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Crítica | Love, Death & Robots – 2ª Temporada

por Ritter Fan
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Avaliação geral
(não é uma média)

  • spoilers leves.

Mais de dois anos depois da inesquecível temporada inaugural de Love, Death & Robots, antologia de curtas animados de curadoria de Tim Miller, David Fincher, Joshua Donen e Jennifer Miller que é uma verdadeira incubadora de ideias para longas e séries de TV por criadores e estúdios diferentes – e muito me espanta nenhum ter sido desenvolvido nessa linha até agora – eis que a série retorna para mais um pouco, quase uma “amostra grátis” considerando que são apenas oito novos curtas em oposição aos 18 do primeiro ano. Em razão do número diminuto de curtas, decidi fazer uma mistura de crítica geral com críticas específicas de todos os episódios e de ranking, tudo em um pacote só para todos os gostos.

O que imediatamente chama atenção para o agregado deste curtas é, mais uma vez, a qualidade dos designs e das técnicas de animação em si, sempre deslumbrantes e imediatamente cativantes, mesmo que a computação gráfica seja quase que absolutamente dominante – a exceção é o stop motion usado em Pela Casa, ainda que eu desconfie que seja CGI emulando stop motion – e mesmo que diversas delas cambem para o fotorrealismo visto mais comumente em cutscenes de jogos eletrônicos de última geração, o que acaba criando uma sensação de pasteurização no que era para ser uma oferta variada. Seja como for, é inegável que a arte é capaz de fazer os olhinhos de qualquer um que gosta de animações brilharem, desde as caricaturas da terceira idade de Atendimento Automático ao Cliente, passando pelo estilo “apocalipse Mad Max” de Snow no Deserto e chegando na impressionante atmosfera neo-noir estilo Blade Runner de Esquadrão de Extermínio.

Por outro lado, em linhas gerais, a 2ª temporada da série arrisca-se muito menos do que a 1ª. Não há nenhum curta ruim, vejam bem, mas não há em sequer um dos oitos apresentados a inteligência de Os Três Robôs, o lirismo de Zima Blue, a loucura completa de Quando o Iogurte Assumiu o Controle, a tensão de Ajudinha ou a mais pura diversão de Histórias Alternativas. Sem risco, não há recompensa e a curadoria de Fincher e companhia falha em encontrar histórias que realmente fazem de tudo para ir além do lindo, mas razoavelmente vazio ou simples, levando a um resultado geral consideravelmente esquecível, bem diferente de grande parte da primeira leva de curtas, lá atrás, em 2019, mais conhecido como o ano anterior à pandemia.

Mas vamos lá para minhas “pílulas críticas” sobre cada um dos curtas, do pior ao melhor (e mandem a ordem de vocês!):

8º Lugar:
A Grama Alta

Quando um trem para inesperadamente, um passageiro sai para fumar, começa a ver luzes estranhas na grama alta e parte para investigar o fenômeno. Premissa simples, com execução igualmente simples que se destaca pela arte estilizada, quase como rotoscopia e pela atmosfera de suspense que consegue construir apenas com um personagem cercado de mato alto.

O problema é que A Grama Alta é só isso mesmo, sem qualquer pretensão maior, quase como um curta feito por estudante de cinema para mostrar sua técnica no trabalho de final de curso. Faltou refinamento narrativo para além dos sustos baratos e da fotografia escurecida que toma o curta de assalto nos minutos finais e para criar um final competente, que não pareça apenas um fim na base do “porque sim”. E não, o que falta não é “explicação” sobre o que acontece, mas sim algo que faça do curta algo que gere algum tipo de discussão, um quê de curiosidade nem que seja uma sobrancelha levantada quando os créditos começa a rolar.

Infelizmente, porém, A Grama Alta é, apenas, estilo sobre substância que não consegue muito mais do que ficar ali na linha mediana do “ok, vamos ao próximo”. Uma pena.

A Grama Alta (The Tall Grass, EUA)
Direção: Simon Otto
Roteiro: Philip Gelatt (baseado em história de Joe Lansdale)
Elenco: Joe Dempsie, Steven Pacey
Estúdio:
Axis Animation
Duração: 11 min.

7º Lugar:
Pela Casa

E se o Papai Noel não fosse exatamente um velhinho rechonchudo, de barba branca e que veste roupa vermelha? É essa a pergunta que Pela Casa tenta responder, conseguindo um resultado final original e interessante, mas que é uma daquelas histórias que literalmente se transformam em suas reviravoltas, ou seja, realmente se confundem com elas, tornando-se indissociáveis.

