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Crítica | Grandes Astros: Batman & Robin

por Ritter Fan
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estrelas 3,5

I’m the goddamn Batman.
– Batman

Nunca uma publicação tendo Batman como protagonista foi recebida tão negativamente por fãs e críticos como a parceria de Frank Miller e Jim Lee em Grandes Astros: Batman & Robin. E não ajudou nada o fato de a série ter sofrido gigantescos atrasos para sair, levando de setembro de 2005 a agosto de 2008 (!!!) para 10 míseros números serem lançados. E, como a cereja no bolo, a história simplesmente não terminou, com os seis últimos números prometidos algumas vezes, mas, por diversas razões (uma delas a doença grave de Miller), nunca tendo sido publicados.

Em outras palavras, Grandes Astros: Batman & Robin ainda hoje é alvo de xingamentos de leitores em geral. Mas devo dizer que essa raiva toda pelo trabalho de Miller e Lee é absolutamente indevida e provavelmente resultado da fadiga dos trabalhos de Miller em geral – em 2005 ele já estava longe de sua época de ouro – e da incapacidade de grande parte dos fãs de entenderem o que o autor queria fazer. Longe de serem perfeitos como todo o trabalho oitentista de Miller ou mesmo de sua série noventista Sin City, esses 10 números de Grandes Astros: Batman & Robin, apesar de deixarem a história completamente em aberto, são extremamente divertidos se o leitor entrar no espírito da coisa.

mosaico all star 1

As capas dos três primeiros números.

Em primeiro lugar, esqueçam o cânone do Homem-Morcego. Essa é uma história não-canônica, uma Elseworlds que o próprio Frank Miller disse se passar em seu, digamos, “Millerverse de Batman”, ou seja, dentro da linha temporal que começaria em Batman: Ano Um (a única parte canônica) e terminaria em Batman: O Cavaleiro das Trevas 2, depois de passar pelo espetacular e inesquecível Batman: O Cavaleiro das Trevas, responsável pelo literal renascimento editorial do Morcego.  Grandes Astros é localizado, temporalmente, alguns anos após Ano Um e muitos e muitos anos antes de O Cavaleiro das Trevas.

O segundo aspecto que precisa ser compreendido é que Miller is goddamn Miller e ponto final. O cara, sozinho, trouxe o Demolidor do quase cancelamento para o status de um dos heróis mais adorados da Marvel com sua série de 1979 a 1983, fez de Batman o que ele é hoje (sim, foi Miller, não Tim Burton ou Christopher Nolan), além de ter criado clássicos próprios como RoninOs 300 de Esparta e a já citada série Sin City. Não vou esquecer que ele já pisou na bola também, com o péssimo roteiro de Robocop 2 e a tenebrosa direção de The Spirit: O Filme. Mas Miller continua sendo o goddamn Miller no meu livro. E, se ele literalmente reconstruiu o Batman, tirando-o do marasmo criativo em que ele se encontrava na década de 80 do seu jeito, jeito esse que se tornou literalmente o padrão da indústria não só para o personagem como para qualquer outro super-herói, ele tinha todo o direito de voltar ao goddamn Batman e fazer goddamn o que ele quisesse, mesmo que os fãs mais sensíveis começassem a se descabelar e a queimar suas revistas em rituais satânicos.

E ele fez.

Sem nenhuma dó na consciência.

E danem-se os fãs raivosos.

Parabéns ao Miller por tentar. Ele volta ao seu universo e foca em Batman, já como o bambambã de Gotham City resgatando o jovem Dick Grayson da morte certa pelas mãos de policiais corruptos da cidade logo após que seus pais são assassinados a sua frente. Quem esperava Batman derreter seu coração pelo moleque e tratá-lo com delicadeza, nunca leu uma obra de Miller antes e aí começaram os ataques histéricos com a completamente politicamente incorreta forma como que nosso herói destrói o coitado do traumatizado garoto. São necessárias quatro edições para Miller levar Batman e Dick do local onde o resgate acontece até a Batcaverna. Quatro edições! E são quatro edições em que o abuso verbal de Batman com o garoto parece uma afronta a tudo que o herói representa.

GoddamnBatman

A frase causadora de todo o alvoroço!

Mas galera, vamos combinar. O Batman é um psicopata insano (pleonasmo?). Desculpe-me se eu acabei de destruir sua imagem de que ele é um heroizinho fantasiadinho de morceguinho fazendo o bem pela cidade. Repitam comigo: BATMAN É UM PSICOPATA INSANO! Captaram a mensagem? Pois é assim que Frank Miller o escreve e essa personalidade enlouquecida do Cruzado Encapuçado é a personalidade que todos, inclusive vocês, leitores, gostam de ver no Batman. Meditem sobre isso. Vão lá, eu espero.

Voltaram?

