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Crítica | Kiki – Os Segredos do Desejo

por Fernando Campos
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O sexo sempre foi um tema intrigante para as pessoas, não apenas pelo prazer que traz, mas também porque representa um dos momentos mais íntimos do ser humano. O cinema, como não poderia deixar de ser, já abordou o assunto várias vezes e através de diversas obras. Contudo, infelizmente, nem todos os filmes sobre o tema são satisfatórios ou até mesmo saudáveis, como é o caso de Kiki, de Paco León, remake do longa australiano A Pequena Morte, de 2014.

O filme conta cinco histórias sobre amor e sexo, em Madri. Paco (Paco León) e Ana (Ana Katz) buscam reacender a paixão das suas relações sexuais. Jose Luis (Luis Bermejo) tenta retomar os sentimentos pela esposa Paloma (Mari Paz  Sayago), que está com a mobilidade limitada em uma cadeira de rodas. Senhora Candelaria (Candela Peña) e Antonio (Luis Callejo) tentam ter um filho, mas ela vê como problema o fato de não conseguir chegar ao orgasmo. Álex (Álex García) deseja satisfazer as fantasias de Natalia (Natalia de Molina), enquanto ela se questiona se ela a pedirá em casamento. Sandra (Alexandra Jiménez), por sua vez, é uma mulher solteira, com um fetiche peculiar, à procura de um homem para se apaixonar.

Durante a projeção, o longa adquire um caráter educativo, apresentando através de letreiros e cenas auto-explicativas diversos tipos de fetiches, como, por exemplo: harpaxofilia (excitação por assaltos), dacrifilia (prazer secual em ver alguém chorar), sonofilia (tesão em ver alguém dormindo) e elefilia (atração sexual por tecidos); todos apresentados de maneira eficiente e fácil de entender, prendendo a curiosidade do espectador para descobrir mais sobre  sexo, tema que inevitavelmente chama a atenção.

No entanto, o que poderia ser uma experiência construtiva, divertida e repleta de aprendizado, torna-se uma representação extremamente infeliz dos fetiches apresentados, uma vez que as soluções que os personagens encontram para viver suas fantasias ou satisfazer seus parceiros são esdrúxulas, para dizer o mínimo. O protagonista com sonofilia, por exemplo, dopa a mulher para transar com ela, sem o seu consentimento, ou seja, a estuprou; mas o longa mostra o momento com uma nojenta aura de humor, como se houvesse graça em assistir alguém tendo relações sem consciência disso. Outro momento infeliz ocorre quando o namorado da garota que se excita com assaltos simula um, apenas por ciúmes, resultando em uma tentativa de violentá-la. Sem contar na fatídica cena que a esposa de um homem finge estar com câncer para vê-lo chorar e transar com ele, ficando claro o tipo de humor esdrúxulo, sem graça e irresponsável do longa, transmitindo a perigosa mensagem de que, para satisfazer-se, tudo é possível.

Além disso, as resoluções dessas tramas caem na armadilha do clichê, finalizadas da forma mais básica possível, como, por exemplo, um anúncio de gravidez e um pedido de casamento, algo bastante conservador para um filme que pretendia ser liberal. Sem contar que a abordagem sobre sexo é rasa, parecendo estar no filme apenas para servir de pretexto para as fracas histórias de amor. Para piorar, a sequência final da obra é constrangedora, mostrando os personagens de todas as histórias paralelas encontrando-se em uma pequena praça e executando uma dança, parecendo algo tirado diretamente do último capítulo de uma novela das 6 (as ruins, porque existem novelas ótimas nesse horário).

Até mesmo as cenas de sexo são decepcionantes, contrapondo com a bela sequência inicial que mostra um casal transando enquanto pequenos cortes mostram animais e plantas, destacando o seu lado instintivo, dando a expectativa de que veríamos mais momentos assim durante a projeção. No entanto, não só essas cenas somem, quando há uma cena de sexo ela dura, no máximo, 15 segundos, como a analogia com o instinto sequer é aproveitado durante a projeção.

Felizmente, o elenco consegue prevalecer mesmo com a o roteiro infeliz, com destaque para Paco León, Ana Katz, Natalia de Molina, Candela Peña, Luis Bermejo e Alexandra Jiménez, todos construindo com eficiência a dificuldade de viver com gostos sexuais tão peculiares ou mostrando como isso afeta seus relacionamentos.

Já a direção de Paço Leon mostra-se simplista e acadêmica, utilizando na maioria do tempo a câmera na mão para dar a sensação de realismo e optando por primeiros planos e planos médios, abdicando do uso de planos emblemáticos e que passassem algo além da expressão facial dos personagens. Dito isso, apenas a direção de arte é digna de elogios na parte técnica, construindo ambientes com vários objetos na cor rosa e verde, para passar uma sensação de excitação.

Em tempos que as mulheres buscam cada vez mais seu empoderamento e temas até então sensíveis, como libertação sexual, são colocados na mesa, todo cuidado é pouco na hora de falar de sexo. No entanto, o diretor e roteirista Paco León demonstra total falta de sensibilidade em Kiki, trazendo bastante infeliz em sua abordagem e vendo graça em situações que não são nem um pouco engraçadas.

Kiki – Os Segredos do Desejo (Kiki – El Amor se Hace) — Espanha, 2016
Direção:
Paco León
Roteiro: Paco León, Fernando Perez
Elenco: Paco León, Ana Katz, Candela Peña, Natalia de Molina, Belén Cuesta, Luis Callejo, Luis Bermejo, Alexandra Jiménez, Mari Paz Sayago, David Mora, Álex García, Mariola Fuentes
Duração: 102 min

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