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Crítica | Krishna e a Joia Syamantaka

Um presente do deus Sol.

por Luiz Santiago
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As aventuras de Krishna publicadas pela Amar Chitra Katha são marcadas por eventos fantasiosos, ações de boa convivência e benfeitorias para famílias ou para um povo inteiro que precisa de ajuda. São histórias que contam com a aparição de diversos deuses e outras criaturas do panteão hindu e que trazem reflexões atemporais sobre comportamentos, sentimentos e pensamentos de seres divinos e de seres humanos. Nesta trama publicada em 1975, encontramos a mais frágil de todas as histórias com esse avatar de Vishnu publicadas até então. Nela, a roteirista Kamala Chandrakant traz um princípio bonito e bem cuidado em sua preparação para os grandes problemas, mostrando-nos o príncipe Satrajit em sua devoção a Surya, o deus Sol e a bênção que essa devoção lhe traz, certo dia, após um período de orações.

A aparição de Surya para Satrajit me lembrou um pouco algumas aparições de seres celestiais para profetas do Velho Testamento, inclusive pelo fato de trazer algo que mudaria para sempre a vida das pessoas envolvidas. Aqui, Satrajit é presenteado com a gloriosa joia Syamantaka, uma peça que, segundo diziam, traria para qualquer um que a possuísse muita prosperidade. A pessoa e o lugar em que vivesse se veriam livres de guerras, secas, inundações, terremotos ou fome, e estariam sempre cheios de riquezas e paz de espírito. Além disso, a joia tinha a capacidade de produzir uma grande quantidade de ouro por dia. É claro que um presente divino como este não ficaria escondido — até porque seu poder faz com que seja visto à distância, pelo enorme brilho que emite — e que geraria a cobiça de alguns.

É nesse aspecto mais mundano que toda a problemática da edição se dá, o que torna esse quadrinho diferente dos anteriores, ou seja, seu principal foco é a tentativa de diferentes pessoas em terem a posse do presente dado pelo deus Sol a Satrajit, e com isso, todas as consequências esperadas desses atos tomam forma. O problema que encontramos no desenvolvimento dessa história é o mesmo que tínhamos na finalização das primeiras edições da editora, ou seja, muita coisa acontecendo em pouco espaço e sem nenhum tipo de cuidado do texto em explicar ao menos superficialmente a novidade que se apresentava. Só nessa história, Krishna ganha duas noivas (Jambavati e Satyabhama) e tudo acontece a toque de caixa, com o roteiro passando por cima de qualquer contexto e melhor interação entre os personagens.

Além dessa questão de organização, as negociações de Krishna não me parecem interessantes. Eu não conheço a história original e não sei até que ponto foi a interferência de Kamala Chandrakant na escrita de seu texto, para condensar a história e torná-la dramaticamente coesa (sem muito sucesso nessa parte, aliás), mas não faz muito sentido o povo desconfiar que Krishna teria roubado a joia. Contudo, este é justamente o problema do deus aqui. Ele sabe que as pessoas estão suspeitando dele e por isso faz de tudo para recuperar a joia, conseguindo-a, de formas diferentes, em todas as ocasiões, mas em nenhuma delas eu vi algum sentido na suspeita. Ele não faz nada para que o povo desconfie e não há nenhuma indicação disso por parte do povo. Se esta era mesmo a intenção, a autora deveria trabalhar um conflito nesse sentido, mas ela não o faz, então a desconfiança fica jogada.

Conhecer um pouco mais da história de Krishna e ter mais um vislumbre de como um presente dos deuses pode causar uma cadeia muito complicada e até mortal de eventos em uma cidade ou um reino inteiro faz valer a leitura de Krishna e a Joia Syamantaka. A trama sofre de problemas de organização interna (motivações e contextos) e de condução dos personagens, mas não é vazia de conteúdo reflexivo (muito pelo contrário) ou de alguns momentos que podem distrair ou divertir o leitor.

Krishna e a Joia Syamantaka (The Syamantaka Gem) — Índia, 1975
Roteiro: Kamala Chandrakant
Arte: H. S. Chavan
Editoria: Anant Pai
34 páginas

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