Pois bem, o que Miller faz é contar os primeiros dias dessa parceria entre Batman e Robin, com direito a uma enorme quantidade de personagens aparecendo sucessivamente, começando pela Canário Negro (mas não a Canário Negro bobona do Arqueiro Verde que vocês conhecem), depois Superman (panacão como sempre), Mulher-Maravilha (mais insana do que Batman, talvez), Lanterna Verde (acho que Miller tem raiva de Hal Jordan, porque o que ele faz como o rapaz é muita maldade, HAHAHAHAHAHAHA), Homem-Borracha (eu pagaria para ver uma série dele escrita por Miller!), Batgirl (Barbara Gordon sendo Barbara Gordon), Mulher-Gato (ah, Selina…), Jim Gordon (o mesmo bom moço com profundidade de cartolina de sempre) e, claro, o Coringa (uma das melhores encarnações em quadrinhos do vilão, diria). Essa profusão de personagens é indutora de dor de cabeça na mesma ordem de outro trabalho de Batman, também com Jim Lee nos desenhos: Silêncio. Tudo e todos acontecem muito rápido, meio que sem explicação ou cerimônia, quase que jogados na trama só para gerar quadros e mais quadros de pancadaria sem fim. Não dá para julgar completamente, já que a história não acaba, mas fato é que é gente demais para espaço de menos, algo que Miller poderia ter segurado em um roteiro mais bem aparado.

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Essa não é a Canário que você conhece e ama…

Só que, como eu já disse, ele é o goddamn Frank Miller! Mas sério, sem brincadeira agora, Miller está em seu “modo sátira”, que é seu modo mais constante de escrever. Afinal, de certa forma, seu clássico dos clássicos, Batman: O Cavaleiro das Trevas, pode ser lido como uma sátira. Aliás, deveria ser lido também como uma sátira. Grandes Astros é mais descaradamente uma sátira e Miller sabe disso tanto que incorporou a frase que ele utilizou no segundo número e que destaquei no início – e durante, he, he, he – dessa crítica a cada número seguinte depois que o público em geral fez bico e bateu pezinho para ela quando ela apareceu pela primeira vez. É Miller sendo Miller e brincando com todos nós, leitores, que levam esse hábito de idolatrar heróis mascarados muito a sério.

E, com isso, ele vai, pouco a pouco, montando uma história geradora de epilepsia, completamente esquizofrênica, mas hilária e cuja leitura é fácil e divertida. Além disso, para o leitor mais atento, é perfeitamente possível ver esse Batman louco (sus risadas são perturbadoras!) como a evolução do jovem inexperiente que vemos em Ano Um, mais sábio, mais seguro de si, mais cheio de gadgets e muito, mas MUITO mais sádico e o cinquentão a que somos apresentados em O Cavaleiro das Trevas, ainda extremamente violento, mas mais cauteloso e inteligente, além de bem mais amargurado. Se isso não fica claro pela caracterização, Miller não se faz de rogado e deixa dezenas de pistas visuais que ficaram ao encargo de Jim Lee.

O que me faz pensar na arte.

lantern

O começo da HUMILHAÇÃO de Hal Jordan…

Os traços de Jim Lee são mais do que conhecidos. Lindos, detalhistas, com painéis espetaculares. Mas, em Grandes Astros, ele parece ter desenhado sob a influência de doses cavalares de guaraná com açaí, pílulas de cafeína e um pozinho branco ou outro. O cara simplesmente cria um verdadeiro ataque visual que quase pula para fora das páginas para nos socar, chutar, atropelar e explodir. Chega a cansar e isso é tão positivo quanto negativo, na verdade. A quantidade de informações que Lee é capaz de inserir em cada quadro é prodigiosa, mas o resultado final é exagerado ou, como os americanos diriam, over-the-top. Continua lindo, mas é demais. Torna-se uma daquelas publicações que o leitor tem que “ver” – não necessariamente ler – com calma e de preferência, nesse caso, em formato digital para poder ampliar cada detalhe de cada sequência. Só a primeira visão da Batcaverna é tão impressionante que é perfeitamente possível o leitor gastar uns 15 minutos nela, só listando mentalmente as referências (eu sei que fiz isso e tenho certeza que não sou o único maluco por aqui).

A violência gráfica explosiva de Lee também é outro fator que leva à fadiga. Torna tudo um tanto quanto banal, ainda que gere sorrisos aqui e ali. O fato é que não conseguimos nos identificar o suficiente com os personagens ou odiar tanto os vilões assim – não dá tempo! – para nos preocuparmos com os braços quebrados, cabeças rachadas e mandíbulas fraturadas que povoam cada página.

Grandes Astros: Batman & Robin é, contrário à crença popular preconceituosa e hipócrita (que gosta de Sin City, mas quando a violência de lá é aplicada ao Batman desmaia de horror), uma boa diversão descompromissada dentro do Millerverse do herói. Está longe de ter um roteiro realmente sólido, mas também não é para ficar resmungando pelos cantos que Miller cometeu uma heresia.

E eu já contei para vocês que Batman é um psicopata insano?

Grandes Astros: Batman & Robin #1 a 10 (All-Star Batman & Robin, the Boy Wonder, EUA – 2005/2008)
Roteiro: Frank Miller
Arte: Jim Lee
Arte-final: Scott Williams
Cores: Alex Sinclair
Letras: Jared K. Fletcher
Editora (nos EUA): DC Comics (esporadicamente entre setembro de 2005 e agosto de 2008)
Editora (no Brasil): Panini Comics (entre janeiro de 2007 e dezembro de 2008)
Páginas: 200

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