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Crítica | Harlem: 2ª Temporada

Mais uma jornada de obstáculos, trocas afetivas e autodescobertas.

por Leonardo Campos
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Na análise da primeira temporada de Harlem, expus como a série usa do humor para não apenas proporcionar um alívio cômico aos espectadores, mas também funcionar como uma forma de resistência e debate, colocando na perspectiva do entretenimento, temas que todos dizem cansados de ouvir, mas que ainda insistem em se estabelecer. Basta abrir as redes sociais ou acompanhar os telejornais para se certificar da presença da misoginia, do racismo e do assédio de diversos tipos como elementos assombrosos do cotidiano. Ao longo dos episódios do programa criado por Tracy Olivier, as personagens frequentemente fazem piadas sobre suas situações difíceis, mostrando que, apesar das adversidades, há espaço para rir e encontrar alegria diante de um painel nada animador de existências exaustas de tanto ter que se apegar ao conceito de resiliência. Assim, por meio dessa mistura de humor e seriedade, Harlem reflete condições femininas contemporâneas e, por meio de suas protagonistas, “faz um estudo” sobre amizade, sexualidade, ambição e busca por identidade em um contexto cultural, social e político dominado por adversidades e contradições.

Tendo realizado uma observação panorâmica da estrutura de Harlem na análise da primeira temporada, dessa vez, pretendo especificar as principais personagens diante de suas peculiaridades. Na série, os conflitos dramáticos gravitam em torno de quatro mulheres: Camille Parks (Meagan Good), Tye Reynolds (Jerrie Johnson), Quinn Joseph (Grace Byers) e Angie Wilson (Shoniqua Shandai). Camille é professora de Antropologia na Universidade de Columbia e surge em cena como uma figura inteligente, apaixonada por sua carreira, insegura em relação a suas escolhas de vida, especialmente no campo amoroso. Ela enfrenta dilemas sobre sua conflituosa relação com Ian, um amor do passado, navegando constantemente pela pressão na vida acadêmica enquanto tenta equilibrar sua vida pessoal e profissional. Em especial, a sua jornada expõe as complexidades de ser uma mulher negra em um espaço acadêmico predominantemente branco. Tye Reynolds, fundadora de um aplicativo de namoro para pessoas LGBTQIAPN+, é a responsável por estabelecer momentos de intenso constrangimento ao longo de muitos episódios. Ela é autoconfiante, independente, assertiva e focada no sucesso de seu negócio, além de se posicionar como lésbica declarada que luta para manter uma fachada dura enquanto lida com problemas pessoais não resolvidos e enfrenta os desafios de ser uma mulher negra queer no cenário tecnológico. Quando se envolve com uma jornalista branca, começa a ser criticada por outras mulheres de seu meio. É nas passagens sexuais que ela enfrentará uma série de desafios engraçadíssimos, apesar de psicologicamente perturbadores.

Quinn Joseph, a mais “comportada” do grupo, é uma designer de moda e dona de uma boutique própria. Apresentada como amigável, sonhadora e romântica, mas também vulnerável e em busca de validação, a personagem goza dos privilégios de se originar de uma família abastada. Constantemente, ela tenta se desvincular das expectativas de sua mãe controladora e encontrar seu próprio lugar no mundo, tanto profissionalmente quanto em suas relações amorosas. Essa busca de Quinn por sucesso e aceitação reflete os desafios de aceitar a si mesma e encontrar segurança própria, em um mundo que dialoga de maneira diferente com as suas expectativas. Digamos que a personagem tenha traços conservadores quando o assunto é sexo, um contraste diante das suas amigas mais livres nesse aspecto. Ela cede espaço em seu lar para Angie Wilson, cantora e atriz que apesar de viver com intensidade a sua vida sexual, lidando de maneira feroz com o racismo e o preconceito, também é estruturada, como qualquer ser humano, por vulnerabilidades. Ela é a mais histriônica do grupo: engraçada, extrovertida e cheia de atitude, Angie é uma artista lutando para fazer sucesso enquanto enfrenta os altos e baixos da vida de uma performer em Nova York. Frequentemente, ela serve como o alívio cômico do grupo, mas também tem sua própria história de resiliência. Sua participação no musical Corra!, inspirado no roteiro de Jordan Peele, é hilária e rende alguns dos melhores momentos da série.

Com a mesma equipe técnica da temporada anterior, Harlem consegue manter, ao longo de sua segunda temporada, o nível de seu ponto de partida, entretendo e refletindo sobre a condição da mulher negra interseccional em um mundo que já mudou bastante, mas ainda carece de mais avanços na seara do respeito ao que é diversidade. Nesse segundo ano, Quinn explora sua sexualidade conhecendo como é estar com outra mulher. Tye, em sua batalha para se manter nos negócios envolvendo tecnologia, precisa lidar com o cancelamento de sua imagem em um site repleto de difamações. Camille, ainda pisando em ovos no ambiente acadêmico hostil, amplifica a sua relação com a Dra. Pruitt, interpretada por Whoopi Goldberg, garantindo um pouco mais de segurança profissional, mas trilhando uma jornada perigosa no âmbito dos sentimentos, pois retoma contato com Ian, seu amor do passado, uma sombra na primeira temporada que ainda se mantém como distração nesse segundo ano. Angie mantém os padrões dramáticos anteriores: continua em busca de um lugar no mundo artístico nova-iorquino, mesmo diante de tantas negativas e dificuldades, proporcionando ao público novos momentos hilários.

Renovada para uma terceira temporada, Harlem ainda tem o que apresentar. Aguardemos.

Harlem – 2ª Temporada (Idem/EUA, 2023)
Criação: Tracy Oliver
Direção: Linda Mendoza, Stacey Muhammad, Shea William Vanderpoort
Roteiro: Tracy Oliver, Jessica Watson, Aeryn Michelle Williams, Alisha Cowan
Elenco: Meagan Good, Jerrie Johnson, Grace Byers, Shoniqua Shandai, Tyler Lepley, Whoopi Goldberg, Sullivan Jones, Juani Feliz, Jonathan Burke, Kate Rockwell, Christine Jones
Duração: 300 min. (10 episódios)

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