um simples registro de uma foto entre ela e os irmãos Andy (Billy Barratt) e Piper (Sora Wong), o prediz um senso de desconfiança, mas a habilidade da direção dos Philippou está em fazer um filme para causar um efeito, uma impressão, ainda que estejam utilizando um cinema formulaico. Assim, a sacada é por pegar os códigos de um suspense clássico e aplicar a identidade estilizada popularizada pela A24, e funciona.
Nessa hora, é que os diretores conseguem fazer o que foi a marca em Talk to Me: uma mitologia com códigos visuais, imagens fortes, e o uso da câmera para dar uma visão diferente ao mundo da possessão. Aqui, utilizam de vidros, círculos e o que não é mostrado na câmera para dar intensidade emocional às cenas — a exemplo da rima visual no início com Piper, e na cena final, com a câmera na sua perspectiva — fazer uma conexão com a confusa mitologia que envolve um passado de rituais de Laura. Todos esses elementos se configuram na fórmula do terror contemporâneo que rotulam como um cinema de terror acima da média, fora da curva e “diferente do que é feito ultimamente”, mas de fato, Danny e Michael Philippou sabem como contar uma história familiar de forma envolvente e impactante. O maior exemplo disso é Laura, por ser um tipo de personagem conhecida dentro do suspense, mas que suas escolhas ainda causam incômodo, desconforto e até uma empatia — mesmo que estranha — pelo que ela faz para lidar com o próprio luto.
Seja qual for o motivo que leva os irmãos a abordarem o luto, mesmo com a semelhança narrativa e até na construção de ápice entre seus dois filmes, eles conseguiram criar duas mitologias ritualísticas que posicionam seus personagens lidando com o ciclo do luto, mas aqui, o sentimento assume uma forma física brutal, perversa e grotesca que se alimenta da fragilidade dos seus personagens. Se o terror perturbador está na moda, os Philippou sabem como fazer um filme familiar que se destaca pelo efeito de imagens impactantes, teor gráfico e sem sutileza, ser um drama emocionante sobre quando o luto ainda não encerrou suas etapas.
Faça Ela Voltar (Bring Her Back – Austrália, 2025)
Direção: Danny Philippou, Michael Philippou
Roteiro: Danny Philippou, Bill Hinzman
Elenco: Billy Barratt, Sally Hawkins, Sora Wong, Jonah Wren Phillips, Stephen Phillips, Kathryn Adams, Mischa Heywood
Duração: 104 min
