- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios e de tudo sobre It.
Mesmo tendo custado quase o dobro que a It: A Coisa e tendo faturado praticamente a metade na bilheteria, é It: Capítulo Dois que muito claramente tem servido de molde para It: Bem-Vindos a Derry. Sou o primeiro a afirmar que bilheteria alta não significa qualidade e que bilheteria baixa não significa falta de qualidade, mas, na dobradinha cinematográfica de Andy Muschietti, a coincidência entre uma coisa é outra é inegável. Tudo o que era sutileza no primeiro filme, tornou-se abundante no segundo que não passa de um show de computação gráfica que vem substituir tensão e sustos. E olha que nem vou entrar na qualidade do CGI, pois isso é coisa que não costuma me afetar, como já disse alguma vezes. Agora Você O Vê parece sacramentar essa escolha ao carregar nos monstros digitais sem nenhuma tentativa de construir tensão, só de realmente jogar coisas na tela para ver se assusta, o que imagino que só deva acontecer com crianças bem novas e desacostumadas com filmes de horror.
E não estou de forma alguma dizendo que o vilão, em suas variadas e criativas formas, deva ser escondido na série, já que é de se presumir que muita gente já tenha assistido os filmes. Ao contrário, esconder é bobagem, mas uma coisa é ser direto com a ameaça por sobre a cabeça das crianças da série, outra bem diferente é fazer da série um cartum do Scooby-Doo com monstros da semana, correrias e gritarias. E, vamos combinar, o que realmente interessante, aquilo que efetivamente serve de alicerce formativo para o que “A Coisa” representa é a maldade humana e isso ficou nas entrelinhas neste terceiro episódio, com apenas a sequência na cela da delegacia lembrando-nos disso, sequência essa que, como os “fantasmas que se divertem”, teve zero de sutileza e tudo de didatismo emburrecedor. Cadê o passeio de Charlotte pelo idílico bairro branco em que mora à la Lovecraft Country? Onde foi parar a tensão racial, já que nem mesmo o prólogo com os jovens Francis e Rose em 1908 foi usado para reiterar essa questão?
Falando no prólogo, eu gosto como ele cria elementos de expansão de mitologia, com a floresta muito claramente sendo já conhecida pelos nativos locais como assombrada há muito tempo e como as circunstâncias do que ocorrer se encaixam com a busca do Francis adulto pela “arma do medo” usando o pouco da memória que tem dessa época. Não achei particularmente inspirada a sequência do “velho caolho” por ali – muito mais interessante Francis encontrando-o dentro da feira itinerante -, mas ela pelo menos não “agrediu” o espectador como foi a escolha do bebê alado de duas cabeças. Criar a sensação de ancestralidade e, com isso, introduzir o povo original da região é uma boa maneira de construir mitologia e espero que Rose e seus compatriotas tenham mais participação na discussão sobre o que os militares estão fazendo nas terras de seus antepassados.
Aliás, curiosamente, se tem uma coisa em Agora Você O Vê que é substancialmente diferente de It: Capitulo Dois é que o núcleo adulto conseguiu ser infinitamente mais interessante do que o infantil. Se em A Coisa na Escuridão tivemos duas inspiradas sequências de pesadelos/visões que acabaram destacando Ronnie e Lilly, agora só tivemos mesmo os já citados momentos bobalhões no cemitério, com até mesmo a internação de Lilly no sanatório tendo sido descartada com um estalar de dedos. No caso dos adultos, não só tivemos Francis e Rose se reencontrando, como, principalmente, fomos brindados com as sequências com Dick Halloran e sua iluminação que o leva ao familiar quartel-general de Pennywise e a interação dele com Leroy no avião e também no jantar na casa dos Hanlon, com direito à revelação de vários pequenos segredos entre eles.
A produção de It: Bem-Vindos a Derry parece achar que fogos de artifício são mais importantes do que construção de atmosfera, de tensão e de horror genuíno e vem empregando seu orçamento em perfumaria e não no que realmente interessa: bons roteiros. Com isso, ideias inspiradas ficam à deriva ou são subaproveitadas para que mais espaço seja aberto para bobagens como a versão sem graça e sem carisma dos Caça-Fantasmas, em um clássico exemplo hollywoodiano de subestimação de sua audiência. Ainda há tempo para salvar a série e eu torço por isso, mas os showrunners parecem ter medo de abraçar de verdade o potencial da premissa, preferindo caminhar pela estrada mais viajada e que o próprio público rejeitou quando foi usada no segundo filme do Muschiettiverso de It.
It: Bem-Vindos a Derry – 1X03: Agora Você O Vê (It: Welcome to Derry – 1X03: Now You See It – EUA, 09 de novembro de 2025)
Desenvolvimento: Andy Muschietti, Barbara Muschietti, Jason Fuchs (baseado em romance de Stephen King)
Showrunners: Jason Fuchs, Brad Caleb Kane
Direção: Andrew Bernstein
Roteiro: Guadalís Del Carmen, Gabe Hobson
Elenco: Clara Stack, Amanda Christine, Blake Cameron James, Arian S. Cartaya, Matilda Lawler, Taylour Paige, Jovan Adepo, Chris Chalk, James Remar, Peter Outerbridge, Rudy Mancuso, Stephen Rider, Alixandra Fuchs, BJ Harrison
Duração: 59 min.
