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Crítica | Mágico Vento – Vol. 8: Wendigo

Fome insaciável.

por Luiz Santiago
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Originalmente espalhadas pela região das províncias de Quebec e Ontario, no Canadá, as tribos falantes dos idiomas algonquinos (uma grande família de línguas), possuem uma criatura em sua mitologia chamada Wendigo, que por si só já tem um grande número de grafias alternativas, como winddsgvigo, wetiko, wìdjigò e por aí vai. Para eles, esta criatura é um “espírito maligno que come seres humanos“. São criaturas muito altas e que crescem ainda mais ao comer um novo ser humano; esguias, com garras e dentes afiados e, em algumas das muitas narrativas sobre elas, até possuem chifres. Também também podem assumir forma espiritual e tomar o corpo de uma pessoa; podem imitar vozes humanas para atrair vítimas e podem até se camuflar. Algo em comum em todas as versões sobre esta criatura é que ela possui uma fome insaciável — uma versão mais macabra, complexa e poderosa do zumbi, se a gente quiser fazer uma comparação aproximada em relação a esse aspecto.

Através do texto de apoio escrito pelos editores, na Blizzard Gazette – Notícias da Fronteira, temos uma indicação importante quanto à tradição desse personagem: “A crença em Wendigo nasceu entre os ojibways (também conhecidos como chippewas), uma tribo norte-americana e canadense“. Sabemos que os ojíbuas são uma tribo algonquina (o idioma que eles falam, o ojibwe, é um ramo dessa família linguística) e a região fria em que habitam permitiu o surgimento de uma criatura tão terrível em sua mitologia, pois é uma criatura que tanto pode surgir de atos hediondos cometidos por um ser humano, quanto de um ato de canibalismo — o Wendigo é um humano transformado por alguma coisa muito ruim que fez. A escassez de alimentos durante o longo e frio inverno da região mais o seu isolamento deram suporte a esse tipo de narrativa que Gianfranco Manfredi explora nesta oitava aventura de Mágico Vento, inclusive fazendo referências diretas a essas questões sociais, geográficas e antropológicas.

Na presente história, um grupo de exploradores é atacado por um Wendigo, e Língua Direta, o indígena que guia esse grupo, tenta de todas as formas avisar aos exploradores, criar uma estratégia de fuga, mas é tudo em vão. O início da aventura é tensa, com uma preparação num ambiente aparentemente tranquilo, mas que está prestes a sofrer um ataque mortal que dispersará o grupo, levará Língua Direta para outro lugar e o colocará em contato com o ojíbua Pequena Rocha, que imediatamente me lembrou um dos trogloditas de Rastro de Maldade, pela maquiagem que traz no rosto e por algumas de suas indumentárias. Além de todo esse lado intenso de fuga do monstro devorador de carne humana, temos o inverno em uma região que não é nada convidativa. Gosto muito de histórias de faroeste que se passam em territórios gelados, de modo que essa trama acabou sendo uma ótimo aperitivo, pela dificuldade diferente que impõe aos seus personagens (e digo “diferente” porque as aventuras desse gênero são majoritariamente ambientadas em outro tipo de espaço geográfico, não é mesmo?).

A atuação de Mágico Vento na aventura é impressionante. Já o vimos demonstrar valentia e disposição de luta em tramas anteriores, mas o que temos aqui é a sua presença diante de um monstro aterrador. Aliás, o plano de ataque em duas frentes e as revelações em camadas das coisas ligadas ao xamã Rocha Pequena (a dubiedade com que o autor o trata é aplaudível, porque sustenta até o final a impressão de que não devemos confiar nele, mas que ele não necessariamente é de todo maléfico) criam uma máquina de constante apreensão, com diferentes níveis de ameaça a diferentes pessoas, embora, a partir de certo ponto, uma ameaça esteja interligada a outra através de pensamentos, de projeção espiritual ou mesmo de magia. Assim como Whopi, esta é uma história que explora uma criatura do folclore indígena, mas dessa vez a abordagem é muito mais séria, violenta e literalmente selvagem. Uma poderosa prova de resistência e sobrevivência em território triplamente hostil.

Mágico Vento – Vol. 8: Wendigo (Windigo) — Itália, fevereiro de 1998
No Brasil: Mythos (2003 e 2020)
Roteiro: Gianfranco Manfredi
Arte: Pasquale Frisenda
Capa: Andrea Venturi
100 páginas

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