Em outras palavras, é uma boa ideia que Joachim Heijndermans teve e que Philip Gelatt deve ter formatado como um roteiro de dois parágrafos pequenos. Chega a ser um milagre (natalino?) que Elliot Dear tenha conseguido “esticar” a narrativa por algo como cinco minutos (os outros dois são créditos), ainda que a direção de arte seja bem trabalhada e cuidadosa em seus detalhes, especialmente o design diferentão do “Papai Noel”.

Mas, como disse, Pela Casa é um curta que tem um fim em si mesmo e que vive pela sua revelação, sem tentar sequer um elemento narrativo um pouco mais relevante. Faz parte, mas, para mim, fica ali na linha do mediano e olhe lá.

Pela Casa (All Through the House, EUA)
Direção: Elliot Dear
Roteiro: Philip Gelatt (baseado em história de Joachim Heijndermans)
Elenco: Divi Mittal, Sami Amber, Fred Tatasciore, Brynley North
Estúdio:
Blink Industries
Duração: 7 min.

6º Lugar:
Gaiola de Sobrevivência

Gaiola de Sobrevivência é o caso do CGI fotorrealista estupendo que basicamente materializa a versão digital de Michael B. Jordan diante de nossos olhos, em um trabalho de se tirar o chapéu, mas que é usado em um roteiro – baseado em história de ninguém menos do que Harlan Ellison! – pífio que coloca um piloto de uma nave que cai em um planetoide tendo que se virar na tal gaiola do título quando o robô de manutenção dá defeito e vira um monstro homicida.

A sempre relevante e interessante temática do homem versus máquina está lá, claro, mas a execução, para além da computação gráfica de encher os olhos, é banal, com situações repetitivas e uma solução anticlimática que desaponta. Pelo menos, por alguns segundos, o curta mostra que, em mãos mais hábeis, poderia ser um média metragem de sobrevivência daqueles de um personagem só, mas Philip Gelatt joga fora tudo o que complicaria a questão e estabelece um caminho reto demais entre os pontos A e B.

No final das contas, o curta enche os olhos, mas não a alma. E a luta do personagem do Jordan contra o robô malvado não fica muito diferente dos conflitos que temos no cotidiano com nossos eletrodomésticos na cozinha.

Gaiola de Sobrevivência (Life Hutch, EUA)
Direção: Alex Beaty
Roteiro: Philip Gelatt (baseado em história de Harlan Ellison)
Elenco: Michael B. Jordan, Michelle C. Bonilla, Briant T. Delaney
Estúdio:
Blur Studio
Duração: 14 min.

5º Lugar:
Atendimento Automático ao Cliente

Lembram da segunda parte de WALL-E, com os humanos na nave sendo mimados por toda sorte de criados eletrônicos? Pois esse – trocando a nave pela Terra e os personagens rechonchudos por idosos – é o pano de fundo de Atendimento Automático ao Cliente que, claro, ainda faz ironia com os serviços automatizados de atendimento ao cliente quando um Aspirobô sai do controle e se torna uma máquina mais letal que o T-800 no primeiro O Exterminador do Futuro. E sim, trata-se da exata mesma premissa do curta anterior, com a diferença que esse aqui descamba para o humor e para as situações absurdas sem se preocupar tanto com gráficos perfeitos.

Dirigido de forma muito dinâmica por um colegiado de diretores que se autodenomina Meat Dept e que também escreveu o roteiro com John Scalzi, o curta trata do conflito entre humanos e máquinas de maneira jocosa e muito divertida, ainda que nunca realmente desponte para algo realmente especial ou memorável. Até mesmo o design do Aspirobô deixa a desejar, mais parecendo algo feito na correria para cumprir prazo, ainda que as caricaturas humanas sejam razoavelmente interessantes.

O que segura o curta de verdade é seu ritmo inclemente e a variedade de novas situações que a senhorinha tem que enfrentar enquanto “conversa” com o maldito serviço computadorizado de atendimento ao cliente que estabelece imediatamente conexão com nosso mundo real quando vamos fazer coisas simples como cancelar a assinatura de algum serviço qualquer. Esse futuro aí do Aspirobô, portanto, não é lá tão impossível assim…

Atendimento Automático ao Cliente (Automated Customer Service, EUA)
Direção: Meat Dept (Kevin Dan Ver Meiren, David Nicolas, Laurent Nicolas)
Roteiro: John Scalzi, Meat Dept (baseado em história de John Scalzi)
Elenco: Nancy Linari, Ben Giroux, Brian Keane
Estúdio:
Atoll Studio
Duração: 14 min.

