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Crítica | Fotógrafo de Guerra

por Leonardo Campos
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Compreender bem Fotógrafo de Guerra é também entender os mecanismos que regem a história do fotojornalismo, prática no campo da comunicação que ganhou espaço depois que as revistas ilustradas começaram a demandar a existência do repórter fotográfico. Importante notarmos que os primeiros profissionais deste segmento eram geralmente selecionados por seus atributos físicos, pois as câmeras antigamente eram pesadas, algo que exigia o manuseio do equipamento por parte de alguém que não precisava, necessariamente, ser um grande intelectual ou ter bons atributos jornalísticos. Quem traz isso é Gisele Freund em Fotografia e Sociedade. Ela também diz que essas pessoas eram de baixa escolaridade e responsáveis pelo exercício de tarefas “menos nobres” nas redações. Os editores, na época, não se preocupavam com a qualidade, mas com o registro. Se tinha a imagem para ilustrar a matéria, bastava.

Tudo mudou com o fim da Primeira Grande Guerra Mundial, em especial, na Alemanha, nação derrotada no conflito. A turbulência na economia e na política deu ao campo das artes uma oxigenação que parecia existir para compensar suas perdas. Revistas fartamente ilustradas surgiam e se tornavam mania. Era o ponto de engrenagem de algo que logo mais, seria global. Com o advento dos novos conflitos bélicos e avanços tecnológicos, o mundo começou a emitir as suas informações de maneira cada vez mais detalhista. E, neste processo, estavam os fotógrafos de guerra, profissionais que quase sempre estão na linha de fogo não apenas para transmitir a informação e fazer história, mas também para exercer o heroísmo que respondem aos anseios psicológicos na vida de qualquer pessoa que tenha o interesse em ter feito algo de importante em sua vida. É nessa linha que se desenvolve o documentário Fotógrafo de Guerra.

A produção dirigida por Christian Frei nos apresenta a história de James Nachtwey, um dos maiores fotógrafos de guerra do século XX, tendo como direcionamento, imagens registradas durante a sua passagem por conflitos bélicos em Kosovo, Palestina e Indonésia. Indicado ao Oscar 2002 na categoria de Melhor Documentário, a realização com 96 minutos de imagens impactantes traz para o centro de sua temática a canalização da ira de Nachtwey diante das desigualdades sociais testemunhadas ao longo de sua trajetória. Para ele, muito longe de ser um aproveitamento sensacionalista da miséria alheia, a sua prática fotográfica é uma maneira de permitir que tais imagens sejam divulgadas e situações semelhantes não aconteçam mais. Esse desejo, no entanto, revela-se pura utopia, pois nada mudou desde que ele foi instigado pela fotografia da vietnamita a correr queimada, imagem emblemática dos conflitos entre Vietnã e Estados Unidos, celeuma dos anos 1970, tampouco em 2020, momento da escrita desta análise.

Formado em História da Arte e Ciências Políticas no Darmouth College, James Nachtwey colecionou muitas experiências para a execução do trabalho que o deixou conhecido. Atuou em navios da marinha mercante, foi estagiário de edição de documentários e teve o despertar para o fotojornalismo no evento mencionado anteriormente, em especial, pela foto de Nick Ut, presente em todos os livros didáticos de história e geografia política que conhecemos. As suas colocações são conectadas aos depoimentos de profissionais que o conhecem ao longo de sua carreira, dentre eles, Christiane Amanpour, chefe da equipe de correspondentes internacionais da CNN, Hans-Hermann Klore, editor estrangeiro com de longa parceria ao lado de Nachtwey, o cameraman Des Wright, Dennis O’Neill, amigo que divide a paixão pela fotografia com o cinebiografado, entrevistados editadas com eficiência por Christian Frei, em dupla jornada.

Com o próprio Nachtwey na direção de fotografia, apoiado pelas microcâmeras acopladas ao seu equipamento para que o público tivesse uma parte da perspectiva do fotógrafo ao registrar as imagens, o documentário conta com o trabalho musical em trio, assinado por Eleni Karaindrou, David Darling e Arvo Part, setor dissociado de qualquer excesso de sentimentalismo que atrapalhasse a condução de uma história já carregada de imagens que emocionam sem precisar de acordes para nos manipular. São cenas fortes, não apenas de miséria e violência, mas do sofrimento de pessoas que perderam familiares e amigos durante situações conflituosas que parecem nunca encontrar uma resolução apaziguadora para os lados envolvidos. É bastante irritante a maneira como Nachtwey invade a dor alheia para os seus cliques, mas num dos depoimentos, ele afirma que só fez as imagens com o consentimento das pessoas em questão.

Ainda assim, é inquietante ver como a sua câmera se posiciona em cliques e flashes a cada movimento de pessoas ajoelhadas diante dos cadáveres de seus entes queridos. Uma senhora aos prantos pela morte do filho, ao ser contemplada pelas lentes do fotógrafo, tem o seu desespero registrado em todos os ângulos possíveis. É dor para não acabar mais. Para  Nachtwey, é a sua maneira de abordar situações que permitam a conscientização, algo mais complexo hoje, era de maior interesse por fofocas e revistas de celebridades, contemplação do hedonismo e outros editoriais de publicações desinteressadas em focar na miséria de pontos do planeta que ainda ressoam crises catalisadas há eras por colonizadores que dissecaram o que podiam antes de deixar esses locais purgando. Ademais, para intensificar a carga dramática, somos informados que o fotógrafo foi atingido por estilhaços de granada em Bagdá e ficou inconsciente por um tempo considerável. Em atuação na Times desde os anos 1980, Nachtwey também registrou a violência humana em Ruanda, na Somália e teve como primeiro evento, a cobertura da greve de fome do IRA, na Irlanda do Norte, movimento civil marco dos anos 1990.

Fotógrafos de Guerra (War Photographer) — Estados Unidos, 2001
Direção: Christian Frei
Roteiro: Christian Frei
Elenco: James Nachtwey, Des Writgh, Christiane Amanpour, Hans-Hermann Klore, Dennis O’Neill
Duração: 96 min.

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