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Crítica | Hellraiser: Renascido do Inferno (2022)

Reboot da franquia traz novos elementos, dentre eles, uma versão feminina de Pinhead.

por Leonardo Campos
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Depois de tantos filmes infernais de tão ruins, eis que a franquia Hellraiser conseguiu ganhar um exemplar com dignidade. Antes mesmo de seu lançamento, já estabeleceu polêmica, pois com a notícia de Pinhead no papel de uma mulher, muitos fãs ficaram receosos do desempenho desta figura ficcional basilar para a trama. Mas, para muito além, o reboot Hellraiser: Renascido do Inferno, lançado em 2022, nos apresenta bons resultados dramáticos e estéticos, um sopro considerável de criatividade após tantos anos de sequências ruins e apostas desconectadas com aquilo que chamamos de “essência” dos três primeiros filmes. No primeiro ato do filme, somos apresentados aos personagens e suas dinâmicas, além de uma introdução ao universo sombrio da trama. A obra já inicia com uma cena impactante: um jovem atraído para a sala macabra do novo “vilão”, criatura incauta que sequer imagina, vai se tornar uma “refeição” dos cenobitas após interagir com o cubo. É uma sequência que estabelece o tom obscuro e familiar da franquia, conectando-se com as propostas dramáticas similares ao filme de 1987, concebida pela firmeza da direção de David Bruckner, responsável por traduzir em imagens, o roteiro assinado pela dupla formada por Ben Collins e Luke Piotrowski, dramaturgos que contaram com o apoio de David S. Goyer na composição geral da trama, do argumento aos diálogos.

Hellraiser: Renascido do Inferno é uma reflexão sobre a natureza humana, a dor e a busca incessante por prazer. O filme instiga o público a questionar suas próprias relações com desejo e poder, levantando questões sobre moralidade e ética na busca de satisfação pessoal. O reboot inicia com uma advogada, que está em Belgrado, obtendo uma misteriosa caixa a pedido de seu chefe, o bilionário Roland Voight (Goran Visnjic). Ao retornar para sua mansão em Berkshires, Voight apresenta a caixa ao garoto de programa Joey, que, ao tentar decifrá-la, é gravemente ferido e enfrenta um destino trágico, tornando-se uma vítima horrenda do artefato. Seis anos depois, a trama se desenrola com Trevor (Drew Starkey), um ex-viciado, que convence sua namorada Riley (Odessa A’Zion) a explorar um armazém abandonado pertencente a um homem rico. Durante a invasão, eles descobrem a mesma caixa que causou tanta destruição no passado, sem entender seu verdadeiro poder e as consequências que isso pode trazer para suas vidas.

Após se reerguer em meio a dificuldades, Riley começa a consumir bebidas e drogas novamente, resultando em sua expulsão de casa pelo irmão Matt (Brandon Flynn), que vive com a amiga e o seu namorado. Em uma tentativa de decifrar a caixa misteriosa, Riley é ferida de maneira semelhante a Joey e começa a ter visões de criaturas estranhas, os cenobitas, que a instigam a atrair outras pessoas para a dimensão do artefato. O primeiro a desaparecer é Matt, levando Riley a investigar os antigos proprietários do armazém, revelando uma conexão com o nome de Serena, que se encontra em observação em um hospital. Confrontada pela nova realidade e pela urgência de resgatar seu irmão, a protagonista se vê obrigada a visitar a mansão de Voight, que também desapareceu. Em meio a essa busca, ela precisa encontrar uma maneira de se libertar das entidades ameaçadoras, especialmente de uma delas que carrega pregos em sua cabeça, enquanto luta contra os horrores que a cercam e as consequências do poder da caixa.

Em linhas gerais, este reboot apresenta uma reflexão interessante sobre a transformação não apenas dos cenobitas, mas também dos humanos em criaturas monstruosas, dependendo das escolhas que fazemos ao longo da vida. É uma produção que buscou e conseguiu capturar o melhor do filme de 1987, oferecendo um novo fôlego admirado por fãs da franquia. Com um desenvolvimento visual marcante, os cenobitas são um dos elementos mais impressionantes da narrativa, com efeitos práticos que se destacam pela qualidade das fantasias e maquiagens desenvolvidas pela equipe de produção. Além disso, a atuação de Jamie Clayton como Pinhead é equilibrada e coesa, com sua interpretação que respeita o desenvolvimento de longos anos do ator Doug Bradley neste personagem, apresentando um semblante vazio, uma postura ameaçadora e uma voz aterrorizante que cativam e, ao mesmo tempo, atormentam o público. Ela sabia muito bem da postura desafiadora diante de si e deu conta do recado com dignidade.

Aqui, o filme funciona como uma reinterpretação do clássico de 1987, baseado na obra de Clive Barker. Enquanto mantém elementos centrais, ele também atualiza a narrativa para explorar novos temas e motivações, atraindo tanto novos espectadores quanto fãs da versão clássica. Uma das ideias centrais do reboot é a exploração do desejo humano e suas consequências. Os protagonistas buscam prazer e poder, mas rapidamente se deparam com as armadilhas dos seus próprios desejos, refletindo sobre como a busca por satisfação pode levar a um sofrimento inimaginável. Considero o roteiro bem coeso, com alguns personagens complexos e dominados por suas próprias histórias e motivações. A protagonista, por exemplo, é uma jovem lutando com vícios e traumas, tornando-a uma figura com a qual muitos podem se identificar. David Bruckner cria uma atmosfera opressiva e perturbadora, utilizando a cinematografia para aumentar a tensão e o desconforto. Os ambientes são sombrios e claustrofóbicos, refletindo o medo e a ansiedade que permeiam a narrativa, trabalho eficiente da direção de fotografia de Eli Born e do design de produção de Kathrin Eder, adequado na cenografia, nos adereços e na direção de arte.

Interessante como o filme lida com a linha tênue entre a vida e a morte, especialmente no que se refere aos contratos e às trocas feitas com os Cenobitas. Essa temática é crucial para a construção do horror e para a compreensão das escolhas dos personagens. Como já mencionado, a nova interpretação de Pinhead oferece uma abordagem fresca e intrigante ao personagem. Seu desempenho é marcante, trazendo uma nova dimensão à figura emblemática, ressaltando aspectos de dor e prazer de maneira única. E, de volta aos comentários estéticos, a supervisão dos efeitos visuais, assinada por, e o design de som, supervisionado por, são setores eficazes, pois colaboram assertivamente com a criação de uma experiência imersiva e aterradora. A trilha sonora de Ben Lovett intensifica os momentos de tensão, contribuindo para a atmosfera geral de horror psicológico em simbiose com a representação física da violência, capturando as melhores passagens da textura percussiva de Christopher Young para o primeiro filme da franquia, reimaginado por aqui. Ademais, além do horror físico, a trama também aborda questões de trauma psicológico e superação. A jornada de Riley reflete a luta contra vícios, bem como a busca por redenção, situações que tornam a história mais acessível e relacionável com o público, garantindo algum magnetismo.

De 2022 pra cá, as notícias em torno de Hellraiser são apenas sobre uma série em desenvolvimento pela HBO. Se vai vingar? Não sabemos. O lance é aguardar.

Hellraiser (EUA – 2022)
Direção: David Bruckner
Roteiro: Ben Collins, Luke Piotrowski, David S. Goyer
Elenco: Odessa A’zion, Jamie Clayton, Brandon Flynn, Goran Višnjić, Drew Starkey, Adam Faison, Hiam Abbass, Selina Lo
Duração: 121 min.

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