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Crítica | Fear the Walking Dead – 2X06: Sicut Cervus

por Ritter Fan
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estrelas 2

Obs: Há spoilers. Leia  a crítica de todos os episódios da série, aqui.

Dei uma chance a Fear the Walking Dead. Esperava que, mesmo com a escolha equivocada de Dave Erickson (e de Robert Kirkman também, não esqueçamos dele) em abordar apenas superficialmente o efetivo começo do apocalipse zumbi, ele tentasse fazer algo diferente do que é oferecido em The Walking Dead, a série principal. No entanto, não é isso que tem sido feito e a sensação de dejà vu é constante e incrivelmente irritante.

Mas tomarei a liberdade de voltar a essa reclamação mais tarde. Deixe-me começar com outro tipo de reclamação, uma que é ligada diretamente à história estabelecida nesta segunda temporada. Afinal, ela foi “vendida” como sendo uma temporada, digamos, marítima, algo que definitivamente a retiraria do lugar-comum. No entanto, a grande verdade é que toda a ação propriamente dita, ao longo de cinco dos seis episódios até agora se passa em terra, transformando a série em uma inédita “terra firme da semana” como, aliás, previ já no segundo episódio, We All Fall Down. Uma ilha aqui, uma praia ali, uma doca seca acolá. A repetição temática e a incapacidade de ousar do showrunner são impressionantes, mas negativamente. Para que o grande iate Abigail, o mistério de Strand, a viagem ao México se tudo que vemos são paradas, desembarques e voltas ao barco? Sinto-me como um otário por ter acreditado que uma série que prometia caminhar de maneira diferente (nem peço algo original…), esteja repetindo a já batida estrutura estabelecida pela série-mãe.

Reparem nos detalhes. Falei do plano misterioso de Strand para levar seu grupo ao México, não? Pois bem, em Blood in the Streets, Luis Flores entrou na história permitindo-nos vislumbrar a dificuldade que seria Strand entrar em Baja com um grupo grande como aquele. Cada “cabeça” precisava ser comprada, caso contrário o plano iria por água abaixo. E, nos primeiros cinco minutos de Sicut Cervus após os créditos iniciais, toda essa grande dificuldade, esse mirabolante plano misterioso acaba com um tiroteio fora de tela traduzido e narrado passo-a-passo por Daniel. Depois, vemos dois ou três tiros quebrando as janelas do Abigail, um pequeno drama com o “mata-não-mata” envolvendo o moribundo Luis e ABRACADABRA, todos os problemas desaparecem como se nunca tivessem existido. É sério mesmo que fomos enganados por cinco episódios, que toda essa complexidade era para “inglês ver”?

E, pior, ao chegar em Terra, Strand e seu grupo passam pela igreja que vimos no prelúdio e enfrentam os zumbis da paróquia que haviam sido misteriosamente mortos. Descobrimos que o referido prelúdio, que inicialmente parece um flashback para algum tempo atrás, deve ter acontecido, no máximo, há um dia, fazendo com que a chegada de Strand à propriedade de Celia Flores (Marlene Forte), mãe de Luis, seja providencial e coincidente ao extremo, permitindo que ele ainda visse a morte de seu amado Thomas Abigail, que fora mordido. O que se desenrola daí é drama barato do pior tipo, daqueles vendidos em banca de jornal em papel jornal. Um pacto shakespeariano de suicídio, um mistério zumbi, uma matriarca sinistra, um Daniel perdido, um Chris psicopata. De tudo um pouco para todos os gostos, menos para quem gosta de séries de TV com bons roteiros…

