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Crítica | Hunters – 2ª Temporada

Um encerramento que trai a própria série.

por Ritter Fan
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Apesar de minhas diversas hesitações e reticências sobre a primeira temporada de Hunters, eu gostei do resultado da criação de David Weil, por lidar com um assunto instantaneamente cativante de uma maneira quase que completamente sem freios e, claro, contando com a participação ilustre de ninguém menos do que Al Pacino. Dito isso, confesso que sequer mais me lembrava da série quando a segunda temporada materializou-se na grade do Prime Video quase três anos depois, com dois episódios a menos e a alvissareira informação – para que prolongar se dá para encurtar, não é mesmo? – de que ela seria o final das aventuras dos caçadores de nazistas capitaneados pelo jovem Jonah Heidelbaum (Logan Lerman).

O segundo e último ano de Hunters, claro, é focado na caçada a Adolf Hitler (Udo Kier) que é revelado vivo e nababescamente escondido em uma mansão no interior da Argentina ao final da primeira temporada, mas, para que isso aconteça, a equipe de caçadores nos é apresentada algum tempo depois dos eventos anteriores e completamente desfeita depois de uma tragédia na Espanha, com cada um ou agindo sozinho como são os casos da espiã-freira Harriet (Kate Mulvany) e do próprio Jonah que, sob a identidade de Sam, está noivo de Clara (Emily Rudd), ou entregando-se a seus vícios, como é o caso do ator Lonny Flash (Josh Radnor). Correndo por fora, há Joe Mizushima (Louis Ozawa) que passou por uma lavagem cerebral e, agora, é peão dos nazistas e a agente do FBI Millie Morris (Jerrika Hinton) que, não demora, percebe que os métodos dos caçadores de nazistas talvez sejam os únicos remédios efetivos contra os supremacistas escondidos.

O problema já começa justamente com essa separação “falsa” da equipe, pois ela rapidamente volta a se juntar em razão da descoberta de que Hitler está vivo, deixando para trás todos os seus problemas e todos os seus dramas. Ainda que os roteiros façam algum esforço para manter a tragédia na Espanha – que nunca é mostrada, mas que envolve a morte de uma criança – acesa, com os holofotes apontados para Jonah, a grande verdade é que tudo não passa de uma maneira de “ocupar” um episódio com novas contextualizações somente para tudo irritantemente voltar como era antes, ou quase tudo, pois, agora, os caçadores passam a ter a companhia de Chava Apfelbaum (Jennifer Jason Leigh), tia-avó de Jonah tida como morta que, na verdade, é uma grande caçadora de nazistas. E isso é no presente da série, pois, no passado, começando em 1975, a narrativa é intercalada com a história de origem dos caçadores, o que abre espaço para o Meyer Offerman de Al Pacino “reviver” em uma linha narrativa que até poderia ser interessante se não fosse lenta demais a ponto de ser irritante quando a ação principal é teimosamente interrompida para vermos as maquinações do velho nazista disfarçado de empresário judeu.

Em outras palavras, a infraestrutura da temporada é bem mais frágil do que da anterior, com uma história simples de investigação e perseguição sendo constantemente atrapalhada com desvios, sejam eles para o passado próximo, sejam eles no próprio presente, com Chava servindo de Al Pacino feminino para Jonah e os demais. Por outro lado, a versão mais madura de Jonah nesta temporada – com direito a um visual setentista clássico que o faz ficar parecido com Frank Serpico, não coincidentemente um dos clássicos personagens de Pacino – resolve um dos maiores problemas do ano inaugural, em que Lerman vivia basicamente um palerma de olhos esbugalhados sem muito o que fazer. Seu amadurecimento a jato, já estabelecido nas cenas iniciais em que ele procura Biff Simpson (Dylan Baker) em um bordel em Paris e descobre que Hitler está vivo, é uma mudança benvinda, ainda que seu noivado com Clara seja um daqueles clichês que simplesmente não havia necessidade de existir, especialmente porque isso leva a um final “fofinho” em que tudo acaba bem para o rapaz.

Mas a real grande fraqueza da segunda temporada é que ela deixa de lado a porralouquice. Tudo bem que há cenas tresloucadas memoráveis como a apresentação de Chava em queima lenta durante um campeonato de escultura em manteiga e a hilária paródia de A Noviça Rebelde com Harriet, mas é pouco demais para realmente manter aquele ritmo bacana que havia sido estabelecido antes entre calmaria e morticínio. Quando a temporada finalmente investe em algo efetivamente bizarro, dedicando um episódio inteiro a uma espécie de “versão estendida” da magistral sequência de abertura de Bastardos Inglórios, ela erra na mão e exagera ao ponto de ser enfadonho e repetitivo e sem um valor inerente ao que está sendo contado. Com isso, a temporada torna-se mais série e, ao tornar-se mais séria, o problema de Hitler estar vivo fica mais saliente.

Mas que problema se estamos falando de uma série de História Alternativa? Simples: lidar com Adolf Hitler em um ambiente ficcional não é nada fácil. Há, claro, exemplos magistrais sobre como ele pode ser usado em um contexto relevante, como são os casos de Ele Está de Volta e Jojo Rabbit, além do já citado Bastardos Inglórios. No entanto, fora da sátira inteligente e do fuzilamento catártico, a coisa muda bastante de figura, especialmente como acontece em Hunters, em que David Weil escolheu lidar responder a pergunta “e se Hitler fosse levado a julgamento?”. Simplesmente não dá para responder essa indagação em menos de uma hora sem que a abordagem – de cunho sério, vale lembrar – fique rasa e até resvale no perigo de demonstrar desrespeito à situação ou uma falta de visão sobre o que realmente poderia acontecer se uma figura monstruosa dessas passasse pelo Sistema Judiciário. Hunters simplesmente não tinha estofo para lidar com algo assim e precisava ter lidado com Hitler de forma semelhante ao que Quentin Tarantino fez. Ao tentar fazer mais sem a infraestrutura necessária, o resultado ficou muito aquém do que deveria ter sido.

O encerramento de Hunters decepciona ao tentar transformar a série em algo que ela não era, perdendo com isso sua maior qualidade. Havia material interessante até mesmo para lidar com a presença de um Hitler envelhecido em sua fortaleza argentina, mas teria sido necessário a manutenção do curso original da obra e não essa semi-correção de caminho que acabou acontecendo e que fez com que tudo ficasse estranho e mal resolvido. Com isso, infelizmente, Hunters deixa a desejar e termina sabotando sua própria premissa.

Hunters – 2ª Temporada (Idem – EUA, 13 de janeiro de 2023)
Criação: David Weil
Direção: Phil Abraham, Sam Taylor-Johnson, Tiffany Johnson
Roteiro: David Weil, David J. Rosen, Daria Polatin, Tatiana Suarez-Pico, Haley Z. Boston, Tori Sampson, Charley Casler
Elenco: Logan Lerman, Al Pacino, Lena Olin, Jerrika Hinton, Carol Kane, Josh Radnor, Greg Austin, Tiffany Boone, Louis Ozawa, Kate Mulvany, Dylan Baker, Jennifer Jason Leigh, Udo Kier, Emily Rudd
Duração: 483 min. (oito episódios)

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