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Crítica | Kong: A Ilha da Caveira

King Kong revisitado.

por Fernando JG
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Em 1944, dois pilotos sofrem um acidente aéreo e aterrissam numa ilha perdida no oceano. Ao descobrirem do que se trata o lugar, decidem se unir para sobreviver ao ambiente hostil. Cerca de 20 anos depois, nos Estados Unidos da América, a equipe de inteligência descobre um lugar inóspito o qual cunhou chamar de ilha onde “Deus não terminou sua criação”. Seja lá o que for essa ilha, o plano exploratório é colocado em prática sob o lema de “ocupar para não perder”. Tudo estava indo bem até os verdadeiros donos do lugar aparecerem e transformarem a aventura numa luta pela sobrevivência. A velha e conhecida história do mito da “terra perdida” recomeça neste conto do rei Kong no monsterverse

Apresentando-se como um filme introdutório ao universo do gorila, o longa dirigido por Jordan Vogt-Roberts foge das ambições megalomaníacas que estivemos acostumados a ver quando a mesma história foi contada por Peter Jackson (King Kong, 2005). Pelo contrário, Kong: A Ilha da Caveira caminha a passos lento, investiga o seu campo e prepara o terreno para novos enredos. Isso explica a característica mais geral da película, cujo objetivo é desenvolver a atmosfera universal pela qual o filme é conhecido, apresentando a Ilha e seus monstros, como a lula gigante, os aracnídeos, grandes pássaros carnívoros e répteis da espécie Skullcrawler. Neste sentido, embora Kong seja o elemento principal da trama, ele propositalmente é posicionado à margem do drama. O filme se ocupa, assim, num estudo geral sobre o reino e não sobre o seu rei. 

A contextualização histórica é um ponto forte e percorre todo o longa com espécies de sutis críticas à situação estadunidense dos anos 1970 durante a Guerra do Vietnã. A caça pelo monstro acaba se tornando uma alegoria dupla que reflete ora a briga contra o “monstro socialista vietnamita” ora a intenção predatória na Ilha da Caveira. O que eles não esperavam em encontrar, em ambos os casos, era isso: um monstro em seu próprio território e superior a qualquer estratégia norte-americana. A invasão territorial sai a um preço caro. 

Neste ponto, o filme se inspira livremente em Apocalypse Now e tem a licença de partilhar das mesmas inspirações estéticas, políticas e dramáticas que hoje se tornaram marcas exclusivas do filme de Coppola. Fechando essa aba de comparação histórica – que merecia ser comentada, afinal de contas, o filme clama que isso seja notado logo de primeira – a aparição do Gorila na cena inicial é emblemática e dá a ver a bizarra opulência que caracteriza a dimensão do bicho. Não emociona, mas espanta pela grandeza.

A relação de Kong com Mason Weaver (Brie Larson) sai um pouco pela tangente e evita desenvolver aquela já conhecida e passional relação estranho-familiar entre a bela e a fera. Se das outras vezes a história do gorila adquire uma feição trágica inserida num espectro romântico de amor e morte – isto é, Kong morre por amor – aqui ele apenas toma conhecimento da bela, mas não o suficiente para mobilizar qualquer coisa além de um mero encontro de olhares. Isso é uma maneira de repensar e redramatizar a intriga fílmica, entrando novamente de acordo com as intenções do filme de ser mais abrangente e menos estudo de personagem. Kong: A Ilha da Caveira se desfaz das amarras que o prendiam na intriga original e faz seu próprio percurso. 

De qualquer forma, não há quem diga que as cenas de confronto não são menos do que excitantes. Desde o massacre dos helicópteros, passando pela batalha com a lula gigante até a cena final do Kong x Skullcrawler, observamos intensos e bem ensaiados momentos de horror e tensão. Os desenhos dos monstros, sobretudo de King Kong, são bem feitos e incitam sempre a querer ver mais e mais da força desses monstros de força inefável. A direção não economiza em violência e faz com que essas aberrações da natureza, em seu próprio habitat, ajam no limite de sua força bruta. Embora violento, o filme deixa clara a natureza pacífica de Kong. Os olhos brilham em cada parte do corpo que é estraçalhada. O que colabora na elaboração da mise-en-scène monster é a sua trilha sonora que, com David Bowie e Black Sabbath, potencializa os sentidos de aventura e perigo que a floresta apocalíptica resguarda. 

Diria que Kong: A Ilha da Caveira tem um roteiro simples, que abre poucas vias mas trabalha com as mesmas até o fim. Embora parte do universo monster, o filme não avacalha e não exagera na mão quando o assunto são monstros que vivem numa ilha mitificada. O elenco – que é composto por estrelas do nível de Samuel L. Jackson (que está insuportável e vingativo), Tom Hiddleston, Brie Larson, John C. Reilly e John Goodman – mostra sintonia e reage bem à proposta. Apesar de tudo, não espere que os personagens tenham alguma participação dramática no roteiro, ou mesmo alguma profundidade. São meras peças de composição que agem às vezes de maneira mecânica com a finalidade de cumprir um papel ou uma emoção específica. Destaques para Samuel L. Jackson, como sempre, e Tom Hiddleston. No mais, aqui e acolá, o filme libera alguns easter eggs que indicam futuros novos cruzamentos entre o universo monster, acima de tudo porque há uma aparição do Godzilla pós créditos. 

Skull Island é um filme sóbrio, com lugares comuns óbvios, que absorve e acena a outros grandes clássicos cinematográficos como Apocalypse Now e Jurassic Park para se estabelecer no gênero de blockbuster épico, e trabalha com uma fotografia um tanto realista num roteiro simples mas funcional. Um feijão com arroz que dá certo. Diferente de Peter Jackson, a aposta não é o drama mas uma apresentação geral da atmosfera monster que inclui certamente um estudo um pouco mais amplo da fauna aberrativa da Ilha da Caveira. Kong é um bom recomeço da franquia. Genérico? Pode ser. Mas divertido de acompanhar. 

Kong: Skull Island (Kong: A Ilha da Caveira, EUA, 2017)
Direção: Jordan Vogt-Roberts
Roteiro: Dan Gilroy, Max Borenstein, Derek Connolly
Elenco: Tom Hiddleston, Samuel L. Jackson, John Goodman, Brie Larson, Jing Tian, Toby Kebbell, John Ortiz, Corey Hawkins, Jason Mitchell, Shea Whigham, Thomas Mann, Terry Notary, John C. Reilly
Duração: 118 min.

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