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Crítica | Internet: O Filme

por Gabriel Carvalho
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“O senhor é quem?”

Contém youtubers.

O Youtube, fundado em 2005, foi responsável por popularizar o compartilhamento de vídeos, e parafraseando a revista Time, fazendo milhões de pessoas se entreterem, se chocarem e até mesmo se educarem de uma maneira como nunca vista anteriormente. As celebridades provindas do Youtube – chamadas de webcelebridades, ou, então, youtubers, caso sejam especificadas -, em tempo, foram capazes de popularizar ainda mais o serviço de broadcast. Elas conseguiram com uma boa – ou má ideia -, uma câmera na mão e bastante carisma se tornar ícones para uma nova geração, “antenada”, que não queria mais ver seus ídolos uma vez por semana na TV, e sim todo dia, na tela de seu computador e com uma possibilidade de interação que só a internet poderia dar. Nos últimos anos, buscando uma diversificação na produção de conteúdo, essas webcelebridades ganharam seus próprios livros, sendo que algumas dessas obras tornaram-se best-sellers, mesmo com a qualidade duvidosa da maioria delas. O mundo estava diante de uma literatura fascinante? Claro que não. O cinema, provavelmente, seria um ambiente mais familiar, por estarem brincando com o audiovisual o tempo todo, não é mesmo? Muito pelo contrário, o resultado é ainda pior.

Não contentes em se apropriarem das livrarias de todo o país, as telonas foram o novo alvo de mais uma ação ousada desses famosos: protagonizarem seus próprios filmes. Tomando como ponto de partida o fracassado filme do grupo Porta dos Fundos, a segunda produção do “gênero” de filme de youtubers foi É Fada, longa-metragem estrelado pela vlogger Kéfera Buchmann. Fora o fato da produção ser risível, críticas vieram baseadas no porquê youtubers estariam a brincar de atuar – o grupo Porta de Fundos, ao menos, é composto por atores. Contrariando a todos, Eu Fico Loko, terceira produção desse universo compartilhado de dor e sofrimento, teve a coragem de colocar atores de verdade para interpretarem os papéis. No mais tardar, não demoraria muito para que uma quarta obra fosse anunciada. Portanto, eis que chega Internet: O Filme, a suposta reunião de todas as celebridades mais amadas pelos jovens. Contudo, antes de tudo, é preciso comentar o desserviço desse título às décadas de história da internet. Embora eficiente para o público que vai atingir, temos a preguiça em seu estado de resumo mais pleno. Mesmo assim, um olhar preconceituoso deve ser deixado de lado para que se possa analisar corretamente essa produção.

A trama, utilizando-se de vários arcos dispersos, gira em torno de inúmeros youtubers famosos que são hospedados em um hotel para participarem de uma convenção. O primeiro arco apresentado é o de Uesley (Gusta Stockler), um youtuber arrogante que tem que lidar com uma possível ameaça a sua hegemonia sobre os outros canais. Gusta ao menos é uma grande surpresa do projeto, rendendo momentos engraçadinhos, diante também de uma boa caracterização e um desenvolvimento interessante, além de uma conclusão épica, tomada a suas devidas proporções. Já Rafinha Bastos, também roteirista do longa, interpreta Cesinha Passos. O roteirista, porém, não dá um aprofundamento mais rebuscado para o seu personagem, sendo inquietante assistir a Rafinha interpretando uma versão de si mesmo, no caso, em busca de redenção das atitudes vulgares que o fizeram ser conhecido. Como se fosse uma propaganda de seu próprio ego inflado. Paulinho Serra, interpretando Adalgamir, um fanático por Cesinha, contudo, funciona, possuindo a veia cômica necessária para que o mundinho de Bastos não ficasse monótono demais. A crítica envolta da personagem de Gabi Lopes, um sucesso aleatório no enredo, é melhor justificado.

