Home TVTemporadas Crítica | He-Man e os Mestres do Universo (2021) – 1ª Temporada

Crítica | He-Man e os Mestres do Universo (2021) – 1ª Temporada

por Ritter Fan
6,3K views

Baseado na premissa de que ver coisa nova é sempre melhor do que ver a mesma coisa de maneira diferente, sempre fui contrário a continuações e reboots. Por outro lado, sei que eles não só são inevitáveis, como são cada vez mais constantes, pelo que o que me resta é esperar obras que realmente acrescentem algo ao original. E, por incrível que pareça, pela segunda vez no mesmo ano, depois do ótimo, mas controverso – e indutor de aneurismas em uma galerinha vocal que queria ver seu hominho fortinho como protagonista – Mestres do Universo: Salvando Etérnia, eis que He-Man ganha uma versão merecedora de muitos elogios por não se conformar de maneira alguma em fazer mais do mesmo, seguindo o espírito do reboot de She-Ra.

O curioso é que, invariavelmente, toda vez que encontro algum artigo falando sobre o novo He-Man e os Mestres do Universo, a série vem acompanhada pela informação de que ela é para crianças, como se isso fosse uma grande novidade. Afinal, o que é He-Man senão uma animação 100% mirada em crianças, originalmente lançada em 1983 justamente para vender bonequinhos? Ser “para crianças” é da essência de He-Man e se tem uma coisa que a série desenvolvida por Rob David sabe fazer é justamente manter a essência da criação original de Lou Scheimer, com a grande vantagem de o showrunner melhorar exponencialmente o material oitentista, embarcando em uma muito bem-vinda repaginação completa.

Prevejo, claro, muito marmanjo da minha idade – que assistia o desenho original no Xou da Xuxa – reclamando novamente (mas menos, pois, aqui, o protagonismo é mesmo do hominho fortinho, ainda que seus músculos torácicos não apareçam) de “infância destruída” e outras bobagens do mesmo naipe, mas a grande verdade é que esse novo He-Man mantém absolutamente tudo o que o original tinha, mas organizando cada elemento em uma primeira temporada de origem coesa, muito bem pensada e que dá espaço para cada um dos personagens que apresenta ao mesmo tempo em que recria a mitologia de Etérnia, do Castelo de Grayskull, da Montanha da Serpente e, claro, dos poderes que emanam daí, inclusive criando uma belíssima explicação lógica para o tal subtítulo “Mestres do Universo”. Diria muito tranquilamente que estamos diante da versão definitiva de He-Man, em uma série que consegue ser melhor do que a de 2002, que tentou também organizar a bagunça que era a história do personagem, mas que, por alguma razão misteriosa, acabou não fazendo sucesso suficiente.

Como disse, a pegada infantil da série de 1983 é espelhada aqui. Mas, no lugar de o design dos personagens ser um padrão fixo com alterações apenas nos figurinos, o que vemos é um cuidado extremo para que cada um ganhe personalidade visual própria, de Adam a Aríete, de Keldor ao Homem-Fera, o que inclui excelentes histórias de origem entrelaçadas que enraízam com muito mais vigor a frágil e zoneada mitologia original. Além disso, assim como na série oitentista, os designs são “ultra-deformados”, ou seja, os personagens são exagerados, maiores que a vida, só que, na criação de David, esses exageros são ainda mais exagerados, com He-Man e sua espada sendo basicamente uma versão de pele branca do Hulk Gladiador e com todos os seus amigos e inimigos ganhando o mesmo tratamento, só que cada com retendo sua personalidade física, por assim dizer, acrescentada de evoluções que, apesar de nunca ter assistindo um episódio, diria que lembra Pokémon.

A história começa em Etérnia 10 anos depois dos Príncipes Keldor (Benjamin Diskin) e Adam (Yuri Lowenthal), respectivamente irmão e filho do Rei Randor (Fred Tatasciore) terem sido dados como mortos. Mas, claro, não demora e vemos Adam vivo, mas sem memória, como parte da Tribo dos Tigres juntamente com sua melhor amiga Krass (Judy Alice Lee) e seu pai adotivo Pacato (David Kaye), um tigre sem garras tendo sua vida interrompida pela chegada da feiticeira Teela (Kimberly Brooks) que traz consigo a Espada do Poder que ela acabara de roubar dos cofres de Eternos (capital real) como uma encomenda dos vilanescos Evelyn (Grey Griffin) e Kronis (Roger Craig Smith), mas cuja mensagem mental que ela recebe a faz trair seus contratantes para encontrar o “Campeão de Etérnia”. Ainda no primeiro episódio, Adam e a espada se conectam e a tão esperada transformação acontece.