4º Lugar:
Gelo

Gelo tem um roteiro que consegue muito bem estabelecer o universo que deseja usar em que a humanidade colonizou outros planetas e que tornou comum as alterações genéticas que dão habilidades sobre-humanas a quem passa pelas modificações, com um jovem sendo aparentemente o único que é completamente “normal”. E é ele que quer acompanhar o irmão modificado e sua gangue de amigos também assim em uma perigosa “pesca” de baleia alienígena.

O sentimento de isolamento do irmão não modificado e sua tentativa de se conectar com o irmão mais novo e os amigos dele é algo que funcionaria bem se o curta fosse um pouco mais longa, pelo que o que temos aqui, mesmo considerando o belo final, é apenas um “esboço” de construção de ligação entre personagens. E o mesmo vale para a aceitação do jovem pelo grupo da juventude transviada do planeta, algo que é visto apenas muito en passant, de forma que a história possa abrir espaço para o visual muito bonito, mas não particularmente original, desse mundo alienígena.

Gelo tenta ser mais do que visuais e quase consegue, perdendo pontos ao não continuar o que faz muito bem no seu minuto inicial que constrói esse futuro diferente, mas não tanto. Há substância por trás do que vemos, mas ela definitivamente não consegue sobressair-se aos visuais.

Gelo (Ice, EUA)
Direção: Robert Valley
Roteiro: Philip Gelatt (baseado em história de Rich Larson)
Elenco: Archie Madekwe, Sebastian Croft, Beatriz Godinho, Alexander Lobo Moreno, Miguel Amorim, Mike Bodie, Maria Teresa Creasey
Estúdio:
Passion Animation Studios
Duração: 13 min.

3º Lugar:
O Gigante Afogado

De todos os curtas do novo pacote da série, O Gigante Afogado é o que mais próximo chega de discussões filosóficas interessantes usando o corpo de um homem gigantesco que é encontrado na praia, visitado por curiosos e passa a ser observado pelo narrador, um acadêmico, por algumas semanas. Há uma interessantíssima simplicidade no curta escrito e dirigido pelo produtor executivo Tim Miller com base em história de J.G. Ballard, em que toda e qualquer ação é substituída por uma bela narração contemplativa que desconcerta o espectador e trata fundamentalmente da fugacidade da vida e da memória.

O gigante morto – nunca explicado, pois esse não é nem de longe o objetivo da obra – é uma curiosidade que atrai diversas pessoas, mas que, com o tempo, vão perdendo o interesse, com o corpo entrando em putrefação e, depois, sendo cortado e tendo suas partes transformadas em troféus de tamanhos variados. É a efemeridade da coisa que espanta e que nos faz refletir na medida em que a quantidade de pessoas na praia vai diminuindo e o gigante passa a fazer parte do passado e, portanto, de tudo aquilo que esquecemos.

O que significou aquela vida? E, mais ainda, o que significou aquela morte? O titã inexplicável, que atiça a curiosidade de todos, logo não é sequer uma lembrança relevante para ninguém a não ser, talvez, o narrador, exatamente como nos desinteressamos tão facilmente por tanta coisa todos os dias, por mais chocantes que elas possam ser. O gigante ali na praia vai deixando de existir na medida em que tem seus membros (e seu membro!) cortados e espalhados por diversos lugares refletindo nossas vidas e o que elas representam para aqueles ao nosso redor. Pessimista, sem dúvida, mas é sempre bom lembrarmos de nossa insignificância.

O Gigante Afogado (The Drowned Giant, EUA)
Direção: Tim Miller
Roteiro: Tim Miller (baseado em história de J. G. Ballard)
Elenco: Steven Pacey, Laura Pacey
Estúdio:
Blur Studio
Duração: 14 min.

