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Crítica | Justiça Jovem – 2ª Temporada

por Ritter Fan
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  • spoilers. Leiam, aqui, a crítica da 1ª temporada.

Confesso que, quando nos primeiros segundos do episódio inaugural da 2ª temporada de Justiça Jovem revelou-se um salto temporal de cinco anos, fiquei extremamente desapontado ao ponto de quase colocá-la na minha lista de “assistir um dia, se der”. Quando versões diferentes dos personagens da 1ª temporada (como Dick Grayson como Asa Noturna e Aqualad como vilão) e completamente novos personagens (como Mutano, Robin III e Besouro Azul) começaram a pipocar na telinha, tive que recorrer à minha teimosia extrema para evitar clicar no botão “desligar”.

E ainda bem que minha teimosia ganhou a peleja.

Minha reação inicial veio do potencial evolutivo desperdiçado, pois seria espetacular ver a efetiva evolução de Dick Grayson de Robin até Asa Noturna (Jesse McCartney), a traição de Aqualad (Khary Payton), o fim do namoro de Miss Marte (Danica McKellar) com o Superboy (Nolan North), a transformação efetiva do jovem Garfield Logan (Logan Grove) em Mutano depois que ele recebe a transfusão de Miss Marte na 1ª temporada, a aposentadoria de Kid Flash (Jason Spisak) e Artemis (Stephanie Lemelin), agora juntos, e a origem do segundo Besouro Azul (Eric Lopez), além da do Robin Tim Drake (Cameron Bowen), ambos existentes apenas em razão de tragédias anteriores. No entanto, na medida em que a temporada se desenvolve, desta vez com apenas 20 episódios que não desperdiçam tempo, entendi perfeitamente a escolha dos showrunners Brandon Vietti e Greg Weisman: o lapso temporal foi umbilicalmente conectado com a própria estrutura da temporada, algo que tematicamente bate muito bem com o misterioso desaparecimento por 16 horas dos principais membros da Liga da Justiça que ficou sem resposta na temporada anterior e que serve de trampolim para a 2ª temporada, trampolim esse que tem ainda a vantagem de afastar organicamente os pesos-pesados da animação, abrindo mais espaço ainda para os jovens super-heróis, cada vez menos dependentes de suas contra-partidas adultas.

O que vemos, ao longo da 2ª temporada, é a continuação do plano de longo prazo da organização criminosa conhecida como A Luz, comandada por Vandal Savage (Miguel Ferrer) e tendo como membros Ra’s al Ghul (Oded Fehr), Lex Luthor (Mark Rolston), Abelha Rainha (Marina Sirtis), Cérebro (Corey Burton), Klarion (Thom Adcox-Hernandez) e Arraia Negra (também Khary Payton), este mais do que eficientemente substituindo o Mestre dos Oceanos que é defenestrado sem muita cerimonia no interregno para permitir a subtrama da traição de Aqualad, revelado com filho do Arraia. Justificando o subtítulo “Invasão” que a temporada ganhou, o mega-plano envolve, agora, a chegada dos Reach, alienígenas responsáveis pela criação da tecnologia usada pelo Besouro Azul com planos de dominação da Terra, mas que se apresentam aos humanos como aliados, manobrando a mídia e as Nações Unidas como grandes salvadores da pátria e colocando a própria Liga da Justiça sob uma luz negativa.

Com isso, o Besouro Azul na versão Jaime Reyes de armadura e conexão neural com o besouro cibernético em suas costas ganha extrema importância para a história, algo que é amplificado ainda mais pela chegada, do futuro, de Impulso (Jason Marsden), Bart Allen, frenético neto de Barry Allen que vem com uma mensagem apocalíptica que ele tenta a todo custo evitar, ainda que, inicialmente, mantendo segredo sobre a natureza da ameaça que, claro, conecta-se de volta ao Besouro Azul. Também em paralelo, aprendemos que Dick Grayson, sempre o “mais esperto” de todos, tem um plano secretíssimo compartilhado apenas entre ele e Aqualad que, na verdade, é um agente infiltrado da Justiça Jovem na Luz, com o objetivo, claro, de liquidar com os vilões, o que acaba tornando necessário a evolução para algo ainda mais complexo que retira Artemis da aposentadoria, empresta-lhe a aparência de morte e a infiltra como Tigresa, braço direito do Aqualad vilão. Ufa!

