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Crítica | Jungle Cruise

por Kevin Rick
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Baseado em um parque temático da Disney, Jungle Cruise é um filme de aventura que se passa em 1916, onde acompanhamos a Doutora Lily Houghton (Emily Blunt) e seu irmão MacGregor (Jack Whitehall) viajarem à Amazônia para investigar a lenda de uma árvore cuja flor pode, dizem, ser usada para curar todas as doenças conhecidas. Chegando ao Brasil, os irmãos contratam os serviços de Frank (Dwayne Johnson), um capitão de barco mal-intencionado que se aproveita de turistas. Daí em diante, o trio parte em uma aventura no Rio Amazonas a procura da lenda, encontrando em seu caminho inimigos europeus, indígenas e o sobrenatural.

Já abro um pequeno espaço para dizer que a representação brasileira no filme é completamente nula, desde o estereótipo indígena, a falta de pesquisa histórica para nossa moeda, cultura ou costumes, além de deixar implícito que falamos espanhol (?). Nada realmente surpreendente neste departamento de Hollywood, o que não é apenas lamentável do nosso ponto de vista como brasileiro, mas que também empobrece o filme em termos de imersão histórica, já que a locação sul-americana é apenas um pano de fundo para uma aventura genérica de qualquer rio ou floresta por aí.

Deixando isso de lado, podemos seguir falando do filme que tenta misturar Piratas do CaribeIndiana Jones e A Múmia, mas que, acima de tudo, me lembra Uma Aventura na África, pois é uma obra construída inteiramente na dinâmica de seus protagonistas nesse ambiente florestal. É em cima dessa ideia de uma aventura lúdica de romance/buddy que o primeiro ato do filme desenvolve a apresentação de cada personagem com sua própria mini-aventura para introduzir suas diferentes personalidades antes do encontro de opostos que irão começar uma jornada juntos. E o primeiro ato é sensacional.

Eu quero frisar isso novamente: o primeiro ato é sensacional. O cineasta Jaume Collet-Serra entende muito bem como usar espaços e cenários na proposta de ação recreativa da dupla, criando uma ótima sequência à la Indiana Jones com a personagem de Emily Blunt –  aquele mesmo estilo de aproveitar detalhes do local como coincidências e extensão de movimentação da personagem. E logo em seguida cria um bloco que aproveita todo o charme descompromissado de The Rock com piadas ruins e o clima deliberadamente bobo, culminando no encontro dos personagens em uma sequência de puro exibicionismo elegante contra o militar alemão Joachim (Jesse Plemons). É complicado escapar de spoilers para detalhar os segmentos, mas em suma, é um ótimo início que equilibra os diferentes estilos de aventura/ação dos personagens, com Frank assumindo esse caráter mais irônico e presunçoso, enquanto Lily preza pelo acaso anacrônico, diferenças estas carregadas para a narrativa de antagonismo cômico dos intérpretes super carismáticos.

Então, é com grande pesar que digo que o restante do filme não sustenta a qualidade. Em um primeiro instante, a obra se perde pela repetição da dinâmica dos protagonistas, passando grande porção do longa repetindo as mesmas piadas e discórdias. Os atores são capazes de manter um tom agradável, apesar da falta de química com romance – sempre acho curioso como o charme de The Rock nunca se encaixa com flerte -, mas o fato do progresso da narrativa se dar na contínua reiteração da interação dos protagonistas, e não a aventura em si, representam a decepção de uma obra mais próxima de uma comédia romântica do que necessariamente a magia e diversão esperada da jornada.

Isso se dá pela completa falta de comprometimento do longa a partir do miolo, pois a partir do momento que a aventura inicia, não se existe qualquer importância com o fantástico – toda a trama da árvore, das pétalas e afins não exercem qualquer tipo de relevância para nossa experiência. Nesse molde genérico, renuncia-se também o sentimento de urgência com vilões sobrenaturais cartunescos com pouquíssimos minutos de tela, posicionados para moverem a trama quando necessário, mas sem qualquer causa ou efeito narrativo significativo – além de serem visualmente horrorosos com o vergonhoso CGI do longa.

Mas acredito que a crítica mais ferrenha pode ser direcionada a aparente desistência do cineasta Jaume Collet-Serra à medida que o filme avança para seus estágios finais. O diretor que inicialmente utiliza com cuidado espaços geográficos para dar sentido aos eventos com uma determinada distância para evidenciar o espetáculo, começa a lentamente procurar caminhos mais preguiçosos de filmagem com o desenvolvimento da história, descambando para uma ação engessada e calculada, focadas em efeitos especiais sem graça e a total falta de energia criativa para criar mais malabarismos ou encenações elaboradas – vejo isso principalmente no clímax e seu estranhíssimo filtro azul para as cenas esteticamente pouco claras.

Ainda tenho outros problemas com os arcos dos personagens, como o fato de Emily Blunt ir perdendo o protagonismo com o progresso da história, além do fato de que ela não ganha qualquer tipo de dramaticidade para além de estar dentro da aventura e querer encontrar o macguffin. E, claro, existe toda a polêmica em torno do personagem LGBT de Jack Whitehall, supostamente, aliás, já que o personagem meio que assume, mas não pode realmente dizer a palavra que explodiria a moral dos executivos da Disney. E pior, o roteiro faz piadas de mal-gosto contra o personagem logo em seguida… Típica “representação” do camundongo americano.

Por fim, acredito ter dado a entender que odiei o filme, mas não foi exatamente assim. Acredito que seja um longa razoavelmente bom como entretenimento enlatado familiar, mas não posso deixar de expressar minha completa decepção com a obra após o início fabuloso. Jungle Cruise nunca negou ser uma aventura inspirada em diferentes clássicos, mas quer tanto se manter como uma embalagem comum e superficial que deixa de criar sua experiência mais recreativa e memorável, sendo pouco comprometida com seus personagens secundários, trama sobrenatural e, principalmente, com a falta de criatividade da linguagem lúdica. Bons personagens e bem pouca aventura.

Jungle Cruise | EUA, 29 de julho de 2021
Direção:
Jaume Collet-Serra
Roteiro: Michael Green, Glenn Ficarra, John Requa, John Norville, Josh Goldstein
Elenco: Dwayne Johnson, Emily Blunt, Édgar Ramírez, Jack Whitehall, Jesse Plemons, Paul Giamatti, Veronica Falcón, Dani Rovira, Quim Gutiérrez, Andy Nyman
Duração: 127 minutos

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