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Crítica | Mãe Índia (Honrarás Tua Mãe)

por Guilherme Rodrigues
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É curiosa a conexão que se faz entre a pátria e a maternidade, com os soviéticos usando a ideia de “Pátria Mãe” para construir a ideia da nação soviética como um lugar que cuida de seus habitantes, e hino brasileiro também usando a expressão “mãe gentil” para se referir ao país, sempre com essa aura de carinho envolvida. Mãe Índia já coloca no título sua intenção de ligar sua protagonista com os rumos do país, mas não só pela afabilidade da posição de mãe, mas também pelas dores enfrentadas a nível pessoal e nacional.

O longa de Mehboob Khan abre com a protagonista Radha (Nargis Dutt), já idosa, em um campo de terra revirada. A princípio sozinha, ela pega um punhado de terra e levanta aos céus, até que o silêncio é interrompido por uma série de tratores que cruzam o local, é uma Índia moderna, não depende mais somente do suor da testa da sua população. Essa introdução dá grande destaque ao desenvolvimento tecnológico do país, com planos fazendo questão de mostrar a subestação de energia e as torres que vão conduzir a eletricidade, assim como grandes obras e, novamente, o trabalho das máquinas na agricultura.

Mas ainda é uma Índia apegada a certas tradições, e na inauguração de um canal de irrigação do vilarejo, os populares pedem que Radha, como a “mãe” do vilarejo, esteja presente, caso contrário, ninguém irá tocar no canal. Relutantemente, ela concorda, e o evento faz com que as memórias do passado retornem, e ela se lembra do seu casamento com Shamu (Raaj Kumar), e os obstáculos enfrentados pelos dois e seus filhos ao longo do tempo.

Mãe India tem um olhar firme no processos de desenvolvimento da Índia, com seus momentos musicais quase todos focados em alguma atividade econômica, no trabalho que ajuda ao país a crescer, são nesses momentos que é possível perceber com facilidade a grandiosidade da produção, que é frequentemente comparada ao épico americano E o Vento Levou. Uma das canções conta com centenas de figurantes que trabalham para recuperar o terreno de uma enchente, e a escala impressiona, além de enfatizar a importância da coletividade na construção do país, um dos diversos momentos em que o longa se aproxima dos ideais do cinema soviético de Eisenstein.

Apesar do tamanho, a narrativa está mais fincada no melodrama, com Radha passando por situações que testam sua consciência, caráter e determinação, mas que também tem relação muito forte com um aspecto de classe, já que seu principal algoz é uma espécie de agiota, Sukhilala (Kanhaiyalal), cuja riqueza vem de um empréstimo abusivo que realizou com a vila para que o casamento de Radha e Shamu pudesse ser realizado. Um dos momentos mais dramáticos do longa acontece quando um dos filhos do casal, já adulto, pede para ver o contrato do empréstimo, mas nem ele nem ninguém da vila consegue entender o que está escrito, ninguém ali tem educação formal, a riqueza de Sukhilala vem de sua exploração da falta de conhecimento dos outros.

O grande pilar do longa é, sem dúvida, Radha, e por extensão, a atuação de Nargis. Evidentemente que, como protagonista, ela seria o destaque, mas é fácil entender porque, em algumas discussões do filme, a personagem é comparada com deuses e deusas da mitologia Hindu, pois mesmo diante das diversas tragédias ao longo da história, Radha segue adiante, seja arando campos ou segurando seus dois filhos no ombro durante uma enchente, enquanto encara uma cobra. Nas cenas do campo especialmente, Mehboob explora o esforço físico da personagem, com closes enfatizando o suor e o esforço realizado, mas também abrindo o plano para mostrar a dimensão do que está sendo feito. Não é à toa que o filme tenha seus piores momentos quando se afasta da personagem, que mesmo relevantes para a história, não tem a mesma força visual dos momentos protagonizados por Radha.

Mãe Índia é superlativo em sua produção, sendo um dos filmes mais caros já realizados em Bollywood e isso certamente reflete no resultado final, sendo realmente um épico digno de ser chamado como tal, mas sem perder a dimensão humana que torna todo o espetáculo dramaticamente impactante.

Mãe Índia (Mother India) – Índia, 1957
Direção: Mehboob Khan
Roteiro: Mehboob Khan, Wajahat Mirza, S. Ali Raza
Elenco: Nargis Dutt, Sunil Dutt, Rajendra Kumar, Raaj Kumar, Kanhaiyalal
Duração: 172 minutos.

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