Uma aposta certeira no cinema é o investimento em filmes sobre pessoas acossadas por animais assassinos. É uma possível garantia de tensão, diversão e momentos horripilantes de catarse. Isso, quando a narrativa é interessante, dinâmica e envolvente. Apesar de bater numa tecla demasiadamente abordada, Isca, dirigido por Hayley Easton Street, cineasta que se baseia no roteiro escrito por Cat Clarke, produção de apenas 86 minutos que acaba entregando pouco diante do seu potencial. Não importa se já vimos algo parecido em filmes melhores, tais como o clássico Tubarão ou em Águas Rasas, ótimo exemplar do subgênero, mais contemporâneo. Em Isca, lançado em 2024, a trama começa com um ataque brutal a Meg (Hiftu Quasem) e Kayla (Natalie Mitson), um casal de mulheres lésbicas, que são abordadas e agredidas por um grupo homofóbico. Após um ano do incidente, Meg viaja para as Índias Ocidentais para o casamento de uma amiga, onde o clima se torna tenso devido à presença de Kayla, com quem ela não fala desde o ataque. Em uma tentativa de reatar a relação, o grupo decide alugar um barco para visitar uma ilha isolada, onde Meg e Kayla possam conversar.
Tudo parece muito diletante e apaziguador, no entanto, a situação se agrava quando uma das amigas é atacada por um tubarão e fica gravemente ferida. Ao tentarem retornar ao resort, o barco velho e deteriorado sofre um vazamento e afunda, deixando o grupo preso no mar, longe da costa. Assim, as jovens se encontram obrigadas a lutar por sua sobrevivência, enfrentando não apenas as consequências do ataque anterior, mas também a ameaça real que os cerca na vastidão do oceano. Isca tinha tudo, como mencionado antes, para ser impactante, já que sua abertura investe numa sequência dramática diferente dos seus similares, nos dando material para se importar com suas personagens. Há, por sua vez, muita imprecisão. O que podia ser ótimo acaba ficando apenas no mediano. Com uma duração de cerca de 80 minutos, Isca inicia-se com um ritmo intenso, mantendo a tensão elevada até o segundo ato. No entanto, ao chegar ao terceiro ato, o filme começa a se arrastar, ao trocar a adrenalina por melodrama, diluindo o suspense acumulado anteriormente. Um tédio.
A conversa entre os personagens se aprofunda em detalhes que, embora possam parecer significativos, acabam por minar a urgência da narrativa. Apesar de a dinâmica entre os personagens manter alguma estabilidade, essa transição para um tom mais calmo compromete o ritmo da obra, dificultando o envolvimento contínuo do espectador. A direção de fotografia, assinada por Niels Reedtz Johansen precisa se desdobrar para criar cenas de tensão que funcionam poucas vezes. A abordagem visual do filme, com suas tomadas amplas que realçam a imensidão do oceano, é um ponto forte, acentuando a sensação de isolamento e vulnerabilidade das mulheres protagonistas. Contudo, a prolongada calmaria no enredo tira a oportunidade de provocar um impacto mais forte, já que a mudança de tom, que poderia ter surpreendido e reprimido as expectativas do público, não se concretiza ao longo do filme. Uma nova tentativa de restaurar a tensão poderia ter garantido um desfecho mais impactante e envolvente, mantendo a atenção do espectador até o final da história.
Sem muitos recursos para grandes investimentos na seara dos efeitos visuais, Isca depende da edição de Pani Scott para criar algum fio de fidedignidade, mas as tentativas também não são eficientes, pois fica tão transparente quanto as águas do oceano, a inserção de imagens compradas de tubarões que sequer se assemelham ao monstro que ronda as personagens incautas. Com trilha sonora concebida pela dupla formada por Nainita Desai e Harry Peat, a produção apresenta uma textura percussiva intrigante, aguda para ampliar a sensação de temor que envolve as jovens, mas apenas isso não é suficiente para classificarmos o filme como um exemplar impactante do rentável subgênero que constantemente nos entrega tramas novas, em sua maioria, irregulares, com destaque para algumas raras gratas surpresas. E, se nos aspectos estéticos, a narrativa é falha, nos desempenhos dramáticos, também nos deparemos com algumas irregularidades, direcionamento que nos faz evitar envolvimento com as figuras ficcionais e, consequentemente, qualquer catarse mediante a situação de pânico que as cerca. Em linhas gerais, um horror ecológico morno.
Isca (Something In The Water) — Estados Unidos/França, 2024
Direção: Hayley Easton Street
Roteiro: Cat Clarke
Elenco: Natalie Mitson, Hiftu Quasem, Tashani Bent, India Jean-Jacques, Chloe Marshall, Laura Costa, Nicole Rieko Setsuko, Lauren Lyle, Ellouise Shakespeare-Hart
Duração: 97 min.
