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Crítica | Fyre Festival – Fiasco no Caribe

por Gabriel Carvalho
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“Ele é um mentiroso.”

Um documentário sobre o fracasso em níveis surreais. Casos como esse ocupam a jornada de diversos documentaristas, que imediatamente se interessam por esses roteiros reais de comédias paródicas, margeando a existência de documentários com tons cômicos muito evidentes. E Fyre Festival – Fiasco no Caribe é realmente engraçado, quase parecendo uma obra de ficção. Mas existem certos muros que diferenciam a comédia da tragédia. Aqueles que passaram por problemas remediáveis, ou seja, o desperdício de milhares de dólares que não farão diferença na vida de uma pessoa rica, e aqueles que foram realmente machucados pelo que aconteceu em abril de 2017. O festival dos festivais aparentemente aconteceria, contudo, acabou por morrer na praia.

Essa é a narrativa, acima de qualquer outra coisa, sobre o visionário que se perdeu em sua própria ganância. Billy McFarland, mesmo sendo um antagonista muito claro para os espectadores – e não tenho problema algum com um maniqueísmo nesse naipe -, é um personagem muito interessante. Chris Smith, se erra na comédia ou no drama, é certeiro no desenvolvimento da visão das pessoas sobre esse suposto gênio, que outrora teve a ideia mais brilhante do mundo. O que certas pessoas sacrificam por um mero garoto, que por algum motivo tinha acertado no passado, nos convence da confiança. Mas os sorrisos se transformam em um atestado de sociopatia. As promessas em processos. Eis uma jornada que é competente pelas contradições de um homem muito complexo.

Os testemunham ora trajam a ironia do todo, em outros casos são entristecidos e na maior parte apenas sóbrios mesmo. Um dos entrevistados, por exemplo, é mais cru em relação ao protagonista, sugerindo um caráter quebrado, sem capacidade de sentir remorsos pelos outros. Um outro aponta determinadas questões que apenas não fazem o menor sentido acontecerem com essa pessoa em específico. Será que os passos derradeiros de Billy foram uma espécie de “suicídio” proposital, querendo, porque sim, errar novamente? Os crimes anteriores uma aposta arriscada em pensar que estaria comandando um evento com lucros multimilionários? Os problemas narrados, uns atrás dos outros, são instigantes, postos visando a cronologia episódica.

Os equívocos, no entanto, englobam o ritmo problemático. Chris Smith, através da montagem, já mostra alguns dos desastres futuros no início do longa. O documentário, em uma certa instância, remete a produções de séries exibidas em canais fechados, presas em uma redundância exaustiva. Fyre Festival não se redunda, porém, amarra-se de modo pouco coordenado na maior parte do seu tempo. Com isso, o documentário ocasiona uma contraposição de tom. O que é uma piada e o que é realmente triste se confunde. O diretor até quer, pontualmente, comentar sobre as consequências à população nativa da ilha em que aconteceria o festival, no entanto, costura isso com pequenos casos mais jocosos dos desastres que aconteceram aos responsáveis pelo evento.

Milhares de pessoas com grana, entre influenciadores, modelos e artistas, ilhadas na Bahamas. Muitas das pessoas que acabaram se dando mal com essa épica tragédia são parte de um fenômeno digital muito perturbador, que comporta uma pós-verdade muito clara. O que é verdade e o que se aparenta como verdade. A felicidade, em tempos de Instagram, não é mais sobre sorrisos sinceros, mas sorrisos bonitos, em ângulos corretos, ótima qualidade de imagem e grandes e incansáveis correções de “erros” naturais. O que é ser perfeito? O teaser do Fyre Festival sempre será uma prova dos sintomas de uma geração que não sabe mais o que é sonhar. A conquista não é mais concreta se não for compartilhada. Surge a mentira como um amargo gostinho pela utopia.

Fyre Festival – Fiasco no Caribe (Fyre) – EUA, 2019
Direção: Chris Smith
Roteiro: Chris Smith
Elenco: Billy McFarland, Ja Rule, Jason Bell, Gabrielle Bluestone, Shiyuan Deng, Michael Ciccarelli, Mdavid Low, Samuel Krost, Andy King, J.R., Brett Kincaid, Mick Purzycki, James Ohliger, Grant Margolin, Keith van der Linde, Marc Weinstein
Duração: 98 min.

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