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Crítica | Homem-Aranha: Tormento

por Ritter Fan
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Todd McFarlane estava surfando em sua fama de desenhista de quadrinhos ao final da segunda metade da década de 80, tendo ganhado notoriedade com seus trabalhos em Corporação Infinito e no arco Batman: Ano Dois (em Detective Comics), para a DC Comics, e, depois, em O Incrível Hulk de Peter David e O Espetacular Homem-Aranha de David Micheline, para a Marvel Comics, essa última tendo realmente sedimentado o começo de sua carreira. Mas a falta de liberdade artística sempre o incomodou e ele usou seu sucesso para pressionar a Marvel, o que resultou na criação de uma publicação nova do Homem-Aranha (apenas com o nome do personagem, sem adjetivação) só para que ele pudesse comandar integralmente o show, incluindo a redação do roteiro.

A aposta em McFarlane pagou-se imediatamente, pois esta primeira edição é, até hoje, uma das mais vendidas de toda a história dos quadrinhos dos EUA, com uma tiragem inicial – incluindo todas as capas variantes – de 2,35 milhões de cópias. Mas o autor permaneceria pouco tempo à frente do Aracnídeo ou mesmo na indústria mainstream de quadrinhos como um todo, pois, em 1992, ele largaria a Marvel para fundar a Image Comics, empreitada que sacudiu os anos 90 e que até hoje vem gerando excelentes frutos.

Voltando, porém, ao primeiro arco dessa publicação feita sob medida para McFarlane escrever, desenhar e arte-finalizar, percebe-se muito claramente que o artista ainda estava em fase de treinamento de redação de roteiros, pois Tormento, se espremermos bem, não sai um pingo de fluido de teia em termos de narrativa. Temos um Lagarto enlouquecido matando um monte de gente e atacando o Homem-Aranha em razão de feitiçaria de uma bruxa de vudu e… só. Sim, é uma história violenta que coloca esse arqui-inimigo do Amigão da Vizinhança como um verdadeiro monstro descontrolado, mas ela não consegue ser sombria o suficiente em razão da arte de McFarlane e das cores fortes de Bob Sharen e não tem substância para encher um pires. Além disso, os diálogos são risíveis, parecido com escritores de primeira viagem que não sabem muito bem escrever sem usar chavões, frases de efeito, repetições para fins de ênfase que são só repetições mesmo e uma incansável capacidade de estender um fiapo de história por cinco edições que acabaram bem vazias.

(1) A icônica capa e (2) uma das belas artes de página inteira de McFarlane.

Tenho total consciência que realmente McFarlane era mesmo marinheiro de primeira viagem aqui, mas já cansei de ler autores que, já em seu primeiro trabalho, mostraram a que vieram, como Frank Miller em 1981 e Chris Claremont em 1973, só para citar dois. Além disso, a grande criação de McFarlane, Spawn, é uma maravilha para os olhos, mas o roteiro, apesar de mais refinado, nunca foi muito especial ou particularmente cativante. E Tormento é exatamente isso: uma história qualquer, sem brilho algum, que não passa de um veículo para a arte de seu autor, essa sim o grande chamariz para a então nova publicação.

E, com isso, chegamos à arte. Os lápis e as tintas de McFarlane indubitavelmente combinam demais com o Homem-Aranha, dando-lhe atleticismo e movimentações realmente impressionantes, além dos característicos olhos gigantescos e as famosas “teias espaguete”, emprestando-lhes detalhes que fazem toda a diferença. Além disso, as teias no uniforme do Aracnídeo são desenhadas com muito cuidado, algo que também é refletido no nível de detalhamento que McFarlane chega ao desenhar os segundos e terceiros planos, dando vida a cada quadro. Aliás, diria que a capacidade do artista de popular as páginas é realmente impressionante, algo parecido com o que Jim Lee consegue fazer, mas com estilo bem diferente claro.

Tenho reticências com os rostos humanos sem máscara desenhados por McFarlane, pois todos são muito parecidos e todos parecem saídos de um desfile de Barbies e Ken, com cabelos enormes armados, topetões, queixos bem marcados, olhos enormes e corpos esguios. Basta trocar os penteados e Mary Jane poderia ser Peter Parker e vice-versa. Da mesma maneira, McFarlane exagera no uso de recortes verticais nas páginas, tornando a leitura por vezes cansativa e confusa, ainda que ele compense o problema com belos splashes de abertura de cada edição e também algumas páginas inteiras realmente inspiradas em sua complexidade visual.

Em outras palavras, Tormento é a boa e velha forma sobre substância. Vistoso, mas vazio. Chamativo de longe, mas sem graça de perto. Pode até funcionar como leitura descompromissada ou como uma forma de contemplar a arte de McFarlane pré-Image, mas não é muito mais do que isso.

Homem-Aranha: Tormento (Spider-Man: Torment, 1990)
Contendo: Spider-Man (1990) #1 a 5
Roteiro: Todd McFarlane
Arte: Todd McFarlane
Cores: Bob Sharen
Letreiramento: Rick Parker
Capas: Todd McFarlane
Editoria:
Jim Salicrup, Tom DeFalco
Editora original: Marvel Comics
Data original de publicação: agosto a dezembro de 1990
Editora no Brasil: Panini Comics
Publicação no Brasil: março de 2013 (encadernado)
Páginas: 110

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