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Crítica | Intervenção – É Proibido Morrer

Quantas vidas ainda precisam ser ceifadas?

por Rodrigo Pereira
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Lôbo, personagem de Babu Santana, falando ao telefone ao lado de uma janela.

Produções policiais têm sido amplamente realizadas no Brasil há bastante tempo, mas desde o estrondoso sucesso de Tropa de Elite, houve um aumento considerável de obras com o tema. Sejam em séries, como Arcanjo Renegado, ou em filmes, como Operações Especiais e A Divisão, que também possui uma série homônima, o tipo de trama que aborda a realidade da polícia e do tráfico parece sempre lançar novos produtos anualmente. Obviamente, muitos não são merecedores de elogios, diferente de Intervenção – É Proibido Morrer, novo lançamento da Netflix.

Dirigido por Caio Cobra, o filme acompanha a história de Larissa (Bianca Comparato), uma jovem recém-ingressa na força policial, e Douglas (Marcos Palmeira), um experiente major da polícia militar, e sua rotina na Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Laje. Ela, uma idealista, pretende aplicar a lei e cumprir com seu dever como agente de segurança pública; ele, um realista exausto, só quer evitar que mais de seus comandados sejam mortos, mesmo que isso exija não cumprir a lei.

Ao começar a assistir um longa desse gênero, sempre fico com receio que haja uma defesa irrestrita do lado policial, colocando-o como um grande herói salvador, algo que, felizmente, passa longe de Intervenção. A direção se mostra muito mais preocupada em expor como aquela realidade destrói pessoas, independente do lado do confronto que alguém esteja. Inclusive, a melhor maneira que a fita faz isso é através da fotografia.

Assinada pelo diretor de fotografia Enio Berwanger, é possível perceber desde a relação entre personagens até suas personalidades observando o enquadramento, a iluminação e a profundidade nas cenas. Quando, por exemplo, Larissa e sua irmã Flávia (Dandara Mariana) discutem em casa, elas passam a sequência toda em profundidades diferentes, com Larissa no corredor e Flávia com a parede da sala atrás de si, marcando a falta de sintonia recorrente entre ambas. Após a discussão, o abraço de Larissa em sua avó Socorro (Zezé Motta) é filmado também no corredor, mas sob a moldura da porta, refletindo a segurança que a protagonista sente junto de sua avó e ressignificando o local da briga.

Outro ótimo momento do filme, e que considero minha cena favorita, é quando Douglas encontra Sapão (André Ramiro), o chefe do tráfico, e, após um momento de tensão, ambos se sentam em uma mesa de bar e conversam tomando um café. O semblante cansado e o olhar vazio dos dois entrega a exaustão que aqueles homens possuem em suas vidas. Ainda que antagônicos, o compartilhar daquele momento expõe que nenhum dos dois aprecia a realidade que vive, somente joga o jogo que quem detém o poder os obriga a jogar (as sequências de políticos em programas de televisão e do juiz pouco importado com a situação marcam esse distanciamento e falta de importância dos poderosos). Aliás, a profundidade mostra sua relevância novamente durante a conversa de Douglas e Sapão, com ambos sentados em frente a uma grande parede amarela e igualmente nivelados, sugerindo o encontro de pensamentos, ao contrário do que vimos na briga de Larissa e Flávia.

A iluminação também possui importante papel em diversos momentos. Os que mais me chamaram atenção foram para criar um ambiente escuro e sombrio na sala do major, como se fosse um local para tratar sobre assuntos sérios e que só poderiam ser tratados ali (o que se confirma ao longo da obra). Os enquadramentos fechados também reforçam essa ideia de segredo. E o segundo momento diz respeito ao tenente Souza (Rafael Losso), que passa a projeção inteira sendo mostrado quase em totalidade sob forte escuridão, reforçando diversas de suas atitudes repugnantes. Isso sugere o caráter da personagem desde o início do longa, ficando ainda mais perceptível quando, por exemplo, contrastado com o cabo Lôbo (Babu Santana), frequentemente mostrado sob a luz solar, mesmo em ambientes fechados, e com posturas totalmente opostas a de seu colega de trabalho.

O que menos me agradou no filme foram algumas sequências expositivas em excesso, como Flávia na sala de aula ou Larissa gravando o vídeo ao final, chegando a ser cansativo em alguns instantes. Apesar disso, Intervenção – É Proibido Morrer é um exemplar bastante interessante dentro do gênero policial, focando no fracasso da guerra às drogas e o quanto isso afeta e destrói a vida das pessoas de todos os lados, exceto daqueles que lucram com isso e, coincidentemente, não vivem essa realidade.

Intervenção – É Proibido Morrer — Brasil, 2021
Direção: Caio Cobra
Roteiro: Rodrigo Pimentel, Gustavo de Almeida
Elenco: Marcos Palmeira, Bianca Comparato, Zezé Motta, André Ramiro, Castrinho, Antônio Grassi, Babu Santana, Dandara Mariana, Rafael Losso, Rainer Cadete
Duração: 91 min.

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