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Crítica | Mandy

por Gabriel Carvalho
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“Quanto mais sombria a vadia, mais clara a chama.”

Essa é, antes de qualquer outra coisa, uma obra que realmente causa estímulos ao seu espectador em termos visuais e sonoros. Mandy captura com considerável precisão, porém apenas de maneira frouxa, cenas com um impacto sensorial suficiente para incomodar e igualmente impressionar o seu público. E isso apenas contando o segundo ato de uma peça cinematográfica que se organiza em dois: as causas e as consequências do envolvimento de uma seita religiosa macabra com um casal amistoso e supostamente inofensivo. Red (Nicolas Cage) é casado com Mandy (Andrea Riseborough), vivendo uma pacífica existência que, em duas horas de projeção, se transformará em uma carnificina, máscara para um cerne dramático e narrativo que é questionável.

Panos Cosmatos quer a escatologia como uma das principais características de Mandy. Uma visceralidade transmitida pela gravidade das imagens que apelam aos olhos do espectador. Muito sangue acompanha os rumos do enredo. Mas é inacreditável o quanto o diretor prefere sacrificar, qualquer outra premissa para a sua obra, em prol de uma overdose sensorial um tanto rasa. O saudoso Jóhann Jóhannsson compôs uma enervante trilha sonora com inspirações no metal e que acompanha a potência imagética do longa. Já a cinematografia de Benjamin Loeb ensandece o vermelho para os planos, impulsionados ainda mais com o sangue. Contudo, álbuns duram muito menos que duas duras horas cobertas por uma pretensa jornada de vingança com viés comovente.

O que Cosmatos consegue, em contrapartida, é cansar o seu público. Ou, por um outro ponto de vista, enganar. Usar uma psicodelia, principalmente no primeiro ato em que uma normalidade ainda se apresenta enquanto possibilidade narrativa, como carro-chefe para uma grandiosidade cênica que é, na verdade, superficial demais. Os personagens são fracos, encenando arquétipos de si mesmos que não vão para nenhum lugar e não servem a nenhum propósito, senão ao do gênero de horror e de ação em seu estado mais passivo, embora contenha uma agressividade capada. E o texto é de uma auto-caricatura tão presente que mistura tons e minimiza qualquer impacto do longa. Uma experiência que só anseia extrair expressões assustadoras das faces de Nicolas Cage.

Os melhores enquadramentos de Mandy são aqueles que, na aproximação de câmera, capturam a perturbação do protagonista desse longa-metragem mediante suas expressões faciais. Quando o corpo é parte do processo de eferverscência, os planos deixam de ser abertos. Cosmatos entende a sua estrela, como entende quem é o centro dessa piada confusa. Pois Cage está, mais teoricamente que objetivamente, excelente no papel de maníaco movido por impulsos e alucinógenos. O ator, que é muito expressivo, termina sendo, entretanto, parodiado por si mesmo, ao invés de estar a par de uma alopração cinematográfica de seus atributos interpretativos. Tudo é parte de uma experimentação, com cenas isoladas sem muito fundo de verdade dramática a restar.

O grotesco Mandy é composto por espécies de clipes musicais. Exageram no uso de sintetizadores e, paralelamente, abrangem a natureza religiosa e o culto ao maligno. Cenas unidas, mas sem uma unidade, para uma banda de metal genérica usufruir de um competente trabalho formal de execução cinematográfica. Mandy, porém, é cinema que quer abraçar uma narrativa de duas horas. Tal circunstância é equivocada, porque, dada a negligência rítmica, o longa evidencia a pobreza do seu roteiro e até do seu nonsense. O gore e a dinâmica sem freios que assume a jornada do personagem principal concluem o projeto em uma nota muito mais cômica, com sacadas jocosas surgindo abruptamente. Qual que é, portanto, o propósito tonal desse longa aqui?

Mandy – EUA, 2018
Direção: Panos Cosmatos
Roteiro: Panos Cosmatos, Aaron Stewart-Ahn
Elenco: Nicolas Cage, Andrea Riseborough, Linus Roache, Ned Dennehy, Olwen Fouéré, Richard Brake, Bill Duke, Line Pillet, Clément Baronnet, Alexis Julemont
Duração: 122 min.

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