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Crítica | “Fine Line” – Harry Styles

Um namorado rockstar.

por Kevin Rick
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Tastes like strawberriesOn a summer evenin’And it sounds just like a song
I want more berriesAnd that summer feelin’It’s so wonderful and warm

Em uma entrevista à revista Rolling Stones, Harry Styles disse que seu álbum Fine Line é sobre fazer sexo e sobre se sentir triste. É a melhor definição para a juventude inconsequente e exagerada, não é mesmo? Rompimento de namoros levam a crises existenciais e um dos maiores propósitos de viver está no amor debaixo de lençóis. Sei que nem todos são assim, mas a maioria é, pelo menos às vezes. Styles, membro por anos de uma boyband, não é estranho às canções de namoro e aos melodramas juvenis, então é curioso como o artista não tem tentado se desvencilhar dessa identidade, abraçando sua figura de namorado.

A parte interessante é a abordagem musical do cantor, se distanciando do tom meloso e imaturo de One Direction ou da pegada R&B genérica que seu ex-parceiro Zayn assumiu. Styles é mais um namorado funky e retro-soul que caminha pelas brisas californianas como um rockstar que saiu do guarda-roupa atemporal de David Bowie, sensualmente relaxado e descontraído mesmo em suas melancolias.

A primeira faixa do álbum, Golden, dita a abordagem calma e setentista do disco, com uma letra que é tanto uma ode a uma garota quanto à Califórnia. O título da faixa referencia a famosa ponte de São Francisco, uma cidade conhecida pela liberdade e a libertinagem sexual, assim como as harmonias e arranjos sutis da canção com slide guitar, coros de fundo, ecos de glockenspiel e baixos acordes de piano criam a abertura perfeita para uma viagem costeira. O lirismo não é poético, mas é romântico de uma forma serena, algo que Styles entrega com cuidado em sua performance apaixonada.

A segunda faixa do álbum é a hiper-sensual Watermelon Sugar, em que Styles descreve um encontro sexual com metáforas de frutas doces e dias de verão. Em uma indústria musical cada vez mais pornográfica e explicitamente boba com sexo, é tão bacana escutar uma canção sobre prazeres com tanta criatividade nas letras. É sexy, mas também é engraçado e delicioso de ouvir ao mesmo tempo, principalmente considerando a harmonia funky (com destaque para a linha de baixo). Gosto muito da performance sedutora e agradável da voz de Styles, lentamente construindo um clímax de êxtase na canção, chegando com trompetes de fundo. Um dos hinos pops mais apimentados e gostosos de ouvir dos últimos anos.

Adore You é quase uma extensão da faixa anterior melodicamente falando (continua meio funk, meio pop), mas a letra é menos inspirada e um tanto genérica em seus trechos românticos. Tenho a mesma reclamação com a falta de inspiração lírica em Lights Up, uma canção sobre amor próprio com o eu-lírico questionando se sabemos quem somos. No entanto, continuam sendo músicas bem agradáveis de ouvir no pop funk/soul de Styles, sendo que Lights Up também traz características de baladas com sua batida delicada e harmonia de piano, gentilmente e acusticamente dançante.

Falando em acústico e balada, o álbum segue a tracklist com a meditativa Cherry, uma canção com elementos doces de folk em uma letra clássica sobre o término de um relacionamento, incluindo ótimos vocais feridos de Styles, além de incluir um interlúdio final com a voz da ex-namorada do cantor em fade out de cortar o coração. É, o artista não estava brincando quando disse que o álbum também era sobre se sentir triste, o que também vemos nas canções que sucedem Cherry.

Em Falling, temos um relato em piano sobre lamentação e culpa; já em To Be So Lonely, o eu-lírico é introspectivo com autorreflexão (adoro o trecho “And I’m just an arrogant son of a bitch” e a forma sincera que Styles versa sobre isso), com o arranjo acústico passando por ukulele e violinos flutuantes para nos passar a dimensão triste do cantor; e, por fim, temos a idílica She, um slow jam de madrugada com distorções de guitarra e um lirismo apaixonado que me lembrou o britpop de Arctic Monkeys em AM, ainda que com um estilo mais suave e solos espirituais.

Com exceção da onírica She, todas as canções a partir de Adore You têm letras comuns em termos de romantismo, coração quebrado e as ponderações sensíveis pós-término de relacionamentos, o que diminui a qualidade criativa do álbum como um todo, mas são faixas que mantém uma qualidade musical pop com a predileção acústica delicada de Styles. Confesso, porém, que em termos sequenciais Fine Line acaba ficando estranho, começando com canções funkys animadas, e logo depois se debruçando em dores amorosas por muito tempo, até tudo se alegrar novamente em Sunflower, Vol 6.

Claramente inspirada em Vampire Weekend, a faixa tem um estilo de rock psicodélico e de dancehall, com harmonia de muitos instrumentos seguidos por guitarra elétrica, além de conter um lirismo sincopado e criativo em mais metáforas de Styles, resgatando aquela ideia retro do disco. A narrativa lírica continua na divertida Canyon Moon, uma canção meio folk, meio música de fogueira com melodia de palmas e uma letra cotidiana e mundana sobre retornar para casa.

As coisas voltam a ficar setentistas em Treat People with Kindness, uma canção que levemente evoca um opera rock – o começo até me lembra Queen -, mas que acaba sendo mais gospel e Motown no coro de fundo e novamente em palmas em um soul bonitinho sobre gentileza. E o álbum termina com a faixa homônima, uma balada épica de seis minutos à la Sign Of The Times nas inspirações em Bowie do artista, com lirismo agoniante sobre a ambivalência e a melancolia do que é amar, do que é um relacionamento, da autoimagem crítica de Styles com sua figura do namorado (im)perfeito e, bem, da juventude eternamente apaixonada e amargurada por essas paixões.

Assim como os relacionamentos de Styles (e de muitos de seus ouvintes), Fine Line não é um álbum perfeito. O artista faz muitas misturas, começando funk, depois partindo para um acústico, passa pelo folk e termina com duas faixas totalmente distintas em tom e melodia, e algumas dessas músicas têm letras mais inspiradas que outras. Ainda assim, Styles mantém uma coesão em termos de suavidade e sensualidade, além do álbum ser bem fechadinho tematicamente, mesmo em seus clichês românticos, e conter uma belíssima produção pop. Em conclusão, Fine Line nos mostra um artista aprendendo a se relacionar, mas também descobrindo sua identidade musical, levando o ouvinte a se identificar com muitos elementos do disco. Não sei como será sua vida romântica, mas tenho muitas esperanças nesse rockstar contemporâneo.

Aumenta!: Watermelon Sugar, Sunflower, Vol 6, She
Diminui!:
Minha canção favorita do álbum: Sunflower, Vol 6

Fine Line
Artista: Harry Styles
País: Reino Unido
Lançamento: 13 de dezembro de 2019
Gravadora: Columbia, Erskine
Estilo: Pop rock

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