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Crítica | Jurassic World: Domínio

Muita escuridão, pouco encantamento.

por Fernando Campos
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Uma das reflexões propostas por Jurassic Park, e que também permeia Domínio, último capítulo da franquia, é como os seres humanos deveriam lidar com a presença de dinossauros no mundo; servindo como alegoria sobre a relação entre homem e natureza. Confesso que, após assistir a terceira parte de Jurassic World, sexta de toda a saga, não obtive muitos sentimentos ou reflexões sobre a temática. Até porque, qualquer debate proposto pelo filme tem a profundidade de um pires. Contudo, a sessão me proporcionou uma certeza: a franquia deve terminar. Ou ao menos ter um descanso. Depois de vários filmes e diferentes diretores no projeto, a produção passou da fase do desgaste e entrou no estágio do constrangimento. 

Fica claro a cada episódio como esse mundo jurássico só funcionou realmente nas mãos de Steven Spielberg. Não pelo universo em si, mas pela habilidade do diretor em transformar cada cena em algo épico, agoniante ou encantador. Cinema é sobre isso, a habilidade de um realizador em nos atrair para sua obra, independente do material narrativo. Um roteiro raramente eleva uma direção ruim, mas o oposto acontece. Basta ver a quantidade de personagens e histórias memoráveis que tiveram capítulos lamentáveis nos últimos anos, como Star Wars, por exemplo.

Ocorre o mesmo em Domínio. Sem dúvida, é nostálgico assistir Laura Dern, Sam Neill e Jeff Goldblum juntos novamente. A química dos três permanece, mas só isso não salva a experiência, visto que Colin Trevorrow não é Spielberg, evidentemente. Portanto, a nostalgia só dura até o primeiro ato. No geral, o capítulo final da trilogia Jurassic World proporciona apenas duas horas e meia de tédio e incompreensão.

Em Domínio, estamos situados quatro anos após a Ilha Nubar ter sido destruída. Agora, os dinossauros vivem próximos aos seres humanos, fragilizando o ecossistema do planeta. Com isso, a classe científica passa a buscar soluções para o problema, entre eles os veteranos Dr. Alan Grant (Sam Neill), Dra. Ellie Satler (Laura Dern) e Dr. Ian Malcolm (Jeff Goldblum). Enquanto isso, os antigos funcionários do parque Jurassic World, Owen Grady (Chris Pratt) e Claire Dearing (Bryce Dallas Howard), tentam proteger a jovem Maisi (Isabella Sermon) e a velociraptor Blue.

Para ser justo, Trevorrow em nenhum momento tenta emular Spielberg. O diretor opta por caminhos visuais diferentes do restante da franquia. Inclusive, esse é o capítulo mais voltado para a ficção científica e ação, com direito a sequências de perseguição de moto e longas explicações sobre genética. Aventura e suspense, presentes nos filmes originais, acabam em segundo plano aqui. No entanto, ainda que tente algo diferente, a execução falha.

Ao optar pela ficção científica, Domínio volta suas atenções para o texto, sendo esse o primeiro problema do longa. A trama sobre o mundo entrando em colapso ambiental é recheada de clichês e explicada com diálogos expositivos. Um exemplo disso está em como os personagens repetem frequentemente que devem conter o problema dos gafanhotos senão a cadeia alimentar entra em colapso, sem caminhar nenhum passo além disso. Além disso, apontando para a direção, não há senso de urgência ou uma exposição real do problema, para que ao menos o público sinta algo com aquilo. O tamanho ameaça fica apenas na boca dos personagens, sem ser mostrado, algo que seria fundamental tratando-se de audiovisual. Junto a isso, mais uma vez na franquia, há uma mega corporação vilanesca por trás do problema. Ou seja, um amontoado de elementos vistos inúmeras vezes no gênero e na própria saga, que antes ficavam em segundo plano, mas que Trevorrow erroneamente decide puxar para o centro da narrativa. 