2º Lugar:
Snow no Deserto

Apesar de eu não ser lá muito fã de curtas que fazem de tudo para parecerem cutscenes de jogos eletrônicos, tenho que tirar o chapéu para a qualidade gráfica de Snow no Deserto, praticamente um Mad Max passado em outro planeta em um futuro distante em que um albino cobiçado por caçadores de recompensa em razão de sua genética que, como Wolverine, permite-lhe regenerar membros e órgãos, dando-lhe vida estendida, tem que sobreviver aos constantes atentados à sua vida. Pode parecer algo que já vimos antes – e sem dúvida é – mas há uma camada amarga no curta que o retira do lugar-comum além de, claro, os visuais deslumbrantes.

E o melhor é que a história consegue se sustentar bem em seus 18 minutos que não são desperdiçados, seja na introdução de novos personagens, seja na evolução do relacionamento do protagonista com uma jovem que passa a segui-lo pela inclemência do deserto alienígena. A criação de mundo, graças ao roteiro de Gelatti, com base em história de Neal Asher, e a direção de quatro co-diretores, é expansiva e muito interessante em cada um de seus detalhes, inclusive e especialmente o esconderijo-casa do solitário e melancólico albino.

O curta não esconde sua característica de videogame passivo, mas, diferente de outros curtas-cutscenes que vemos por aí, esse realmente dá vontade de jogar do começo ao fim e mergulhar de cabeça nesse universo estranho, mas ao mesmo tempo muito familiar e até confortável. Snow no Deserto pode não ter o melhor roteiro do mundo, mas a Unit Image sem dúvida alguma entrega uma obra que merece atenção.

Snow no Deserto (Snow in the Desert, EUA)
Direção: Leon Berelle, Dominique Boidin, Remi Kozyra, Maxime Luere
Roteiro: Philip Gelatt (baseado em história de Neal Asher)
Elenco: Peter Franzén, Zita Hanrot, Alaïs Lawson, Jonnie Hurn, Piotr Michael, Julie Nathanson, Scott Whyte
Estúdio:
Unit Image
Duração: 18 min.

1º Lugar:
Esquadrão de Extermínio

Diferente da 1ª temporada da Love, Death & Robots em que eu fiquei interessado em ver longas ou séries baseadas em diversos curtos, a 2ª temporada só me fez ter esse sentimento com um deles, Esquadrão de Extermínio, uma obra baseada em conto de Paolo Bacigalupi que, com enquadramentos “johnfordianos”, atmosfera neo-noir de Blade Runner e uma agridoce história de um policial do esquadrão do título que começa a hesitar em seu horrível trabalho de exterminar crianças (sim!) em um futuro em que os tratamentos de rejuvenescimento e, portanto, imortalidade, cobraram seu preço com a superpopulação do mundo e, portanto, levaram à proibição total do nascimento de novos humanos. Pois é, se alguém achava que Blade Runner era sombrio e pessimista, é porque não viram esse curta aqui…

Contrastando com a ambientação escura e decadente dos lugares em que o policial tem que ir para achar famílias escondidas, vemos a utopia criada pela imortalidade em uma direção de arte de une muito bem a atmosfera dos anos 30 e 40 com uma pátina futurista belíssima, mas que carrega esse peso das sequências iniciais que são até difíceis de acreditar, mesmo que não sejam explícitas. Nesse futuro terrível, a vaidade venceu a construção de família e a reprodução humana no suprassumo da manifestação de egoísmo e de frieza, algo que, a julgar o caminho vão que seguimos, não é tão impensável assim.

Com um protagonista crível, uma história torturante, mas muito bem construída em cada detalhes e visuais realmente impressionantes, Esquadrão de Extermínio é um filme (diria até live-action!) esperando para ser produzido, ainda que eu sem dúvida alguma também me contente com uma minissérie. O curta, dirigido com muita competência por Jennifer Yuh Nelson, sem dúvida alguma merece ser mais do que ele é.

Esquadrão de Extermínio (Pop Squad, EUA)
Direção: Jennifer Yuh Nelson
Roteiro: Philip Gelatt (baseado em história de Paolo Bacigalupi)
Elenco: Nolan North, Elodie Yung, Emily O’Brien, Michelle C. Bonilla, Dendrie Allyn Taylor, Debra Cardona, Ike Amadi, Noshir Dalal, Andrew Hawkes, Jennifer Hale, Ayana Shira Haviv, Piotr Michael
Estúdio:
Blur Studio
Duração: 18 min.

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Love, Death & Robots – 2ª Temporada (Idem, EUA – 14 de maio de 2021)
Produção: Joshua Donen, David Fincher, Jennifer Miller, Tim Miller

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