Mas a cereja no bolo – e aqui eu volto para minha primeira reclamação – é notar que todas essas linhas narrativas, de uma forma ou de outra, já foram abordadas em The Walking Dead. Erickson dá apenas nova roupagem a elas, sem se preocupar com cadência, acelerando acontecimentos e criando uma correria no roteiro de Brian Buckner que acaba banalizando tudo. Vejam Strand e Thomas, por exemplo. Os dois atores conseguem, no pouquíssimo tempo que têm, dar credibilidade ao relacionamento de seus personagens, mas todo o esforço na atuação é desperdiçado em dramalhão excessivo, em diálogos vazios e banais. Querem outro exemplo? Psycho Chris. De um garoto chato, ele torna-se um louco varrido que tem vários parafusos a menos, e isso praticamente de um dia para o outro. Ah, mas ele sofreu traumas terríveis. Ok, entendo o ponto, mas o problema, novamente, é a velocidade vertiginosa com que tudo acontece. Nesse mesmo episódio, em questão de horas, ele passa de alguém que reclama porque ninguém mais quer falar com ele (também pudera, pois é o Sr. Antipatia em pessoa…) a um quase assassino capaz de matar mãe e filha dormindo. Claro que ele não ia conseguir ou mesmo tentar – o suspense vazio chega a ser patético – mas o mero fato de ele ter entrado no quarto e segurado a faca já é suficiente para jogar o sujeito na jaula de zumbis…

Aliás, falando em jaula de zumbis, o que foi aquilo? Quer dizer então que Celia é a versão feminina do Governador? Uma matriarca religiosa que acha que os zumbis são seres pensantes, que são o “próximo passo” da humanidade e que é capaz de matar um padre e seu rebanho com hóstias envenenadas? Reparem como a descoberta de Daniel, que chega a ser bem construída graças a direção de Kate Dennis e a fotografia noturna do episódio, não surpreende nem um pouco e como seu enfrentamento posterior é corriqueiro e simplista.

E o mais interessante personagem até agora, Nick, ganha uma espécie de aura messiânica, algo que de certa forma já havia ficado claro quando Strand vê a qualidade no jovem logo quando eles se conhecem em Cobalt, na primeira temporada. Agora é Celia que vê algo diferente em Nick e os diálogos que os dois travam, muito distante de serem interessantes, são apenas estranhos, diria até deslocados e descontextualizados.

E claro: novamente temos uma “fortaleza murada”. Quantas vezes tivemos isso em The Walking Dead? Já é a segunda em Fear the Walking Dead. Repete-se o padrão, mas sem nenhum resquício de impacto. Espero que não resolvam transformar a hacienda em uma nova Alexandria…

O que realmente se salva em Sicut Cervus é a direção da já citada diretora australiana Kate Dennis, que trabalhou em Turn: Washington’s Spies, Sleepy Hollow e The Mindy Project, dentre outras séries. Mesmo sem material bom para trabalhar, ela consegue criar atmosfera usando uma câmera muitas vezes estática, bem posicionada, que consegue extrair dos atores o melhor possível. A tensão que ela constrói e deixa no ar é palpável e ela assim o faz sem ser intrusiva e óbvia, empregando filtros que delicadamente realçam a aridez e a crueza da situação e das decisões tomadas. Mas não há muito mais o que elogiar nesse episódio.

Tentei com todas as minhas forças, mas Fear the Walking Dead parece caminhar para a “estrada mais viajada” e isso me dá uma tremenda angústia, uma sensação de oportunidade desperdiçada e dinheiro indo para o ralo, dinheiro esse que poderia ser empregado em uma série diferente, engajante, corajosa. Infelizmente, parece-me, porém, que a escolha mais fácil, a repetição são o que alimentam a indústria hoje em dia, cabendo ao espectador simplesmente aceitar mais do mesmo ou recusar-se a embarcar nessa canoa furada…

Fear the Walking Dead – 2X06: Sicut Cervus (EUA, 15 de maio de 2016)
Criação: Robert Kirkman, Dave Erickson
Showrunner: Dave Erickson
Direção: Kate Dennis
Roteiro: Brian Buckner
Elenco: Kim Dickens, Cliff Curtis, Frank Dillane, Alycia Debnam-Carey, Mercedes Mason, Lorenzo James Henrie, Rubén Blades, Jamie McShane, Shawn Hatosy, Sandrine Holt, Colman Domingo, Michelle Ang, Brendan Meyer, Dougray Scott, Arturo Del Puerto,  Daniel Zovatto, Jesse McCartney, Veronica Diaz-Carranza, Mark Kelly, Marlene Forte
Duração: 45 min.

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