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Crítica | Manifest Destiny – Vol. 1: Flora & Fauna

Os vários destinos manifestos da América.

por Davi Lima
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Manifest Destiny

Em maio de 1804, os capitães Clark e Lewis lideraram uma viagem patrocinada pelo governo americano em direção ao oeste desconhecido pelas Treze Colônias, entre o litoral e os Montes Apalaches. Isso é o que a história de Manifest Destiny conta para os leitores, sobre uma missão perigosa promovida pelo Presidente Thomas Jefferson, encarregando soldados e caçadores de recompensa sem família para enfrentar monstros da natureza e desbravar a terra para os americanos libertarem a natureza, como um destino divino. O conceito do Destino Manifesto só foi cunhado na metade do século XIX, e o roteirista Chris Dingess não busca anacronismos que coloca seus personagens com intuitos religiosos, nem mesmo abertos diretamente a um drama mortal, mas o título da obra alinhado a um tratamento irônico e aventuresco mostra como a realista história americana escolhia bem os seus imaginários, entre monstros da floresta e destinos divinos.

Esse mote de questionamentos da narrativa de história e ideologias americanas se diluem na estética de narração de cartas de viagem escrita pelo capitão Lewis e na história de terror naturalista confrontada pelo capitão Clark. As cartas são bastante diretas em mostrar algo comum nos documentos históricos e construções de narrativas de viagens que são as adequações textuais para o público, como o congresso americano. Essa é a primeira ironia visual e textual, simultaneamente, que a combinação do texto de Dingess com a ilustração de Matthew Roberts engrena nas primeiras páginas. A segunda ironia é mais complexa, um pouco mais implícita em volta da diagramação e reação dos personagens, principalmente Clark. Se na narração de Lewis indica que o presidente Jefferson esperava que a expedição encontrasse monstros, ao mesmo tempo o senso realista que a HQ imerge coloca essa expectativa como uma surpresa, digna de um imaginário racista e religioso acerca dos indígenas. Há um ritmo flutuante na escolha dos quadrinhos e a disposição deles exatamente para diferenciar os momentos dos personagens e nos propor surpresas visuais de uma vinheta menor dentro de um splash-page, ou criar um mistério quando, dentro de uma mesma cena, há divisão dos personagens em quadros com boa distância de borda branca. Clark é o personagem que lidera a preocupação diante do terror natural exposto neste primeiro volume, enquanto há um entretenimento em Manifest Destiny acerca disso.

Tem seres com cabeça de búfalos, confundidos com minotauros, tem a flora que fala por meio de uma planta gigante que criam sonhos sexuais em Lewis e destino mortal em Clark; e tem zumbis feitos de plantas. Se não bastasse essa diferenciação entre fauna (animais) e flora (corpo de plantas), ainda tem a “flaura”, quando os animais viram zumbis contaminados pelas plantas. Além desse terror, há também Sacagawea, a indígenas misteriosa que convenientemente salva os homens brancos com intenções nada claras. Enquanto Lewis faz autópsias, descobre o prazer de investigar novidades que não imaginava serem verdade quando Jefferson falava. Clark é o personagem da ação, que se dispõe a agir em prol de Lewis e proteger sua tripulação. Essa dinâmica dos dois em meio à  narrativa nada comum para introduções historiográficas que a HQ propõe para si, vão fundamentando uma rivalidade entre a ironia do que se aceita como imaginário para os americanos e o que se quer acreditar, ou esconder para não pensar no verdadeiro destino.

Como já foi dito, o texto de Chris Dingess não abraça o drama, na verdade prefere aprimorar os intercursos de suspense, mudanças de planos e reviravoltas intricadas com um humor sutil, enquanto deixa Matthew Roberts com Owen Gieni brincarem com os maiores efeitos possíveis para fluir ação e o tempo de reação dos personagens perseguidos por zumbis. No entanto, além da brincadeira disso com uma HQ que puxa para si uma contextualização histórica, sendo divertido imaginar tal fantasia do terror em meio a uma aventura que deveria ser apenas colonizante, Dingess encaixa bem pontuações dramáticas que desembocam após cada situação nova e gritos visuais de perigo. Fora a temática da ausência de família para os escolhidos da tripulação e a violência na vida de cada um, que o perigoso personagem Jansen traz antes mesmo de o terror da fauna se expor, Clark e Lewis, ao fim do volume, definem um bom gancho dramático individual para o Destino Manifesto desenvolvido na história. Um se vê gozando, outro é assassinado pela natureza. São as ironias que se criam no imaginário.

Por isso, a morte de cada tripulante e a violência gráfica – bem conhecida nas mais famosas HQs da Image Comics, ainda mais associada com a companhia de quadrinhos de Robert Kirkman chamada Skybound – não são gratuitas, mesmo que narrativamente não se coloquem dramaticamente. Elas são sentidas para que a narração de Lewis ganhe força nas suas alterações e para serem contrapostas com a necessidade de Clark ter sua tripulação completa, precisando encorajar os sobreviventes que precisam trabalhar no resto da viagem. Os soldados são nomeados com pesar, mesmo que as reações dos dois capitães se conflitem em consequência disso.  Isso vai separando os arcos dos dois amigos, diferenciando destinos manifestos diante da fantasia que se quer ou não quer admitir dentro do oeste americano.

Manifest Destiny – Vol. 1: Flora & Fauna (Manifest Destiny – Vol. 1: Flora & Fauna, EUA – 2014)
Contendo: Manifest Destiny #1 a 6
Roteiro: Chris Dingess
Arte: Matthew Roberts
Cores: Owen Gieni 
Letras: Pat Brosseau
Editora original: Image Comics
Páginas: 128

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