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Crítica | “Let Go” – Avril Lavigne

Eternizando as intensidades e complexidades da juventude.

por Matheus Camargo
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“Cause nothing’s going right

And everything’s a mess

And no one likes to be alone”

O início dos anos 2000 para a música pop foi extremamente marcante. Grandes nomes que influenciaram a maior parte do que escutamos hoje em dia surgiram nessa época, lembrada pela dominação das girlbands, tal como Destiny’s Child ou TLC, ou a ascensão de ícones como Britney Spears. Explosões de novas culturas e estéticas, como o y2k e o otimismo do futuro, seguida pela quebra de expectativa da McBling, que passa a valorizar a luxúria e o materialismo, até que, em 2002, Complicated é lançada, e Avril Lavigne é apresentada ao mundo como uma alternativa que sempre existiu, mas agora representada por uma face sincera. Um contraponto, uma alternativa punk que desmistificava a adolescência e tratava de problemas reais com honestidade. Let Go, seu primeiro álbum, comemora vinte anos sendo o ponto inicial para toda uma era que trouxe pinceladas de rock e punk ao mainstream

Losing Grip consegue prender a atenção logo de início, desde a sua construção, que sabe trabalhar com os momentos confessionais e os momentos de extravasar sua raiva, até as ferramentas utilizadas para expressar este furacão interno, como os vocais de Avril, que sabem trazer impacto a cada descer e subir não apenas melódico, mas também lírico, com uma letra recheada de vivacidade e que oferece sentido ao seu transbordar. Complicated usa dessa mesma sensibilidade, tratando de como as pessoas perdem a si mesmas na tentativa de se encaixarem em lugares que não as cabem, mas vestida em uma roupagem que justifica facilmente o sucesso que alcançou: da música ao clipe, é simplesmente muito divertida. Fechando esse ato inicial com outro hit, Sk8er Boi e o seu som mais sujo, pesado, conta uma história alternando entre versos, que também consegue soar icônica e nostálgica.

I’m With You mostra uma outra face da artista, após três faixas explosivas de sua própria maneira, a balada não tem medo de buscar grandiosidade na vulnerabilidade, construindo um crescendo que deságua na ponte de “Yeah, yeah” ardentes e em vocais enérgicos ao final. Sua melancolia renova o trabalho, abrindo espaço para se aprofundar em perspectivas mais intensas da juventude, e Mobile confirma esse eco inicial ao se abrir quanto à dificuldade de se adaptar a todas as mudanças ensurdecedoras que acontecem nessa idade, utilizando da inteligente escolha de palavras que se contradizem e se complementam, soando ao mesmo tempo como “I’m a mobile” e “I’m immobile”. Dentro dessas agitações, Unwanted desabafa ao sentir-se incompreendida pelo outro, mas não clama por pertencimento, se apropriando dessa angústia e a transformando em combustível numa das faixas mais potentes do álbum. 

Lentamente, Avril se torna uma porta-voz das ansiedades adolescentes, com cada canção tendo o seu papel em desconstruir imagens utópicas e realidades distantes, como em Tomorrow, que simplesmente admite que não está tudo bem, mas termina numa nota de esperança: “Tomorrow, it may change”. Centrada na exaltação do ser diferente e de viver intensamente, Anything But Ordinary irrompe como um clássico instantâneo e desde o instrumental que a introduz, jovial e vibrante, consegue transmitir esse pulso, a ambição por uma vida que representa o mesmo ímpeto que corre por suas veias. Como uma perfeita tradutora dos tormentos juvenis, Things I’ll Never Say compreende com sucesso os momentos de paranóia, quando enxurradas de preocupações e obsessões consomem sua mente em desesperos tão íntimos que ninguém ao redor tem ideia do turbilhão interno que se passa no momento. 

Contando a sua história, vindo de uma cidade pequena e alcançando a fama tão nova, Avril contrasta a sua nova realidade e seus sonhos mais ambiciosos em My World, que apesar de fazer um bom papel ao apresentar as raízes da artista, tropeça ao tentar aproximar seu som de um country-pop mais calibrado, porém menos carismático. Ironicamente, Nobody’s Fool serve como uma resposta aos papéis que tentaram a forçar, impondo a própria personalidade e usando da sua própria música como um instrumento para se descobrir e se entender como pessoa. O disco começa a perder fôlego ao se aproximar do final, repetindo certos temas que não precisam de mais afirmação. Too Much To Ask é bem escrita, mas não se destaca e acaba sendo vítima dessa fadiga, que, felizmente, é revertida por Naked, a última faixa do projeto. O que de início parece estar sendo cantado para um amor que despe todos os medos da artista se desenvolve a uma ode à sua nova relação – dessas vez com a música, onde pode finalmente ser livre pra expressar e abraçar seus medos.

O que existe nessas treze faixas é pura síntese dos problemas de uma época da vida que pode ser resumida por intensidade. É um disco que funciona como um estudo dos anseios adolescentes porque a voz por trás dessas angústias é capaz de transpor sua dor ou sua euforia em música igualmente impetuosa. Por mais que uma ou outra peça desse quebra-cabeça ressoe musicalmente ou tematicamente repetitiva, o sentimento geral que vocifera por trás de cada verso é vivo e esfomeado, prova disso é que os mesmos temas cantados vinte anos atrás continuam sendo bradados no presente, não coincidentemente utilizando de um renascimento do punk e do rock que não parece ter data de validade. Seja pra extravasar sobre uma relação falha, um não conformismo com o presente, uma insegurança consigo mesmo, uma incerteza com o futuro, o que Avril Lavigne fez foi trazer para o popular uma catarse que é sempre muito bem vinda e necessária, e que só disparos de guitarra conseguem proporcionar de forma satisfatória. 

Aumenta!: Unwanted
Diminui!: My World
Minha canção favorita do álbum: Losing Grip

Let Go
Artista: Avril Lavigne
País: Reino Unido
Lançamento: 4 de Junho de 2002
Gravadora: Arista Records
Estilo: Pop Rock, Punk

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