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Crítica | Klaus

por Kevin Rick
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Sempre gostei de obras, de qualquer forma artística, que pegam contos folclóricos clássicos e mitologias ancestrais e tentam fazer algo novo com a narrativa conhecida, ou simplesmente não tentam reinventar a roda, mas entregam algo divertido. Por isso, quando descobri esse quadrinho, sobre uma nova visão do Papai Noel, escrito por ninguém menos que Grant Morrison, fiquei extasiado com as possíveis abordagens do autor lendário da Nona Arte. Quem está acostumado com o trabalho do escritor, sabe do seu estilo, que por falta de uma palavra melhor, definiria como “estranho”. Morrison sabe como construir obras surreais, narrativamente complicadas, oníricas, e por aí vai. Logo, foi uma tremenda surpresa ler Klaus, uma das HQs mais diretas, objetivas e simples do autor. Notaram uma pontinha de decepção? É o que as expectativas fazem com a gente. Mas, ainda assim, me diverti muito lendo esse tratamento rústico e sanguinolento da origem do Natal e sua figura mais importante.

A trama da minissérie acompanha Klaus, um homem “selvagem” que vive de forma sublime nas florestas gélidas com seu animal de estimação, um grande lobo branco. Após uma rápida visita à cidade local, nosso protagonista se envolve em problemas com os guardas do reino ao tentar ajudar uma criança que estava sendo espancada por simplesmente brincar com uma pedra, o mais próximo de um brinquedo que ele pode ter, pois o líder da cidade é um tirano que retém qualquer forma de entretenimento, e também mantém rígidas horas de trabalho minerador para os trabalhadores locais. Pela insolência, Klaus é condenado a andar quase nu no frio mortal, mas é felizmente salvo por seu companheiro animal. À noite, durante um devaneio musical, o protagonista encontra-se ao meio de espíritos florestais, que na manhã seguinte, deixam dezenas de brinquedos para Klaus distribuir às crianças, que anseiam por um passatempo no Yuletime.

Já conseguiram adivinhar toda a narrativa? Pois é, eu também, após um capítulo. Klaus precisa entregar os presentes às crianças, derrotar o tirano para salvar o povo e, por fim, constituir o feriado eterno do Natal como um tempo de alegria, dádivas e libertação. Se isso não é o suficiente, ainda há a princesa – rainha, nesse caso – em perigo. É tudo extremamente clichê e Morrison não parece se importar muito em usar as convenções narrativas para criar suspense, surpresa ou fascínio. Essa obviedade de obras natalinas é algo esperado, mas é dentro do contexto previsível manuseado de forma inesperada no meio da trama que mora a diferença qualitativa em adaptações do Papai Noel. E, infelizmente, a criatividade do Morrison morreu na premissa.

No entanto, se a obra é exageradamente presumível, como ela se sai no oferecimento de um conto natalino violento e descompromissado? Essencialmente bem, quando a ação está em movimento. É notável a dificuldade do Morrison em sustentar um desenvolvimento de múltiplos núcleos bacanas, com a história dos espíritos utilizadas como deus ex-machina sempre que Klaus precisa sobreviver ou sair de uma enrascada; o vilão final, que assumo ser Krampus, dificilmente causa impacto; e até o romance dele com a rainha enganada é raso; porém, toda a movimentação dinâmica e as façanhas absurdas para entregar sorrisos infantis são o que tornam a leitura divertida e entusiástica.

Isso se deve muito a arte de Dan Mora, que a melhor forma para descrevê-la, seria com a palavra vívida. Seu estilo artístico mais lembra pinturas do que desenhos de quadrinhos, construindo belíssimos painéis que gritam a ambientação medieval e fria, transpondo um sentimento de imersão na atmosfera fascinante de aventura. Tudo é muito exuberante na quietude, onírico e surreal com os espíritos, com variações insanas de cores, e extremamente dinâmico quando direciona-se à ação. Mora tem total controle artístico da trama, elevando o descompromisso narrativo com sua arte estupenda.

Eu consigo entender o contexto simplório e aventureiro que Grant Morrison que elaborar, com um toque de princípio fantástico para o Papai Noel Viking, mas é complicado comprar seu conceito descompromissado completamente, com desenvolvimentos narrativos tão telegrafados que danificam a experiência, e personagens secundários que continuamente estão à serviço de facilitar a história de origem do Papai Noel, com vilões que não parecem causar problemas a um protagonista que mais parece um super-herói medieval, que ainda conta com ajuda de seres místicos tão poderosos que fica a pergunta deles não resolverem os problemas sozinhos. Apesar disso, com uma tremenda ajuda artística de Mora, Klaus consegue ser um violento deleite descerebrado natalino, que certamente trará sorrisos se puder afastar o aborrecimento da previsibilidade.

Klaus (Idem – EUA, 2015/16)
Contendo: Klaus #1 a 7
Roteiro: Grant Morrison
Arte: Dan Mora
Letras: Ed Dukeshire
Capas: Dan Mora
Editoria: Eric Harburn, Matt Gagnon
Editora: Boom! Studios
Data original de publicação: novembro de 2015 a agosto de 2016
Editora no Brasil: Devir Livraria
Data de publicação no Brasil: dezembro de 2017
Páginas: 208

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