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Crítica | Jujutsu Kaisen 0

O prelúdio do fenômeno japonês.

por Kevin Rick
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Como havia dito na crítica da primeira temporada de Jujutsu Kaisen, eu não consigo enxergar o apelo qualitativo em torno do universo criado por Gege Akutami. A narrativa do anime segue basicamente toda cartilha genérica da mídia japonesa, desde a composição clichê do protagonista até o desenvolvimento batido da história. A animação, porém, parece ser o grande atrativo da (agora) franquia, considerando que o primeiro filme deste universo mantém a abordagem padrão e estereotipada, mas ainda sendo bonitinha aos olhos como um belo passatempo vazio. Antes que me apedrejem por não gostar de outro fenômeno das animações japonesas indo ao Cinema, existem certas ideias que continuo apreciando nas adaptações do mangá de Akutami.

Mas, antes disso, vejamos a premissa de Jujutsu Kaisen 0, um prelúdio para a história de Itadori e Sukuna, em que conhecemos o desafortunado Yuta Okkotsu. O personagem perdeu seu grande amor quando ainda era criança, num acidente de carro diante de seus olhos. Se não fosse o bastante, após a tragédia, o jovem começa a ser perseguido e assombrado pelo espírito amaldiçoado da garotinha, que passa a proteger com muita violência qualquer um que maltrate Yuta. Assim como acontece com Itadori, Satoru Gojo convida o garoto para se matricular no Colégio Jujutsu, protegendo-o dos velhotes que comandam a associação dos feiticeiros Jujutsu.

A ideia do prelúdio é interessante, principalmente no sentido de ser uma obra com poucas ligações com a narrativa principal de Itadori na série e também como expansão de mitologia. Acho fascinante quando animes se dispõem a trazer histórias mais soltas e desgarradas desse tipo, basicamente um conto diverso no mesmo universo – é por isso que também sou adepto de arcos fillers. Logo de cara, o filme tem uma cara episódica, como se estivéssemos assistindo um ângulo diferente do mundo jujutsu, o que também é importante para espectadores de primeira viagem na franquia. Além disso, a diferença de caracterização entre os protagonistas proporciona uma diferença de tom para a história, saindo do clichê carismático e boboca de Itadori (inspirado em Goku, Ichigo, Luffy e afins), para termos outro arquétipo de animes com Okkotsu, o protagonista que sofre bullying, é tímido e não sabe como se comportar no meio fantástico, dando uma atmosfera mais próxima de uma melancolia do que algo puxado pra zona cômica.

Aprecio a diferença, mas, ainda assim, temos uma narrativa padronizada. O protagonista passa pela tradicional jornada do herói, com o texto verbalizando todos os seus conflitos e epifanias, bem no molde expositivo e pouco natural de animes genéricos. Os flashbacks trágicos também estão lá, inseridos abruptamente pela montagem para buscar sentimentalismo barato – e não só do protagonista, mas como de personagens secundários e antagonistas, numa edição emocionalmente apelativa e com pouco sentimento sincero. E, claro, não poderia faltar os monólogos e mais monólogos explicando o funcionamento de poderes e a mitologia, sem nunca envolver o espectador na construção de mundo ou até mesmo no didatismo (Hiromu Arakawa e Yoshihiro Togashi são autores que fazem isso muito bem, por exemplo). É sem sombra de dúvidas uma obra a toque de algoritmo, tendo um roteiro que talvez seria melhor se fosse descompromissado do que nesta tentativa fútil de atingir uma falsa nota de profundidade dramática na relação entre humanos e maldições, algo conceitualmente intrigante, mas mal executado pelo texto.

Chegamos, então, na parte visual. Antes de qualquer coisa, sou muito fã dos elementos de horror de Jujutsu Kaisen, indo desde o design das criaturas até a composição de alguns cenários do gênero (locais abandonados, corredores, etc), mas a direção da obra falha bastante em capturar esta atmosfera fúnebre ou criar algum nível de tensão em seus planos-médios comuns. Existe um lance entre ser leve e sombrio que nunca delineia um tom para a produção. Mas ainda aprecio bastante a estética do universo, especialmente quando a animação preza por algumas bizarrices visuais ou alguns usos engenhosos de cor e sombreamento (a entrada de Okkotsu na sala do colégio, as aparições de Rika e os efeitos visuais dos gritos de Toge são exemplares visualmente bacanas disso). Aliás, aprecio muito mais os elementos de horror do que as lutinhas chatinhas do filme. Sim, é isso mesmo que leram, eu não gosto dos combates no longa. Chegamos, então, na parte polêmica da crítica.

Acredito que as pessoas confundem fluidez de animação com criatividade visual. A MAPPA faz um trabalho fantástico em tornar os embates dinâmicos, frenéticos e ágeis, mas a direção dessas sequências é pouco inventiva se pararmos para analisar. As coreografias seguem as regras de soquinhos aqui, slow-motion ali, alguns desvios rápidos e muitas explosões, num ritmo fluido, mas sem estilo, sem imaginação. Já havia tido a mesma sensação na série, mas foi enfatizado ainda mais no filme, de que a beleza da animação é mais por causa da fluidez do que por qualquer tipo de composição especial das cenas. Vejo uma parcela de culpa em Akutami e sua mitologia rasa, com um sistema de poderes mais semelhante a poderzinhos aleatórios do que, para ficar na comparação absurda do público, com a complexidade de Togashi e suas sequências de ação estratégicas que se tornam uma dança visual misturada num jogo de xadrez (he, he).

Em suma, Jujutsu Kaisen 0 é um passatempo regular e esquecível. Não acho a experiência realmente ruim, tanto por alguns conceitos e ideias bacanas, em especial os elementos de horror, quanto pela estética e a ótima animação do longa. Mas também, não consigo nem de longe entender o apelo desta franquia extremamente superestimada, na minha opinião. Não há nada de especial no mundo jujutsu, sua mitologia pouco criativa, falta de conexão emocional, personagens genéricos e narrativa mergulhada nos clichês mais óbvios. Tudo é um pano de fundo legalzinho aos olhos para trazer zero substância e muitas lutinhas.

Jujutsu Kaisen 0 (呪術廻戦 0) – Japão, 2022
Criado por: Gege Akutami
Direção: Sunghoo Park
Roteiro: Gege Akutami, Yoshimasa Terui, Alisa Okehazama
Elenco: Megumi Ogata, Kana Hanazawa, Mikako Komatsu, Kōki Uchiyama, Tomokazu Sekic, Yūichi Nakamura
Duração: 105 min.

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