Internet: O Filme, no entanto, é uma obra composta por conjunções coordenativas adversativas e a performance de Gabi Lopes – que não está nada bem na verdade – acaba por ser ainda mais ofuscada quando Thaynara OG, interpretando uma fã obcecada por youtubers, contracena com a garota. A snapchatter está surpreendentemente engraçada, sendo que o seu sotaque carregado contribui para deixar a personagem que interpretada menos genérico. O arco de Paulinho (Cellbit), jogador profissional de Street Fighter que busca seu tetracampeonato, ademais, é muito bem pensado e até concluído de forma inesperada. A propósito, essa trama possui duas grandes reviravoltas mais intrigantes do que se poderia esperar do roteiro, acrescentando substância ao longa. Já Vepê (Teddy) que, em uma aposta com seus amigos, seduz Barbarinha (Polly Marinho), uma youtuber famosa, não é um bom personagem, porque, tendo seu vídeo íntimo com Barbarinha divulgado na internet, o jovem e o roteiro nos brindam com uma história bagunçada, reforçada por más atuações e mau gosto. O arco envolvendo o cachorro Brioco é o único pior. O cachorro é simpático, mas o desenvolvimento é desastrado, e pior de tudo, sem graça alguma, vergonhoso.

As piadas são reciclagens de materiais genéricos, vide a utilização do nome do cão como arma para a criação de jogos de palavras obscenas, muito estúpido, também incoerente com a classificação etária do filme, que não tem o menor sentido, porque jovens entre dez a quinze anos são o público alvo, mas, no final das contas, temos uma obra com classificação indicativa para maiores de catorze anos, esbarrando no item citado. A escatologia funciona muito melhor para esse público, mas as insinuações sexuais e os palavrões não – muito boca suja o texto. Enquanto alguns arcos são um pouco mais “afinados” e debochados, outros extrapolam limites, pois existe uma forte inconsistência na comédia. Algumas piadas mais referenciais, por outro lado, são engraçadas e corajosas, como a participação de PC Siqueira, no arco de Cellbit. O mesmo argumento não pode ser dito de Cauê Moura, colaborando apenas com gags robóticos. A inclusão de memes mais antigos, por fim, como a presença ilustre dos cantores da versão original de “Para Nossa Alegria”, é uma jogada de risco, que funciona exatamente pela sua coragem. Uma quantidade razoável de risadas arrancadas, ainda mais se você sacar das várias referências.

A direção de Filippo Capuzzi Lapietra, curiosamente, sabe usufruir do material que tem em mãos, existindo uma clara intenção do diretor em remeter a estética do filme a do Youtube, mais jovial e dinâmico. A inclusão de memes e um edição mais ágil é perfeitamente encaixada no longa, que tem, desde a sua abertura, um público alvo determinado. Internet: O Filme não é a bomba esperada, portanto. Fui para o cinema ver um monte de youtubers brincando de atuar e tentando divertir o espectador com piadas sem graça e acabei por ver um monte de youtubers brincando de atuar e tentando divertir o espectador com piadas que algumas vezes funcionam. O longa-metragem é composto por esquetes de quinze minutos picotadas em uma hora e meia de duração e não uma obra dentro de um parâmetro narrativo coesivo. Ao se relevar esse fator, a satisfação é possível. O elenco é horrível, mas alguns atores conseguem se sobressair em seus papéis, além da direção ter identidade, familiar ao mundo esteticamente distinto de hoje. Os problemas são inúmeros, pois existe uma forte incoerência narrativa, incoerência de tom e incoerência financeira. O famoso caso de podia ser melhor, mais competente dentro do idiota argumento enfim proposto.

Internet: O Filme — Brasil, 2017
Direção:
 Filippo Capuzzi Lapietra
Roteiro: Rafinha Bastos
Elenco: Rafinha Bastos, Gabi Lopes, Paulinho Serra, Teddy, Polly Marinho, Gusta Stockler, Cellbit, Thaynara OG, Felipe Castanhari, Pathy dos Reis, Palmirinha, Júlio Cocielo, PC Siqueira, Cauê Moura, Mr. Catra, Christian Figueiredo
Duração: 96 min.

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