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Crítica | Herança Mortal (Omicidio Per Vocazione)

A ganância de uma família.

por Luiz Santiago
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Filmes sobre heranças malditas é o que não faltam por aí. Famílias que são quebradas, separadas ou exterminadas pela ganância de alguém que queria para si todo o dinheiro deixado pelo morto é um enredo bastante conhecido até mesmo pelos nossos noticiários. Às vezes, essa ganância se manifesta de uma maneira mais lógica na arquitetura do crime, florescendo num ambiente onde qualquer problema se torna um grande evento e onde todos são culpados de alguma coisa (vide Entre Facas e Segredos). Outras vezes, a ganância se manifesta em meio a comportamentos doentios, encobertos por máscaras sociais, como é o caso deste giallo de 1968, Herança Mortal.

Marcando a estreia de Vittorio Sindoni na direção, vindo de quatro produções como assistente ou diretor de segunda unidade, Herança Mortal se passa em algum lugar da França, e o conflito é dado já abertura, quando Oscar, um senhor depressivo que trabalhava na linha férrea, morre esmagado por uma locomotiva. Para surpresa de todos, ele deixa uma grande fortuna para a família, com a condição de que seu filho adotivo, Janot (Ernesto Colli), chegue à maioridade e tenha garantido um lugar para morar. Isso dali a três anos. Não é difícil depreender qual o motivo principal da intriga, mas o roteiro adiciona algumas outras situações à obviedade, garantindo não apenas uma reviravolta, mas “uma reviravolta em cima da reviravolta”, sobrecarregando um pouco o desfecho. 

A ineficiência policial tão recorrente nos gialli aparece aqui em forma de conflito interno, com o Inspetor Greville (Tom Drake) contrapondo-se a Etienne (Virgilio Gazzolo), que é um personagem confuso, com quem o roteiro não sabe exatamente o que fazer. No começo ele aparece flertando com Colette (Valeria Ciangottini), a filha mais nova do falecido, mas esse plot é simplesmente abandonado. Depois, o vemos servir como ajudante de Greville, embora muitas vezes ele seja chamado de “Comissário” pelos outros policiais. Seja como for, é entre ele e seu “superior” que se dá o embate sobre o método de investigação, e o público terá uma boa surpresa ao final do filme, quando essa abordagem acaba mostrando a que veio.

Por mais que as mortes falsas sejam um ingrediente conhecido e até esperado dos gialli (posteriormente importado para o slasher estadunidense), todo bom uso delas tem um impacto positivo no público – e aqui não é diferente. O diretor conseguiu ocultar muito bem o assassino, dando pistas “absolutas” para que a gente suspeitasse de determinadas pessoas, até que a verdade fosse revelada e a surpresa se estampasse no rosto do público. O que pesa negativamente neste final é a dupla reviravolta. Não que o fato de ter duas delas seja um problema. Mas é que nesse contexto, os personagens que fazem parte da dupla surpresa praticamente anulam um ao outro, pela completa falta de uma relação maior entre eles e, principalmente, de uma justificativa mais expansiva para o segundo ter feito o que fez.

Em Herança Mortal, não existe uma construção cuidadosa de atmosfera de medo. O foco narrativo está no progresso ágil da história e no movimento intenso dos personagens, inclusive com sequências de perseguição (vale dizer que aquela que envolve Leon, o personagem de Ivo Garrani, se alonga demais e acaba parecendo encheção de linguiça). Isso deixa pouco espaço para aprimorar personagens, motivos ou o processo investigativo. Porém, estamos diante do primeiro filme de um diretor, e pecados como esses são facilmente compreendidos. 

Vittorio Sindoni discute a ganância através de diferentes pontos de vista nessa obra, deixando que cada indivíduo faça “aquilo que deve fazer” para colocar as mãos em uma grande quantidade de dinheiro. E não raramente, nessas situações, encontramos pessoas perfeitamente disfarçadas de “cidadão de bem” conspirando para a morte dos outros, diante das quais devem conseguir alguma vantagem financeira e, em última instância, poder. O velho rastro de sangue e crueldade que se aproveita da fraqueza de alguns, da miséria de outros, e quer ganhar alguma coisa em cima.

Herança Mortal (Omicidio Per Vocazione / L’assassino Ha Le Mani Pulite / Deadly Inheritance) – Itália, 1968
Direção: Vittorio Sindoni
Roteiro: Aldo Bruno, Romano Migliorini, Vittorio Sindoni
Elenco: Tom Drake, Femi Benussi, Virgilio Gazzolo, Ernesto Colli, Isarco Ravaioli, Andrea Fantasia, Ivo Garrani, Valeria Ciangottini, Giovanna Lenzi, Aurelio Marconi, Nicola Solari, Aldo Bruno, Alessandra Maravia, Silvano Spadaccino, Sergio Baldacchino, Arnaldo De Angelis, Giacomo Ricci
Duração: 81 min.

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