Quem lê essa minha tentativa de resumo da história da 2ª temporada – e olha que nem abordei o drama do verdadeiro Roy Harper (Crispin Freeman), agora sem braço, e o novo time de jovens heróis que começa a ser formado – certamente balançará a cabeça incrédulo que todos esses elementos possam ser abordados com propriedade ao longo de apenas uma temporada, sem confundir o espectador. Eu mesmo, na medida em que as informações caíam em meu colo como peças de um ensandecido jogo de Tetris, duvidei que essa aparente “bagunça” pudesse ter algum tipo de encaixe que fizesse sentido no final. Mas a grande verdade é que as conexões são perfeitas e tudo acaba formando um quadro amplo em que o espectador não consegue ver “espaço” nas linhas de encaixe das peças como nas misteriosas paredes megalíticas dos Incas.

A equipe de sete roteiristas, sendo cinco deles também da 1ª temporada, abordou essa conexões de maneira rara de se ver em séries de TV, animadas ou não, mesmo considerando a normalmente alta qualidade das séries animadas da DC/Warner. Em primeiro lugar, não há quase fillers, com tudo tendo propósito narrativo, mesmo que ele só seja reconhecido ou compreendido mais tarde, lá pelo final da temporada. O enxugamento de 26 para 20 episódios ajudou nessa equação, sem dúvida, tornando o passo narrativo muito bem cadenciado, por vezes até exaustivo, mas nunca confuso. Além disso, o salto temporal é utilizado, como mencionei, como artifício narrativo embrenhado nos alicerces narrativos, não só estabelecendo a base para os mistérios, como também funcionando como mola propulsora para as revelações e reviravoltas. E, como se isso não bastasse, os roteiristas não fizeram apenas uma 2ª temporada, mas sim uma segunda parte (de pelo menos três) de uma história só, já que, se olharmos com distância o suficiente para os 46 episódios desde o começo da série, eles funcionam como uma extensa graphic novel dividida em arcos, com eventos interdependentes e que se auto-alimentam organicamente, mesmo considerando os vários novos personagens.

Da mesma forma que os roteiros são redondos, a animação em si é excelente. No departamento de design, a tradição imposta pela 1ª temporada continua aqui, com personagens altamente respeitosos ao material dos quadrinhos, mas ganhando traços que os tornam específicos da série. Naves, submarinos, bases secretas e todo o restante desse universo também ganham um trabalho hercúleo de detalhamento que estabelece uma perfeita organicidade a cada um desses elementos, ao mesmo tempo que traz uma variedade grande de cenários e de fontes inspiradoras (HQs, filmes e outras animações, por exemplo). Não é o “copia e cola” dos quadrinhos que muita gente acha que séries de super-heróis devem ser, mas também não é a reinvenção da roda. A pegada continua adulta, apesar do enfoque nos heróis mais jovens (alguns já nem tão novos assim) e da própria série ser dirigida a um público quase que completamente imberbe. Mas é assim que se faz grandes animações para o público juvenil: mirando nos adultos e, mais ainda, tratando-os como adultos. A própria complexidade da trama já vem para dizer que, aqui, os jovens não serão subestimados – a própria razão de ser da série, aliás! – e a arte acompanha essa linha com sobriedade, mas sem ser sombria ou pesada, mantendo o lado super-heroístico colorido que pode muito bem conviver com temas difíceis como a relação entre pais e filhos, o que um líder precisa ter para ser efetivo e o respeito aos mais velhos e à experiência.