Sei muito bem que a descrição acima pode fazer muita gente virar o nariz para a série sob os argumentos bobos de que “não tem nada a ver com a original” e “isso não é He-Man”, mas vão por mim, respirem fundo e embarquem nessa aventura que sim, é infantil mesmo, pois ela, aos poucos, vai evoluindo e trazendo, de seu jeito (negritei, pois é importante ter isso em mente), todos os elementos tão nostalgicamente queridos. Não pretendo ir além em meus comentários sobre a trama, pois os 10 episódios desta 1ª temporada funcionam em uníssono como uma história de origem completa tanto para o lado dos heróis quanto para o lado dos vilões, emprestando significado, por exemplo, ao momento clássico em que, durante a transformação, He-Man aponta a espada para Pacato e o transforma no Gato Guerreiro e, também, às naturezas diferentes dos poderes que emanam de Grayskull, um tipo adotado sem escolha por Adam e outro de caso pensado por seu tio Keldor.

O que posso dizer com bastante tranquilidade é que cada personagem ganha contexto e peso narrativo. Pacato, por exemplo, apesar de não ser um tigre covarde como no material original, ganha um passado e uma baita explicação para seu nome e também para a falta de garras. Duncan (Antony Del Rio), apesar de não ser o pai adotivo de Teela aqui, começa como vilão e bandeia-se para o lado dos heróis como uma espécie de especialista em tecnologia. Teela, no lugar de ser apresentada como uma guerreira, já é uma feiticeira poderosa, algo que o próprio desenho original já armava. E o mesmo vale para a Aríete (em inglês, o nome é genial, fazendo trocadilho com Ram Man: Ram-Ma’am), para Keldor/Esqueleto (e sim, ouvimos diversas vezes a risada clássica), Evelyn/Maligna, Kronis/Mandíbula e  R’Qazz/Homem-Fera (Trevor Devall).

A animação é dinâmica, viva, faz um belíssimo uso de cores fortes e chamativas e também dos mais variados cenários que são completamente reimaginados, seja a capital Eternos, seja o Castelo de Grayskull ou a Montanha da Serpente, ainda que esta última seja a que mantenha o visual externo mais parecido com o original. As cenas de ação são muito bem trabalhadas, assim como o uso de poderes e magia. Confesso que não gosto do uso repetido das cutscenes padrão de transformação, pois, por características própria da série, elas são mais constantes e demoradas, por assim dizer, o que inclui as sequências em que os “poderes extras” são usados. Da mesma forma, faltou uma música-chiclete para esses momentos, como a que ressonava na transformação original de He-Man e Gato Guerreiro, pois a trilha sonora composta por Michael Kramer, apesar de enérgica e apesar de funcionar ao longo dos episódios, não cria a ambientação sonora que as cutscenes de transformação mereciam.

A nova versão de He-Man e os Mestres do Universo é uma agradabilíssima surpresa que faz o melhor uso possível do termo “adaptação”. Aquele He-Man bem porcaria lá dos anos 80 ganhou uma mais do que completa repaginada que tem tudo para ser um novo clássico. No mínimo dos mínimos, é uma série que já em sua primeira temporada de apenas 10 episódios, soube extrair com cuidado toda a essência do material base, jogá-la no liquidificador, acrescentar novos e saborosos ingredientes e criar um smoothie nutritivo e ao mesmo tempo delicioso que, sim, eu repito, é mesmo para crianças, mas que os adultos – inclusive os nostálgicos, com exceção dos muito chatos, claro – poderão adorar indiscriminadamente e, melhor ainda, pedir mais.

He-Man e os Mestres do Universo – 1ª Temporada (He-Man and the Masters of the Universe – EUA, 16 de setembro de 2021)
Desenvolvimento: Rob David (baseado em criação de Lou Scheimer)
Direção: Ricardo Curtis, Armen Melkonian, Matt Ahrens, Lubomir Arsov
Roteiro: Bryan Q. Miller, Heath Corson, Amanda Deibert, Keely MacDonald, Peter Binswanger
Elenco: Yuri Lowenthal, David Kaye, Grey Griffin, Antony Del Rio, Kimberly Brooks, Trevor Devall, Judy Alice Lee, Roger Craig Smith, Fred Tatasciore, Benjamin Diskin, Tom Kenny
Duração: 254 min. (10 episódios)

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais