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Crítica | Homens Pink + Prazer em Conhecer

por Luiz Santiago
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Putos. Pederastas. Entendidos. “Será que ele é?“. Estes são alguns dos termos antigos com os quais se denominavam os homossexuais no Brasil e que ficaram na memória de quem, hoje, conta essas histórias de vida. E o documentário Homens Pink está cheio delas. São nove, no total, com o diretor Renato Turnes guiando tais relatos com um olhar participativo, de alguém que não apenas filma o que ouve, mas sente, imagina, interfere e assume para si parte dessas histórias que documenta (a cena de prova do vestido é de uma lindeza e de uma liberdade só!).

O que temos em Homens Pink é um olhar para algumas décadas no passado do Brasil e o compartilhamento de primeiras experiências sexuais e outras vivências que esses homens tiveram, um tema que é sempre muito interessante, pois toca imediatamente em cada um de nós. Cada história com seu grau de alegria, de tristeza, de gozo, de possível tragédia. E o diretor não romantiza os relatos e nem adota um caminho final de comparação, empurrando as falas sobre preconceitos, perdas e mortes com o típico olhar fatalista que muito se usa em obras LGBT+. E não, eu não sou o tipo de espectador ou queer que acha que a comunidade só tem close. Bem longe disso.

Ocorre que existem formas e formas de se conduzir uma trama, seja ela trágica, triste ou que mantém algum tipo dualidade entre essas duas partes. Homens Pink, por exemplo, tem de tudo. Mas mesmo os momentos mais emocionantes o diretor escolheu mostrar com um olhar de aproveitamento para o presente, nunca de lamento prostrado. As memórias aqui não são apenas uma saudade mortificadora de “um tempo que não volta mais“.

O depoimento final é um dos mais reveladores nesse sentido. Nunca foi segredo para nenhum de nós que um dia envelheceríamos e eventualmente… morreríamos. E aqui temos uma reflexão sobre o que é ser gay e envelhecer. O que é ter passado pela epidemia de AIDS, o que é ter amado, dançado, curtido, sentido na pele o estigma, o preconceito, a violência e estar já em uma certa idade da vida onde essas memórias servem de exemplo e, em vez de tristeza absoluta, trazem aquele calor nostálgico que reforça as conquistas e prova que a vida vale a pena ser vivida, apesar de seus pontos mais baixos. Um filme sobre uma dinâmica de existência comum a todos nós. Mas com um recorte que, para ser sincero, pouquíssimos indivíduos da própria comunidade LGBT+ se dispõem a pensar.

Homens Pink (Brasil, 2020)
Direção: Renato Turnes
Roteiro: Renato Turnes
Elenco: Carlos Eduardo Valente, Celso Curi, José Ronaldo, Julio Rosa, Eduardo Fraga, Luis Baron, Tony Alano, Paulinho Gouvêa, Wladimir Soares
Duração: 51 min.

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Prazer em Conhecer

Da nobre e relevante intenção da diretora Susanna Lira, passamos para um gigantesco “gente, como assim?” neste documentário [ao menos em linhas gerais] sobre o uso da PrEP (profilaxia de pré-exposição) e da PEP (profilaxia de pós-exposição), medicamentos que prometem maior eficácia contra a transmissão e o contágio por HIV/Aids. E vejam que eu disse “ao menos em linhas gerais” porque este assunto ganha a maior tônica no filme, mas em nenhum momento parece que há um interesse da diretora em tornar essa discussão algo verdadeiramente importante. E o pior de tudo: os escolhidos para conversar sobre o tema tinham muito conteúdo, bagagem e vivências para contribuir imensamente com esse debate.

É muito estranho quando um documentário procura enfeitar ou “poetizar” demais um assunto com o intuito de tornar o seu teor mais palatável, apreciável, bonito. E é justamente o que temos nesse Prazer em Conhecer. Por um momento, o levantamento do assunto para o uso da medicação, toda a questão de políticas públicas de saúde, a relação médico/paciente e as questões sociológicas a respeito da sexualidade e de gênero nos indicavam que a obra seguiria por um sólido caminho de discussão não apenas sobre a PrEP e PEP, mas também sobre a relação que diferentes grupos de LGBT+ têm com esse tipo de tratamento. Ledo engano. A diretora cria situações um tanto constrangedoras para tornar “socialmente normal” conversas a respeito de doenças ou infeções sexualmente transmissíveis, como no bloco da academia e no bloco da reunião de amigos regada a champanhe e vinho e forrada com pizza.

No conjunto, Prazer e Conhecer fica apenas na intenção de expor uma problemática e fazer um recorte relevante com a sorte de ter atores sociais interessantes. Todavia, a maneira como isso é mostrado para o espectador chega até a um certo ponto de desserviço, uma vez que a montagem corta falas importantes que aludiam a problemas sérios ou davam informações necessárias para a discussão. O bloco mais sólido aqui é o da mulher trans com um amigo gay que mantêm uma linha coesa de conversa, infelizmente podada pela montagem… e tudo para dar espaço a um certo recorte de classe (será que essa foi de fato a intenção?) que eu não entendi muito bem de onde veio e para onde foi, uma vez que o filme não desenvolve nada a esse respeito: apenas temos uma citação disso em uma das falas (como estatística) e um corte paralelo bem nojento de um grupo colocando champanhe na taça e um outro entrevistado colocando cerveja no copinho americano. Sim, o negócio é desse nível.

Ainda podemos tirar alguma coisa do que se discute aqui, mas estamos diante de um produto que se pretende uma coisa, mas é realizado como outra — uma espécie de poesia erótica, urbana e de atividades trabalhistas (?) com tons de recorte de classe, privilégios de informação e aleatoriedades. Valei-nos!

Prazer em Conhecer (Brasil, 2020)
Direção: Susanna Lira
Roteiro: Michel Carvalho
Elenco: Vinícius Lacerda, Nicolle Mahier Batista, Léo Dutra, João Sá, Charles Pereira, Alexandre Putti, Bruno Branquinho, Pedro Campana, André Srur, Luiz Gustavo Berkhout
Duração: 72 min.

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