Reconheço, no entanto, que um problema já detectável na 1ª temporada é agravado na 2ª: a quantidade de personagens. Enquanto o núcleo duro da série, Asa Noturna, Aqualad, Miss Marte e Superboy, agora adicionados de Artemis, Besouro Azul e Impulso, que também ganham bons e importantes arcos, continua seu desenvolvimento certeiro, o restante dos heróis faz não mais do que figuração. Enquanto isso é absolutamente esperado dos membros da Liga da Justiça, já que a série não é sobre eles, os demais heróis jovens aparecem em quantidades gigantescas, mas muito pouco de cada um, como resultado. Com isso, o ridículo baiacu-humanoide Lagoon Boy (Yuri Lowenthal) serve apenas para criar um triângulo amoroso entre ele, Miss Marte e Superboy, não sendo mais do que um peixe fora d’água (perdoem-me, nas não resisti…) e as heroínas Moça Maravilha (Mae Whitman), Batgirl (Alyson Stoner) e Abelha (Masasa Moyo), além do novo (e inútil) Guardião, Mal Duncan (Kevin Michael Richardson), também literal guardião do Justiça Jovem, só fazem figuração. Até mesmo Mutano aparece e desaparece quando o roteiro exige (ou não) a presença de um gorila ou rinoceronte verde, sem ser mais do que um penduricalho na história. Do lado dos vilões, não é que eu esperasse efetivo desenvolvimento, mas entre haver algum desenvolvimento e não haver nenhum há um espaço bem grande e a quantidade deles é enorme e todos acabam “se parecendo”, talvez com exceção de Lex Luthor e certamente no caso do Arraia Negra, esse sim fortemente envolvido na história por ser o pai de Aqualad ao ponto de “dar pena” dele pela traição do filho. 

E essa variedade gigantesca de personagens, que são ainda somados ao grupo de garotos potencialmente meta-humanos capturados pelo Reach, dentre eles Super Choque (Bryton James), esses bem trabalhados na medida do que a temporada exige, acaba empurrando para o canto pelo menos uma linha narrativa que poderia ter ganhado mais importância: a jornada de auto-redescoberta de Roy Harper, o Ricardito original que, agora, com um braço cibernético cortesia de Luthor, adota a persona Arsenal. A temporada esboça abordar de maneira significativa sua abdução por nada menos do que oito anos, mas o que vemos é uma recuperação e evolução rápida demais, incompatível com seu drama e que acaba esvaziando muito do potencial do personagem. Talvez o mesmo tenha acontecido com a história pregressa do fim do relacionamento de Miss Marte com Superboy, mas, nessa subtrama, o potencial de algo significativo ocorrer é claramente bem menor, pelo que ela acaba ganhando a atenção possível no contexto. De toda maneira, diria que mesmo a quantidade de coadjuvantes que só estão ali para apontarmos o dedo e nomearmos nosso herói favorito (Lobo! Adam Strange! Eléktron! Zatanna! Homem-Elástico! Raio Negro! O Flash original! – e assim por diante) não atrapalham de verdade a história da temporada. Eles colorem o ambiente e por vezes incomodam quando vêm e vão ao bel-prazer da narrativa, mas não é nada que reduz o prazer em ver uma série dessas amadurecer juntamente com seus personagens-chave.

A 2ª temporada de Justiça Jovem é um acerto quase que completo. Um baita exercício narrativo que assume riscos, faz malabarismo com dezenas de personagens e entrega, no final, uma história altamente recompensadora, com vida própria, relevância e muita, mas muita qualidade.

Justiça Jovem – 2ª Temporada (Young Justice, EUA – 28 de abril de 2012 a 16 de março de 2013)
Criação: Brandon Vietti, Greg Weisman
Direção: Tim Divar, Doug Murphy, Melchior Zwyer
Roteiro: Greg Weisman, Nicole Dubuc, Kevin Hopps, Brandon Vietti, Peter David, Paul Giacoppo, Jon Weisman
Elenco (vozes originais): Jesse McCartney, Nolan North, Danica McKellar, Stephanie Lemelin, Eric Lopez, Logan Grove, Cameron Bowen, Masasa Moyo, Kevin Michael Richardson, Yuri Lowenthal, Alyson Stoner, Mae Whitman, Jason Marsden, Crispin Freeman, Bryton James, Dee Bradley Baker, Lacey Chabert, Kittie, Khary Payton, Phil LaMarr, Bruce Greenwood, Vanessa Marshall, Michael T. Weiss, George Eads, Alan Tudyk, Kevin Michael Richardson, Jason Spisak, Miguel Ferrer, Oded Fehr, Mark Rolston, Marina Sirtis, Corey Burton, Thom Adcox-Hernandez
Duração: 420 min. (20 episódios)

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