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Crítica | Homem-Aranha (1977)

por Ritter Fan
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Depois do serial do Capitão América de 1944, o próximo personagem da Marvel Comics a ganhar uma adaptação audiovisual live-action foi o Homem-Aranha, mas isso somente aconteceu três décadas depois, em um quadro intitulado Spidey Super Stories no programa televisivo infantil The Electric Company, entre 1974 e 1977, com um Amigão da Vizinhança sem falas (só balões de falas!) vivido pelo marionetista e dançarino Danny Seagren. Como não é razoável contar esse programa como uma efetiva adaptação, isso somente aconteceu de verdade justamente em 1977, quando a CBS, então, começava a especializar-se em produções tendo super-heróis como protagonistas.

O telefilme em longa-metragem conhecido apenas como Homem-Aranha foi então encomendado como um backdoor pilot de pouco mais de 90 minutos para a série O Espetacular Homem-Aranha, que começaria a ir ao ar em abril de 1978, tendo a curtíssima vida de apenas 13 episódios, apesar de ter se provado um sucesso. O longa, que foi ao ar na televisão americana em 14 de setembro de 1977 e teve lançamento internacional limitado nos cinemas, conta a origem do super-herói, com o universitário Peter Parker (Nicholas Hammond, então mais conhecido como Friedrich, um dos filhos do Capitão Von Trapp em A Noviça Rebelde), que faz bico como fotógrafo no Clarim Diário, sendo picado por uma aranha radioativa depois que um experimento dele com um amigo irradia o artrópode.

Quem viveu o final dos anos 70 e começo dos anos 80 sem dúvida alguma assistiu, se não todos, pelos menos alguns dos episódios da série, ainda que o longa em si não tenha sido divulgado com a mesma frequência. Mesmo que a lembrança da série atice a nostalgia de muitos, é inevitável concluir que os 90 minutos de Peter Parker sendo picado pela aranha, desenvolvendo seus poderes, ganhando seu uniforme e enfrentando um vilão genérico que hipnotiza as pessoas para chantagear o prefeito de Nova York, é, na melhor das hipóteses, amador e isso mesmo considerando-se a época em que a obra foi produzida.

A comparação mais imediata é com O Incrível Hulk, série que também se iniciou com um longa (dois, na verdade) e que foi produzida pela CBS no mesmo ano. Mesmo considerando-se que lá o Gigante Esmeralda era apenas Lou Ferrigno pintado de verde, havia, inegavelmente, muito mais profundidade dramática do que a completa bobagem que é o Homem-Aranha de 1977. Parker não ganha nenhuma tentativa de bidimensionalidade, nem mesmo em relação à sua tia May (aqui vivida por Jeff Donnell, mas a cada futura aparição uma nova atriz era escalada) ou aos seus dramas pessoais que ficam só na extrema superfície que alguns diálogos expositivos revelam de maneira canhestra (como ele não ter dinheiro para nada, mas simplesmente não agir de acordo e assim por diante). Até mesmo o irascível John Jonah Jameson, (David White no longa, mas que seria substituído por Robert F. Simon para a série), editor do Clarim Diário, ganha uma personalidade bem mais leve que pouco se choca com a de Parker, tornando até esses momentos potencialmente interessante em cenas extremamente brandas e sem graça.

E a origem? Bem, apesar de ser substancialmente a mesma dos quadrinhos, com apenas um Peter Parker mais velho, já na universidade, ela é muito mal executada, quase como se fosse um detalhe desimportante na história. Claro que é um avanço em relação à mais completa inexistência de conexão com o material fonte que havia sido o Capitão América de 1944, mas, mesmo assim, os eventos que se seguem à picada da aranha radioativa ocupam algo como cinco minutos do tempo de projeção, com o famoso uniforme vermelho e azul surgindo completamente do nada e levando o espectador à incômodas e inadvertidas risadas de incredulidade.

Considerando o sucesso do Aranha nos quadrinhos à época, esse descaso completo com a origem do Amigão da Vizinhança até poderia ser minimamente aceitável se ela tivesse sido compensada com a trama vilanesca, mas nem aí o roteiro de Alvin Boretz tem sucesso. Muito ao contrário – e de maneira surrealmente parecida com o já citado serial do Bandeiroso de três décadas antes – a história de controle mental por um culto em plena Nova York é cansativa e repetitiva ao extremo, ocupando artificialmente o tempo de duração do longa com bobagens simplificadas que sequer fazem uso, por exemplo, do personagem Mystério dos quadrinhos (nem que fosse só de nome), que seria perfeito para a trama.

E é claro que os efeitos especiais são hilários de ruins, com a sobreposição do Aranha engatinhando desengonçadamente no chão em superfícies verticais, com Los Angeles nem de longe conseguindo de maneira eficiente fazer as vezes de Nova York e com a teia ou sendo uma corda grossa ou uma “poeira de mansão mal-assombrada” saindo dos pulsos do herói. Mas esse problemas – assim como o Hulk pintado de verde – não são o que tornam o filme ruim como ele é, pois são deficiências práticas da época, com o orçamento do piloto e, ainda por cima, para a mídia a que foi destinado. Os problemas são de outra ordem, conforme mencionado mais acima, com os efeitos (não tão) especiais sendo de certa forma irrelevantes no contexto geral.

O Homem-Aranha live-action setentista até foi uma corajosa – e talvez prematura – tentativa de se trazer o personagem para as telinhas (e telonas), mas o resultado precisava de muito mais polimento para conseguir sequer chegar na linha mediana. Pode até ser um clássico nostálgico para muitos (como eu), mas o Aracnídeo merecia muito mais do que essa adaptação tosca e rasa e que só voltaria a acontecer em 2002, pelo aí sim espetacular Aranha de Sam Raimi.

Homem-Aranha (Spider-Man, EUA – 1977)
Direção: E.W. Swackhamer
Roteiro: Alvin Boretz
Elenco: Nicholas Hammond, David White, Michael Pataki, Hilly Hicks, Lisa Eilbacher, Dick Balduzzi, Jeff Donnell, Bob Hastings, Barry Cutler, Thayer David, Ivor Francis, Norman Rice, Len Lesser, Carmelita Pope, George Lane Cooper
Duração: 92 min.

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