Já no quesito ação, o diretor mira em Missão: Impossível – Efeito Fallout, que possui um ritmo intenso e contínuo, mas acerta num Michael Bay em dia ruim, com excesso de movimentos de câmera e cortes. A cena de perseguição em Malta, por exemplo, abusa da câmera trêmula, tornando a ação pouco compreensível, logo, difícil de apreciar.

Tratando-se de Jurassic World, tudo isso seria menos relevante se Trevorrow desse uma bela roupagem nas cenas focadas em dinossauros, o pilar de toda a saga. Mas o que vemos é um universo artificial, sem encantamento e pouco violento. Além das criaturas soarem como meros objetos de cena, a violência delas, que ao menos poderia chocar, não é explorada. Até mesmo em cenas de ataques das criaturas não há sangue, sendo filmadas com um entediante distanciamento. Veja, por exemplo, o embate entre três superpredadores que acontece no terceiro ato, entre eles o T-Rex. O momento possui uma resolução breve e a luta em nenhum momento ressalta o lado implacável dos seres, soando como mera batalha entre bonecos. Até mesmo os dinossauros criados com efeitos práticos não são tão interessantes, devido a fotografia acinzentada e monótona. 

Por falar em monotonia, o terceiro ato da obra decepciona ao ser filmado de maneira exageradamente escura, prejudicando a imersão. Se a opção por ambientes tão apagados foi para dar dramaticidade ou algum ar de mistério, Trevorrow falhou bizarramente e só conseguiu passar a sensação de que o orçamento ficou curto e precisaram de cores escuras para esconder problemas nos efeitos visuais. Claro que o uso de sombras faz parte da lógica visual do gênero suspense, mas em Jurassic World: Domínio apenas apaga um mundo que deveria ser aterrorizante e fascinante. 

Para não dizer que a parte técnica é de todo ruim, o desenho de som consegue colocar expressões bem particulares em cada bicho, fazendo-nos entender quais são pacíficos e quais violentos. Já a trilha sonora de Michael Giacchino tenta dar os ares épicos que o diretor não consegue. Também se esforça o elenco, seja o núcleo antigo ou novo, composto por Bryce Dallas Howard, Chris Pratt e Isabella Sermon, transmitindo com competência o medo, inteligência e senso de sobrevivência de cada personagem. Destaque total para Jeff Goldblum, que parece ter entendido o nível do material que estava trabalhando e apresenta um cinismo e ironia encantadores.

Fechando com chave de ouro a terrível experiência, temos na sequência final uma espécie de lição de moral, colocando dinossauros lado a lado com animais reais para escancarar a necessidade de proteger a natureza. O momento evidencia uma alegoria que só não era clara para quem dormiu durante a sessão, o que é possível diante de tanta escuridão. Pior do que isso, Trevorrow se mostra desconectado do próprio filme ao errar o direcionamento da mensagem. Como a franquia aponta repetidamente, são os interesses obscuros de corporações que causam boa parte dos danos ao planeta. Jogar a questão ambiental no colo do público sem contextualizar o papel de grandes empresas soa como uma absurda falta de maturidade do realizador. Uma mensagem tão urgente merecia uma obra melhor para ser transmitida. O ecossistema precisa ser salvo, sem dúvida, mas chegou a hora do Parque dos Dinossauros ser extinto.

Jurassic World: Domínio (Jurassic World: Dominion – EUA, 2022)
Direção: Colin Trevorrow
Roteiro: Colin Trevorrow, Derek Connolly, Emily Carmichael
Elenco: Sam Neill, Laura Dern, Jeff Goldblum, Chris Pratt, Bryce Dallas Howard, Mamoudou Athie, Scott Haze, Dichen Lachman, Daniella Pineda, Isabella Sermon, Justice Smith, Omar Sy, DeWanda Wise, Campbell Scott, BD Wong
Duração: 147 min.

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