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Crítica | Mickey Mystery #0: Anderville

Uma nova visão para o Mickey investigador.

por Luiz Santiago
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Anderville é a aventura de estreia da Mickey Mouse Mystery Magazine, que já começou como um verdadeiro evento. Escrita por Tito Faraci (criador da série, que escreve metade de suas 12 edições), as tramas revisam uma tradição clássica dos quadrinhos americanos do Mickey, na época de suas aventuras como investigador. Inclusive, este foi o olhar referencial utilizado por Dana Edmonds, Elizabeth Rowe e Joaquín Cañizares Sanchez ao conceberem originalmente a figura do Mickey Mystery (Mickey Mysterier) em uma publicação dinamarquesa lançada em janeiro de 1994 (os títulos em inglês das duas histórias lançadas, ainda não lançadas no Brasil, são Too Close for Comfort e The Hooded Eagle). Na mão dos italianos, a partir de outubro do mesmo ano, o personagem recebeu os contornos mais fortes do gênero noir, vivendo em uma cidade que não é a sua, lidando com pessoas desconfiadas ou hostis à sua presença e procurando não ser atropelado pela quantidade considerável de má sorte e situações difíceis de resolver.

Eu já vi muita briga sem sentido, de pessoas querendo salvar o seu favoritismo em relação ao “Mickey Detetive” colocando em disputa a proposta de Floyd Gottfredson, nos EUA versus essa desenvolvida pelos dinamarqueses e expandida/popularizada pelos italianos nos anos 90. O que falta, nessa briga boba, é contexto. Cada obra guarda, como não poderia deixar de ser, elementos de seu tempo. E favoritismos à parte, terá os pontos positivos e negativos a partir daquilo que os artistas e escritores propuseram para ela. No caso de Anderville, o que vemos é uma excelente história de detetive que obviamente flerta com a inocência das tiras de jornal detetivescas da primeira metade do século XX, mas claramente encontra o seu caminho para brilhar sozinha, e em nível bem alto, deve-se dizer.

O projeto explora a presença do Mickey em Anderville como uma visita do personagem a uma realidade onde ele não consegue recorrer aos truques e habilidades que o tornaram famoso em Ratópolis. O roteiro brinca constantemente com isso, primeiro fazendo aquela relação de oposição entre cidades de diferentes portes e dinâmicas sociais, depois indo para um campo micro, mostrando como as relações interpessoais são igualmente antagônicas aqui. É aí que a trama chega à sua melhor parte. Mickey está desconfortável, lidando com dois grupos distintos, um de mafiosos e outro muito amigável, além de precisar resolver uma ameaça que pode fazê-lo “dar um mergulho da baía com botas de cimento“. Os acordos que ele precisa fazer e a violência sugerida da história também se ressaltam como pontos positivos, algo que o leitor adulto consegue perfeitamente identificar, mesmo que não haja nada graficamente forte.

Eu adoro o trabalho visual de Giorgio Cavazzano aqui. Ele faz de tudo para emular a aparência estética do noir clássico, mas utilizando cores, e em um cenário mais moderno, típico de algumas obras neo-noir no cinema. O artista constrói diferentes espaços de ação, alguns com profundidade de campo isolada (e para isso, utiliza o efeito de coloração sépia, a fim de ressaltar, em forte contraste, o ambiente iluminado de destaque), fazendo uma diagramação que pode sugerir leituras com efeitos outros dramáticos, como a confusão de entendimento entre Mickey e o chefe de polícia — considerando que o cerne da história aqui é um flashback, o relato do rato sobre o que ocorreu dias antes — até o atropelo e caos que esse tipo de depoimento pode ter.

É impossível ler Anderville e não ver referências às narrativas de máfia na literatura e cinema noir dos anos 1940, aqui reconfiguradas para um espaço e tempo futuros. A relação de Mickey com o amigo Sonny e com o pessoal do Little Caesar são bem construídas, e o texto sustenta bons mistérios sobre certos personagens, com um final que mantém o rato orelhudo na cidade, a fim de dar alguns esclarecimentos futuros sobre o caso aparentemente resolvido aqui. Isso abre um novo momento para Mickey: ele assumirá a Agência de Detetives Sonny Mitchell & Cia. enquanto estiver em Anderville. Um ótimo estabelecimento para um Universo de crimes e investigações.

Anderville (Anderville) — Itália, 10 de outubro de 1994
Código da História: MM 0-1
Publicação original: Mickey Mouse Mystery Magazine 0 – Anderville
Editoras originais: Disney Italia
No Brasil: Disney de Luxo 10 – Mickey Mystery: O Detetive das Trevas (2016) / Disney Omnibus 1 – Mickey Mystery: O Detetive das Trevas (2022)
Roteiro: Tito Faraci
Arte: Giorgio Cavazzano
Capa original: Roberto Santillo
64 páginas

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