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Crítica | Mestres do Universo (1987)

por Ritter Fan
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Fale-me sobre a solidão do bem, He-Man. Seria igual à solidão do mal?
– Esqueleto, em momento filosófico que não faz sentido algum.

O problema de Mestres do Universo é um só, e, diferente do que muitos dizem por aí, não tem relação alguma com Dolph Lundgren ser um péssimo ator, com o fato de seu personagem, supostamente o principal, não ser mais do que um coadjuvante, com o roteiro mal ajambrado que somente de longe adapta o material fonte ou mesmo com os efeitos especiais ruins até para a época em que a obra foi produzida. O problema do longa, baseado na amada linha de brinquedos da Mattel He-Man e os Mestres de Universo, que  ganhou uma também adorada série animada entre 1983 e 1985, é sua recusa em abraçar, sem reservas, seu próprio tom camp.

Façamos uma comparação ilustrativa sobre esse ponto que levantei. Sete anos antes, outro herói loiro e fortão vivido por um péssimo ator, teve que lutar contra um maléfico e exagerado vilão vivido por um respeitado ator veterano com a ajuda de seus amigos ainda mais extravagantes, resultando em um longa que até hoje é lembrado com apreço por quem o assistiu exatamente porque ele, em momento algum, se esquivou de ser o que ele deveria ser, ou seja, uma verdadeira bobagem camp e deliciosamente brega que desavergonhadamente foi até o limite do possível e mais um pouco. Falo, claro, de Flash Gordon, dirigido por Mike Hodges e que conta com uma inesquecível trilha sonora do Queen.

Flash Gordon é ruim? Possivelmente para muitas pessoas, mas ele inegavelmente conta com predicados e atenuantes que o retiram daquela vala comum que tantos filmes ruins e pouco memoráveis se encontram e isso no mínimo o transforma naquele bom e velho “é tão ruim que é bom”. Pessoalmente, acho que ele está acima disso justamente por encarar de frente o que ele quer ser, algo que a produção da mítica Cannon Films, do mesmo ano que o tenebroso Superman IV, diga-se de passagem, se recusa a fazer. Com raras exceções, como foi o honroso caso de Conan, o Bárbaro, de cinco anos antes, não havia outro remédio para um filme que tem como protagonista um sujeito bombado que mal consegue falar e que anda de tanga brandindo uma espada tendo que enfrentar um monte de inimigos que parecem saídos diretamente de uma escola de samba. Era agarrar a premissa e ir com tudo.

Mas, o que temos, é uma promessa, um filme que lida razoavelmente bem com todos os seus pontos fracos nos primeiros 10 minutos e, depois, nos últimos 15, mas que, entre uma coisa e outra, certamente para economizar o já parco orçamento de 22 milhões de dólares (e que nem isso conseguiu recuperar na bilheteria), decide transportar toda a ação de Etérnia, planeta natal dos heróis e vilões, para a Terra, colocando os adolescentes Julie, vivida por Courteney Cox pré-Friends e Kevin, vivido por Robert Duncan McNeill pré-nada, pois o ator nunca fez nada de nota, na linha de frente da ação que gira ao redor de uma “chave cósmica” que abre portais pelo universo. Como se isso não bastasse, no lugar de realmente aproveitar a enorme variedade de personagens bizarros da vasta linha de brinquedos de He-Man, o musculoso espadachim de Lundgren é acompanhado dos sem-graça Teela (Chelsea Field) e Mentor (Jon Cypher), além do desenvolvedor da chave, uma criatura inventada para o filme chamada Gwildor (Billy Barty). E, do lado vilanesco, o Esqueleto de Frank Langella envia para a Terra apenas dois vilões vindos dos brinquedos, Maligna (Meg Foster) e Homem-Fera (Tony Carroll), com o restante sendo criações genéricas para o longa, em uma decisão criativa inexplicável.

O receio de abraçar a bobagem completa, talvez oriunda de revelar de vez que o orçamento jamais daria conta de um filme integralmente passado em Etérnia (mas se alguém ali achou que ele daria conta de um filme passado na Terra, está redondamente enganado…), acaba tirando de Mestres do Universo toda a magia, toda a diversão que o longa poderia ter. No lugar de diversão, o que temos é Julie e Kevin batendo cabeça e gritando toda hora que encontram criaturas estranhas, Langella tendo sua atuação escondida pela (ótima) prótese de Esqueleto e Lundgren sendo escondido completamente pela direção de Gary Goddard, quase que dizendo com toda as letras que a produção estava envergonhada de fazer o filme. Isso tudo e o roteiro desconexo que sequer sabe fazer bom uso do MacGuffin que é a tal chave cósmica ou criar uma mínima sensação de mitologia resultam em um filme que desaponta em quase todas as suas características, decepcionando fãs de He-Man e companhia e também os não-fãs que talvez só quisessem um espada e sandália com um mínimo de lógica como, só para colocar o sarrafo lá embaixo, O Príncipe Guerreiro.

E, com essa tosqueira horrorosa, a carreira cinematográfica de He-Man foi pelo ralo, matando a esperança de se criar uma franquia ou de se reviver o interesse pelo estranho personagem que nasceu como um brinquedo mais estranho ainda. O mais triste é ver que, mesmo debaixo do monte de tranqueira que vemos ao longo dos 106 minutos da projeção, havia ali potencial para algo simpático no mínimo no mesmo patamar do já citado Flash Gordon, mas que fica constantemente enterrado pela vergonha que a produção muito claramente sentiu em mergulhar de cabeça no ridículo supremo do material fonte.

Mestres do Universo (Masters of the Universe – EUA/Israel, 1987)
Direção: Gary Goddard
Roteiro: David Odell
Elenco: Dolph Lundgren, Frank Langella, Courteney Cox, Barry Livingston, James Tolkan, Christina Pickles, Meg Foster, Chelsea Field, Jon Cypher, Billy Barty, Robert Duncan McNeill, Anthony De Longis, Tony Carroll, Pons Maar, Robert Towers, Peter Brooks
Duração: 106 min.

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