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Crítica | Lightyear

A história do boneco.

por Kevin Rick
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Lightyear não é exatamente a história de origem do brinquedo Buzz Lightyear da cinessérie Toy Story. Na verdade, o filme conta a razão pela qual o brinquedo se tornou um brinquedo e como ele acabou se juntando à coleção de personagens no quarto de Andy: Buzz Lightyear era o protagonista do filme favorito de Andy. O mais novo spin-off da Pixar, então, é “aquele filme”, como indicam as legendas do início da obra. Mas não esperem nenhum tipo de metalinguagem ou metaficção, pois apenas assistimos a obra que encantou o garotinho que amava Woody e faroestes. Para todos os efeitos, esse é o Star Wars desse universo, como a primeira animação do estúdio gostava de parodiar.

Ou, melhor dizendo, Lightyear é uma amálgama de inspirações da ficção científica, passando por referências que vão desde o universo de George Lucas, 2001 – Uma Odisseia no Espaço, Gravidade, até publicações de sci-fi pulps dos anos 50. Aliás, a narrativa toda tem um cenário bem clássico de space opera, contando com uma trama simples, personagens carismáticos e elementos comuns do gênero, como viagem no tempo, paisagens fantásticas e tecnologia futurista. A abordagem da produção é bastante aventureira e, obviamente, com uma pegada infantil, ainda que, como sempre, a Pixar traz sua ponte dramática para espectadores adultos, apresentando temas como egoísmo, obsessão e principalmente cooperação – todos elementos caros ao personagem em Toy Story.

O início do filme é extremamente corrido e frenético, com a narrativa nos jogando de cabeça numa missão dos patrulheiros espaciais, comandada por Buzz (Chris Evans), sua parceira Alisha Hawthorne (Uzo Aduba) e um recruta. O astronauta queixudo acaba cometendo um erro que se torna o estopim da história. A velocidade com que tudo é estabelecido é um tanto abrupta e muito apressada para meu gosto, mas também há um senso de imersão na economia narrativa, inclusive com uma montagem de passagem do tempo reminiscente da abertura de Up – Altas Aventuras. Rapidamente, estamos numa belíssima ópera espacial com um herói buscando redenção.

No entanto, o que se segue a partir disso é decepcionante. Lightyear assume uma linguagem de blockbusters genéricos, inclusive com animação extremamente fotorrealista que aproxima a experiência de um live-action, distanciando-se de uma ficção científica verdadeiramente criativa, como o estúdio havia feito no épico romântico e socialmente crítico de WALL-E – as animações da Pixar eram sobre extrapolar a realidade, não se aproximar dela. Além disso, a trajetória da aventura vai do ponto A ao ponto B com extrema previsibilidade, jogando momentos pouco inspirados de ação aqui e ali como interlúdios de uma história que explora de forma óbvia e superficial o tema principal de trabalho em equipe. De perseguições de robôs e monstros, até elementos melodramáticos banais, o longa é uma sucessão de escolhas derivativas.

É bastante perceptivo como a produção não tem qualquer tipo de ambição, não toma nenhum risco para tornar a experiência especial. A mensagem da história está explícita a todo minuto; os personagens em volta de Buzz, ainda que divertidos (especialmente o gato Sox), são todos arquétipos rasos para providenciar risadinhas; e o arco do protagonista é tão clichê quanto seus bordões. Mas, além dessa simplicidade atípica do estúdio, o principal problema da produção é sua falta de escopo para uma história que deveria ir ao infinito e além, seja na falta de desenvolvimento da mitologia do universo dos patrulheiros especiais, seja na direção apática de Angus MacLane.

A animação é extremamente detalhista, e existem momentos como o fundo escuro e engolidor do espaço ou as viagens em hiper-velocidade de Buzz que são verdadeiros deslumbres, mas a narrativa visual da série acontece largamente em  pequenas locações, inclusive com um ato final quase todo dentro de uma nave vs robôs malvados…, ou então com passagens estranhamente escuras e esteticamente vazias no planeta alienígena. A trilha sonora de Michael Giacchino dita o tom bombástico de filmes espaciais em algumas sequências das naves, mas, fora isso, tudo é tão vazio como os cosmos.

Por exemplo, WALL-E tem uma perseguição de robôs onde o cenário emula questões de trânsito com linhas de tráfego, diversos designs, e sequências como o protagonista voando e dançando no espaço com um extintor. Lightyear não tem um dedo dessa criatividade cinematográfica. A Pixar está perdendo isso, o pensamento cuidadoso para cada momento e cada aspecto do universo em tela. Está perdendo a mágica.

Apesar dos problemas, Lightyear consegue ser uma diversão razoável. O ritmo da história não para, o trabalho de voz é carismático e temos boas piadas com Sox, além de muitas referências visuais e narrativas para o gênero de ficção científica. Mas, bem, não espere nada único como a Pixar normalmente entrega, pois esse spin-off parece mais uma produção de algoritmo da Disney do que uma criação autoral do estúdio de clássicos animados. A essência da história não tem potência emocional, a construção de mundo é pífia ao ponto deste cenário espacial ser similar a qualquer outro desenho sci-fi, e a viagem pelo espaço será lembrada pela beleza da animação e não por suas qualidades cinematográficas ou narrativas.

Lightyear | EUA, 17 de junho de 2022
Direção: Angus MacLane
Roteiro: Jason Headley, Angus MacLane
Elenco: Chris Evans, Keke Palmer, Peter Sohn, James Brolin, Taika Waititi, Dale Soules, Uzo Aduba, Mary McDonald-Lewis, Efren Ramirez, Isiah Whitlock Jr.
Duração: 105 minutos

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