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Crítica | Mad Max: Estrada da Fúria

por Guilherme Coral
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Trinta anos depois do lançamento de Mad Max – Além da Cúpula do Trovão, George Miller retorna à sua clássica franquia, trazendo Max Rockatansky de volta às telonas. Capturando a essência dos filmes originais, especialmente o segundo, A Caçada Continua, o diretor consegue passar com fidelidade a sensação de estarmos diante do mesmo personagem e, mais importante, dentro do mesmo universo. A questão que fica, porém é a seguinte: Estrada da Fúria chega a ser uma obra realmente necessária? Ou se trata apenas de mais uma forma dos realizadores de tirar mais dinheiro dos espectadores com uma fórmula já elaborada? Sob esse ponto de vista o quarto longa-metragem da franquia não se distancia do infindável número de remakes, reboots e continuações que vemos na atualidade – estas que dão uma evidente retorno, basta observar TransformersVelozes e Furiosos ou o próprio Universo Cinematográfico Marvel. Agora, para uma segunda pergunta: Estrada da Fúria nos acrescenta algo além do que já vimos anteriormente? A resposta, a priori, seria não. O filme nada mais é que uma reinvenção da segunda entrada da franquia.

Com uma história simples somos reapresentados, através de uma narração em off, a Max, dessa vez vivido por Tom Hardy, que felizmente já substituiu Mel Gibson, que evidentemente já está velho demais para o papel e ninguém quer ver mais uma espécie de Cavaleiro das Trevas de Frank Miller. No meio do gigantesco deserto que agora toma conta da Terra, o protagonista é capturado por um bando de loucos em carros turbinados/ sucateados e a loucura já tem início nos segundos iniciais da projeção. O que vemos a seguir é um aprofundamento nessa maluquice geral e Miller utiliza um interessante recurso de montagem para introduzir a tensão que permanece constante em toda a obra. Na sequência pré título temos uma tentativa de escapada acelerada, como se alguns frames estivessem faltando, transmitindo perfeitamente a distorção daquela sociedade e o desespero de Max é passado para o espectador.

Mas Estrada da Fúria não é uma odisseia sobre como o personagem escapa de um confinamento. Não, como feito nas obras anteriores, max nada mais é que um coadjuvante dentro da história de outro alguém. Nesse caso, Imperator Furiosa (Charlize Theron), que visa escapar com belas donzelas das garras de Immortan Joe (Hugh Keays-Byrne), líder daquela perturbada sociedade que tem tais garotas com o único propósito de procriar. Sugado para dentro desses eventos fora de seu controle, Rockatansky se vê obrigado a ajudar na fuga das legiões ensandecidas de Joe, passando por diferentes provações até ser atraído, como de costume, para a causa das mulheres. É interessante como a narrativa tem Max como uma figura de extrema importância, mas jamais o coloco no centro do palco, estrutura que é mimetizada em inúmeros games, como o famoso Grand Theft Auto – especialmente o III. O protagonista é um simples ninguém.

Enfatizando essa escolha de Miller, a construção de Max é feita pontualmente ao longo da projeção, trazendo flashbacks que nos dão relances de seu passado. A ausência de um excessivo didatismo é notada e o roteiro não perde tempo com explicações intermináveis sobre os motivos e convicções do protagonista. É curioso como, mesmo com o evidente silêncio quase que permanente do personagem conseguimos entendê-lo e nos identificarmos com ele – o strong, silent type se mantém com toda a força, afinal, estamos diante do mesmo Max, apenas interpretado por um diferente ator. Para aumentar essa nossa percepção de que se trata da mesma pessoa, o diretor/ roteirista ainda insere elementos clássicos da franquia, como sua jaqueta, sua shotgun e, é claro, o Interceptor V8.

Mas o que mais chama a atenção, de fato, não é a construção dos personagens ou mesmo da trama que é simples como deve ser e sim do universo distópico e perturbador. Repleto de cenas de ação que não nos dão espaço para respirar, Estrada da Fúria constrói uma realidade tão distorcida que chega a dar nós no estômago de qualquer um. Cada perseguição, apresentada no estilo de 300, com desafios diferentes a cada sequência, nos deixa na ponta da cadeira e não empolgam, apenas nos deixam mais nervosos, esperando o pior resultado possível para os personagens. Aqui devo tecer críticas à influência do politicamente correto sobre a obra. Embora seja um filme destinado ao público adulto dificilmente vemos uma violência gráfica que não sejam explosões – essa ausência prejudica a construção do tom do filme, que se beneficiaria de mortes mais chocantes. Mad Max 2, por exemplo, nos choca muito mais nesse aspecto. Mesmo a nudez é curiosamente ausente e traria uma percepção maior da objetificação da mulher por parte de Immortan Joe, uma das muitas críticas feitas pelo filme.

Felizmente esses são pontos menores dentro da riqueza estética apresentada. parafraseando nosso crítico Matheus Fragata, George Miller conseguiu fazer 100 milhões de dólares parecerem 250 milhões e nos traz visuais simplesmente retumbantes, que permanecem em nossa memória após o término do filme. De gigantescas tempestades de areia até planícies pantanosas, o mundo de Max ganha uma enorme pluralidade e garantem que o espectador não se canse ao longo da projeção, por mais que Miller chegue perto do limite de duração que uma obra nesse formato se sustente. A forma como o diretor trabalha a ausência de água nessa civilização é simplesmente angustiante, ao mesmo tempo ele demonstra a evidente desigualdade social, misturando ainda elementos da mitologia do “velho mundo”, que garantem um notável tom de surrealismo ao longa. Nada, porém, mais surreal que um guitarrista em cima de um carro tocando seus acordes enquanto todos perseguem os personagens principais, uma das imagens mais loucas de todo o filme.

E por falar em música, a trilha por Junkie XL utiliza os típicos tons graves, é pontual, mas ajuda na construção da tensão, reverberando pela sala do cinema. Não temos nada fora do comum, mas ela cumpre seu papel estabelecendo uma nítida coesão com a imagem. Os pontos mais notáveis são quando ela assume uma estrutura mais calma ou até mesmo sombria, ganhando destaque na projeção, em contraponto à maioria do tempo que soa quase como um som diegético.

Mad Max: Estrada da Fúria nos leva de volta para o universo criado por George Miller e consegue fazer isso logo nos segundos iniciais da projeção. Trata-se de um fiel trabalho do diretor aos seus icônicos longas dos anos 80 e certamente um blockbuster que merece ser visto, trazendo um entretenimento certeiro que sabe onde começar e quando terminar. Se é necessário ou não somente o espectador pode decidir, eu, pessoalmente, não tenho a resposta – sinto falta de filmes como esse no cenário atual – não me refiro a explosivo e sim verdadeiramente perturbador -, mas não posso deixar de ansiar por algo totalmente novo. De qualquer forma, não há como não se divertir.

Mad Max: Estrada da Fúria (Mad Max: Fury Road – Austrália/ EUA, 2015)
Direção:
George Miller
Roteiro: George Miller, Brendan McCarthy, Nick Lathouris
Elenco: Tom Hardy, Charlize Theron, Nicholas Hoult, Hugh Keays-Byrne, Josh Helman, Nathan Jones, Zoë Kravitz, Rosie Huntington-Whiteley
Duração: 120 min.

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