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Crítica | Maligno (2021)

por Iann Jeliel
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Maligno

IMPORTANTE: Assisti a Maligno sem nem saber da sinopse; logo, querendo preservar a experiência de vocês, leitores, entregarei zero detalhes da trama. Aconselho veementemente a assistir o filme do mesmo modo, sem saber de nada, e de preferência antes da leitura deste texto!

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Em linhas gerais, Maligno aglomera todo o repertório que James Wan tem mais o que ele adquiriu conforme o andamento da filmografia, em uma mistura criativa dos gêneros que ele melhor sabe trabalhar: o terror, a ação e o suspense policial. Conceitualmente, a união desses polos a um passeio de referências historiográficas do cinema de horror cria algo único. Diferente de outros filmes do diretor, em que a sensação pelo texto é ser um enlatado do gênero, melhor executado dada a personalidade e estilização sofisticada da direção, seu novo filme parece integrar a execução de clichês aos seus maneirismos característicos como cineasta levando a uma unidade criativa mais madura onde as misturas se complementam no processo da construção do terror em constante transformação de atmosfera.

Começa evocando o subgênero sobrenatural, trabalhando a entidade misteriosa num desconhecido gerado pelo mistério de suas intenções, mote esse repetido em quase todos os filmes de sua filmografia e que geralmente dão um caráter icônico à monstruosidade principal. No entanto, a diferença primordial, aqui, é que o ser maligno como assombração é escondido num jogo de sombras, penteados sinistros e contorcionismo – retendo-se as figuras folclóricas do horror japonês como Sadako e Kayako –, mas atua em periculosidade de maneira explicita e sanguinária, quase como a de um assassino imortal slasher dos anos oitenta. A dúvida então é plantada, a ameaça pode ser real, fantasmagórica ou mesmo ilusória, coisa da cabeça da protagonista (Annabelle Wallis), puxando o filme também para o lado do terror psicológico, visto o subtexto de princípio acerca do histórico da personagem com relacionamentos abusivos, o que justifica a pouca presença dos tradicionais jumpscares, ou escalonamento do ter ou não eles, nas demais partes.

Nisso, a inserção da investigação policial adentra com naturalidade a trama, puxando-a para uma atmosfera remetente a um giallo (movimento cinematográfico italiano que antecedeu o slasher, caracterizado por assassinos seriais misteriosos perseguidos por detetives), reforçada pela fotografia, em certos momentos, avermelhada na contraluz da iluminação do cenário, fora as luvas pretas carregadas pelo assassino. A diferença é ser uma perseguição mais participativa, por vezes didática, característica do estilo Wan que faz ele ser tão comunicativo com as massas. Pelo menos, a referência acaba o forçando a não apelar para flashbacks rapidamente entrecortados na narração de descobertas, bolando jeitos mais inventivos a fornecer essas informações que são sim mastigadas dentro do sequenciamento mais coeso na história. Considerando a ótima habilidade do diretor em contextualizar geograficamente, sob manipulação, a ambientação para potencializar a tensão – aquele plano do teto passeando pela casa, é fabuloso! –, a parte contemplativa da busca de respostas não chega a ser descartada.

Fato é que ela não é tão enfática porque o puxar do giallo é escolhido para dar margem para a narrativa reiterar seu lado mais carniceiro. O longa faz uso de violência bastante gráfica, mas essencialmente expressionista – como foi observada no final do movimento do subgênero mencionado –, com um adendo de ser mais corpóreo, trazendo o filme também para o body horror mais trash de A Morte do Dêmonio e considerando a personificação crescentemente mais exposta do vilão nos desdobramentos do mistério, até voltado para um filme de monstro clássico da década de trinta. O mais interessante é perceber como estes desenvolvimentos repercutem no drama familiar conectado ao vilão, dando não só verossimilhança a essas enormes transições de tom e estilo, como também urgência exponencial ao enredo, pedindo o clima mais de ação, correspondido no terceiro ato de maneira exemplar. Aquela câmera extasiante e intensa que acompanha os movimentos da coreografia foi aperfeiçoada pelo cineasta quando se arriscou em grandes blockbusters, dando um caráter de grandiosidade muito empolgante ao clímax, com direito a desfecho de amplas possibilidades alegóricas.

Não acho Maligno tão icônico quanto Jogos Mortais ou a duologia Invocação do Mal, talvez pela falta de uma trilha sonora menos derivativa, ou abertura de créditos figurinha repetida, ou mesmo coisas bestas como o nome do vilão – para um conceito tão criativo por trás dele, poderiam ter colocado um nome mais ameaçador não? –, mas, em geral, é o filme que personifica as melhores características do diretor de maneira ousada, original, posicionando-o de fato como um mestre do terror, um grande autor no gênero, mais do que alguém que somente o domina e excuta-o acima da média.

Maligno (Malignant | EUA, 2021)
Direção: James Wan
Roteiro: James Wan, Ingrid Bisu, Akela Cooper
Elenco: Annabelle Wallis, Maddie Hasson, George Young, Michole Briana White, Jean Louisa Kelly, Susanna Thompson, Jake Abel, Jacqueline McKenzie, Christian Clemenson, Amir AboulEla, Mercedes Colon, Ingrid Bisu, Ruben Pla, Jon Lee Brody, Paula Marshall, Zoë Bell, Ray Chase, Mckenna Grace, Madison Wolfe
Duração: 111 minutos.

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